Brasil

Dom José foi escolhido a dedo pelo Vaticano

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postado em 15/03/2009 10:20
Ao longo de pouco mais de 20 anos como arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso Sobrinho sempre se posicionou contra o aborto e a distribuição de preservativos. Mas ganhou notoriedade por desmontar o modelo de igreja deixado pelo antecessor, dom Helder Câmara, um dos expoentes da chamada Igreja Popular, que estimulava a participação ativa dos leigos em sua estrutura, assim como o engajamento nas lutas sociais.

Dom José não fez o desmonte por acaso nem por conta própria. Tanto os defensores do modelo eclesial implantado por dom José quanto seus críticos apontam: ele foi escolhido a dedo pelo Vaticano. Dom José chegou a Recife em 1985, quando o papa João Paulo II havia substituído parte dos bispos ligados à Igreja Popular em todo o mundo. O caruarense foi uma peça no projeto de retomada conservadora da Igreja, escolhido pela identificação e fidelidade aos preceitos defendidos pela Cúria Romana. ;Era um modelo de Igreja muito aberto. O que dom José fez foi corrigir os rumos;, compreende dom Aldo Pagotto, arcebispo da Paraíba.

Para o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Inácio Strieder e o padre Reginaldo Veloso, proibido de celebrar missas por dom José, o modelo de igreja de dom Helder uniu-se à camada mais pobre da sociedade e juntou-se a ela em suas necessidades. Vindo de uma diocese menor, a de Paracatu (Minas Gerais), dom José posicionou-se contra a permanência de muitos padres estrangeiros na arquidiocese ; a maioria deles seguidores da Teologia da Libertação. Segundo o grupo de leigos Igreja Nova, o arcebispo afastou diretamente 16 religiosos estrangeiros e brasileiros e pressionou a saída de outros. Ao todo, o grupo contabiliza cerca de 30. Dom José nega os afastamentos. No entanto, os casos tiveram repercussão nacional, especialmente pela dimensão do nome de dom Helder.

O arcebispo de Olinda e Recife questionou também o ensino e o ambiente de formação do Instituto de Teologia de Recife (Iter), do Seminário Regional do Nordeste II (Serene II) e do Departamento de Pesquisa e Assessoria (Depa), que eram referências da Teologia da Libertação em Pernambuco, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte. O Iter e o Serene II foram fechados em 1989 por determinação do Vaticano, com o aval de dom José e outros bispos. No mesmo ano, os integrantes da Comissão de Justiça e Paz, que marcou a defesa de presos políticos e de famílias sem-teto por mais de uma década, foram desautorizados a usar o nome da Arquidiocese de Olinda e Recife.

Cruzada
A cruzada do religioso foi ampla. No ano passado, por exemplo, ao entender que o padre João Carlos Santana poderia ter violado o celibato, afastou-o da Paróquia de Santo Antônio, no bairro de Água Fria, em Recife. O padre se recusou a deixar o templo e a casa paroquial, mas a arquidiocese recorreu à Justiça e conseguiu a reintegração de posse da paróquia. O caso foi parar na polícia. Negando as denúncias feitas por paroquianos, a universitária que supostamente teria se envolvido com padre João Carlos registrou queixa contra o arcebispo por difamação e injúria. Isso obrigou dom José a ir a uma delegacia. Pela primeira vez, o líder máximo da Igreja Católica na arquidiocese prestou depoimento sob essa acusação. O arcebispo assegura nunca ter difamado alguém. Segundo ele, o afastamento do sacerdote e os argumentos para isso somente ficaram públicos porque padre João Carlos divulgou um documento de caráter sigiloso. O processo tramita no judiciário.

Por atitudes assim, Sebastião Barreto Campelo, do Movimento Pró-Criança, acredita que dom José firma-se como defensor da Igreja e seu legado. Padre Reginaldo Veloso, afastado dos altares, pensa o contrário. Ele afirma que o legado maior foi destruído ao se limitar a participação do povo; afastar a instituição religiosa dos problemas da sociedade, limitando-se à liturgia e aos aspectos internos; e implantar um modelo da Igreja que não valoriza a cultura local. Por isso, ele acredita que a arquidiocese vive uma experiência de deserto, silêncio e esterilidade.

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