Brasil

Campinas terá escola para gays

Instituição com inauguração prevista em março de 2010, no interior de São Paulo, terá cursos técnicos voltados especificamente para lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros . Ideia é combater a homofobia

Rodrigo Couto
postado em 01/01/2010 08:55
Líder mundial em crimes de natureza homofóbica - quase 3 mil (2.998) assassinatos desde 1980, sendo 190 somente em 2008 (veja quadro) -, o Brasil se prepara para receber, em março de 2010, a primeira escola de cursos técnicos destinada especificamente a lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBTTT). Um dos objetivos do estabelecimento, que vai funcionar em Campinas (SP), é combater a homofobia e pautar a discussão sobre a temática da população homossexual, que, geralmente, não consta nos currículos das instituições tradicionais. Apesar de aprovarem a iniciativa, integrantes do grupo Klaus alertam que o local não deve limitar o futuro profissional desse público. Pelo contrário, deve ser o ponto de partida. "As pessoas vinculam muito nossa opção às profissões de cabeleireiro e design de moda. Sem desmerecer essas atividades, somos capazes de fazer outras coisas", afirma Douglas Gomes, 23 anos, estudante de serviço social da Universidade de Brasília (UnB) e um dos coordenadores do Klaus. Rodolfo, Vinícius e Douglas, integrantes de grupo de apoio à diversidade no DF, aprovam a iniciativa, mas alertam que os cursos não podem limitar o futuro profissional dos alunosAlém da visibilidade à cultura gay, a Escola Jovem LGBTTT pretende ajudar os jovens a se aceitarem. "A importância do projeto é divulgar a cultura LGBTTT. Os grandes movimentos sociais têm como estratégia valorizar suas manifestações, assim como os movimentos negro e feminista. Só vamos poder construir uma identidade e possuir um senso de pertencimento a uma comunidade valorizando a nossa própria cultura, desprezada por vários setores da mídia e outros setores retrógrados e fundamentalistas da sociedade", explica o diretor da instituição, Deco Ribeiro, que também coordena a E-Jovem, organização não governamental que compõe uma rede nacional de juventude gay, presente em 20 cidades das cinco regiões do país. Prioritariamente, serão matriculados jovens entre 12 e 20 anos. Se houver vagas, pessoas de outras opções sexuais (heterossexuais) e faixas etárias poderão participar. Estarão disponíveis aulas de expressão gráfica, cênica e artística, além de um curso para formação de drag queens. "A grade curricular engloba aulas de música, cinema, dança, teatro, webTV, além de criação de revistas, livros, CDs e DVDs", observa Ribeiro. A escola vai oferecer bolsas de estudo a jovens residentes fora de Campinas. Apesar de a escola permitir matrículas ao público heterossexual, o sociólogo e coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, acha difícil outros públicos frequentarem a instituição. "É possível, mas o preconceito é grande", observa. Na avaliação dele, a criação da escola é importante para chamar atenção às dificuldades enfrentadas pelo público LGBTTT nos estabelecimentos tradicionais. "Porém, em termos educacionais, é melhor ter escolas inclusivas, que reunam todos os públicos, mesmo sabendo que o machismo e o sexismo são alarmantes", pondera. Inovação Ao contrário dos EUA, onde existem diversas escolas de artes com temática LGBTTT, instituições desse gênero não são comuns na América Latina. O estabelecimento de Campinas é o primeiro do país e o segundo a ser criado entre as 20 nações da região. "A ideia é genial para promover a nossa cultura", afirma Vinícius de Aquino, 21 anos, estudante de medicina da UnB, também integrante do Klaus. "Quando há uma segregação de grupos, como ocorre com os gays, acaba se criando uma cultura própria. E a escola pode ajudar a divulgar todas essas manifestações", lembra. Na avaliação de Rodolfo Godoi, 17 anos, aluno de ciências sociais, outro participante do grupo, a escola é importante, mas não deve ser vista como gueto. "Pode ser um bom espaço para debate e troca de informações, mas não deve ser encarado como única opção profissional", opina. Douglas concorda com a opinião do colega. "Os homossexuais, lésbicas e bissexuais estão presentes em todos os lugares. Nessa linha, a instituição não deve limitar a capacidade profissional somente por conta da opção sexual", pondera. Homossexuais assumidos, os jovens lembram que é difícil romper o preconceito dentro da própria universidade. "Quando promovemos uma ação do grupo Klaus contra a homofobia no Dia dos Namorados, fomos surpreendidos com xingamentos escritos nos cartazes espalhados pelo câmpus", conta Douglas. Quem quiser obter mais informações sobre a iniciativa pode entrar em contato pelo e-mail escola@e-jovem.com. Apoio à diversidade Criado em 2006, logo após a realização do 12º Encontro Brasileiro de Gays, Lésbicas e Transgêneros (EBGLT), em Brasília, o Klaus é o único grupo universitário de apoio à diversidade sexual no Distrito Federal. Originária do alemão, a palavra significa "aquele que vence com o povo". Vinte jovens integram o grupo, que se reúne todas as sextas-feiras no Centro de Convivência Negra da UnB, sempre a partir de meio-dia. Aversão aos homossexuais Divulgado em abril, levantamento realizado pelo Grupo Gay da Bahia mostrou um retrato da violência praticada contra gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros em 2008 no Brasil. Confira, abaixo, os principais resultados.

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