Brasil

Olha o Neguinho da Beija-Flor aí!

Em tratamento de um câncer grave, o interpréte da escola de samba diz que a doença mudou a sua vida. Aos 59 anos, promete força e alegria na Sapucaí


postado em 22/02/2009 10:14
Aguardado por milhões pessoas que já estão se esbaldando nas ruas de Salvador, Recife, Olinda, Rio de Janeiro e em outras cidades do país, o carnaval deste ano também foi muito esperado por um brasileiro em especial. Seu nome completo, registrado em cartório desde 2008, é Luís Antônio Feliciano Neguinho da Beija-Flor Marcondes. Nascido em Nova Iguaçu (RJ) há 59 anos, ele vai viver na madrugada de segunda-feira duas grandes emoções: interpretar pelo 33º ano consecutivo o samba enredo de sua escola na Marquês de Sapucaí e se casar com Elaine Reis, 47, com quem vive há quatro. Um momento de renovação para o intérprete, que se recupera de um câncer de intestino descoberto em junho passado. Autor do bordão ;Olha a Beija-Flor aí, gente;, Neguinho vai enfrentar mais cinco sessões de quimioterapia, de um total de 12, até 17 de maio. O câncer o fez enxergar a vida de uma forma diferente. ;Antes só pensava na conta bancária, até porque sustento 40 pessoas e ajudo muita gente. Agora, dou mais valor à fé e à religião. Acho que o câncer deve ter sido um castigo de Deus;, palpita (leia depoimento). O primeiro sintoma da doença foi um forte sangramento. A confirmação da doença não demorou, e em julho, menos de um mês após o diagnóstico, Neguinho encarou o centro cirúrgico para a retirada de 40cm de intestino, afetados pelo tumor. A quimioterapia o fez perder todos os pelos, mas não a esperança da cura. No começo do tratamento, os medicamentos agressivos afetaram o fôlego de Neguinho. Os médicos chegaram a dizer que sua participação no carnaval carioca se limitaria ao famoso grito que anuncia a entrada da Beija-Flor na Sapucaí. A previsão foi desfeita quando o sambista conseguiu se superar ao puxar o samba enredo da escola durante 80 minutos no último ensaio aberto, no domingo passado, quando 50 mil pessoas gritaram o seu nome na passarela do samba. ;Foi emocionante ver todas aquelas pessoas torcendo por mim;, conta. Com o enredo No chuveiro da alegria, quem banha o corpo lava a alma na folia, a Beija-Flor é a quinta escola a desfilar no segundo dia de apresentações. Entre 1h20 e 2h28 da madrugada de segunda, Neguinho será ovacionado pelas 88.500 pessoas presentes na Marquês. ;Sei muito bem que o câncer não é uma doença qualquer. É vai ou fica. E eu quero muito ficar. Se Deus quiser;, emociona-se. Motivação A motivação e o bom humor são essenciais para vencer o câncer. ;Mas não se pode exigir de um paciente doente um largo sorriso durante 24 horas por dia;, afirma Ana Cristina Waissmann, subchefe do Setor de Psicologia do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e supervisora técnica do Centro de Transplante de Medula Óssea (Cemo). ;É importante a força de vontade na batalha contra a doença. Mas também é preciso respeitar o momento do paciente e aceitar que ele pode não estar disposto a falar sempre sobre a doença, o tratamento e seus efeitos colaterais;, alerta. ;É fundamental não ser sujeito do câncer. Para isso, a qualidade da informação, a equipe médica, a família e os amigos, além dos remédios, é claro, são peças-chave para o tratamento;, esclarece. Os mais de 180 tipos de câncer atingem crianças, adultos e idosos de todas as classes sociais. ;É uma doença democrática e que não faz distinção entre ricos e pobres, jovens e velhos;, lembra Ana Cristina Waissmann. De tão democrática, é cada vez mais comum algum famoso revelar que tem ou já teve a doença. Foi assim que aconteceu com a socialite brasiliense Wilma Magalhães, 46 anos. Em janeiro de 2001, durante uma viagem à ilha de uma famosa revista de celebridades, ela percebeu um inchaço no pescoço. ;Estava escolhendo algumas fotos para a publicação e percebi que havia algo errado com o meu pescoço;, conta. Ao chegar em Brasília, Wilma procurou seu médico, que disse não ser nada grave. Alguns dias depois, a garganta ficou inflamada e apresentava forte rouquidão. Tomou antibióticos, mas a irritação não passou. Retornou ao médico. ;Aí ele me disse que o quadro havia mudado completamente. Em alguns dias já sabia que estava com um linfoma.; Após a primeira sessão de radioterapia no Hospital de Base, Wilma embarcou para Nova York. ;Fui me distrair para esquecer um pouco o trauma da doença. Quando começaram a cair os primeiros fios de cabelo, chamei algumas amigas para cortá-lo, enquanto tomávamos champanhe nos Estados Unidos;, conta a socialite, que hoje administra uma revista e um jornal na capital federal. À época, Wilma apresentava um programa de televisão em uma emissora local que cobria as festas mais badaladas de Brasília. ;Quando encerrei o tratamento, decidi tirar no ar a peruca que usava. Recebi muitos e-mails de telespectadores elogiando a minha postura.; A socialite diz que a única coisa boa da doença foi a perda de 12kg. ;Fiquei triste por ter ganhado todo o peso de volta;, lamenta. Até hoje, Wilma é parada nas ruas por pessoas que têm ou já superaram um câncer. ;Não reclamo da minha vida. Só falta um namorado para melhorar ainda mais;, anuncia. ;NEM QUE SEJA PELA ÚLTIMA VEZ; ;Antes da descoberta do câncer no intestino, era muito materialista e priorizava na minha vida os shows, as viagens nacionais e internacionais e os bens materiais. Estava longe da minha fé e de Deus. De uma hora para outra, acordei e percebi que tem coisas muito mais importantes que carreira, sucesso, dinheiro, mídia e reconhecimento. Antes desta doença, não sabia rezar. Não tenho distinção com religião. Atualmente, recebo na minha casa a palavra de evangélicos, pastores, padres, mães-de-santo, e de todas as seitas que aparecerem para me dar apoio. São todas bem-vindas. A doença me tornou mais popular em todo o país e as mensagens de solidariedade vêm de toda a parte. Por onde passo, vejo que tenho muitos amigos e admiradores que torcem pela minha saúde. Isso não tem preço. Tudo o que sou e tenho hoje eu devo à Beija-Flor. Por isso, vou dar toda a minha energia, força e alegria para puxar o samba enredo durante os 80 minutos na Marquês de Sapucaí no desfile de domingo de carnaval. Nem que seja pela última vez. Quem me deu tudo o que tenho, tem o direito de me tirar tudo.;

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