Brasil

Domínio americano em propriedades de Minas Gerais

Maior propriedade do estado mineiro está nas mãos de forasteiros, que se aproveitaram de brecha legal para adquirir o terreno gigantesco

postado em 10/06/2010 08:02
Unaí (MG) ; O município mineiro de Unaí, no Entorno do Distrito Federal, conta com a maior propriedade rural de estrangeiros em todo o estado de Minas, com 44 mil hectares ; área equivalente à Região Administrativa de Brasília, que compreende as asas Sul e Norte e a Vila Planalto ;, segundo cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). No cartório da cidade, a Fazenda Agroreservas do Brasil está registrada como empresa brasileira, embora não seja segredo na cidade que os seus proprietários são norte-americanos. Funcionários da companhia, que tem escritório em Formosa (GO), confirmam que se trata de um empreendimento estrangeiro.

Fazenda Agroreservas: maquinário de primeiro mundo e propriedade estimada em R$ 290 milhõesO caso em Unaí reflete uma das brechas na legislação brasileira que dificulta o controle das aquisições de terras brasileiras por estrangeiros. Reportagem publicada ontem pelo Correio mostrou um mapa dessas propriedades no país. São 4,3 milhões de hectares distribuídos em 3,7 mil municípios, majoritariamente nas regiões Centro-Oeste e Sudeste. Mas esses dados não estão completos, porque o registro é autodeclaratório. Técnicos do Incra avaliam que o número pode ser até cinco vezes maior, o que representaria 3% do território nacional.

Por lei, os cartórios são obrigados a informar o Incra quando um estrangeiro registra a compra de uma propriedade no Brasil. O titular do Cartório de Registro de Imóveis de Unaí, Humberto Lisboa Frederico, afirma que adotou o procedimento. ;A empresa tem sede em São Paulo, tem CNPJ e contrato social registrado na Junta Comercial de São Paulo. É empresa nacional pela nossa legislação;, diz Humberto, mostrando uma cartilha do Incra com orientações sobre o registro de aquisições de imóveis rurais por estrangeiros.

No entanto, o documento também diz que pessoa jurídica cujo capital societário, mesmo que participe pessoa estrangeira, com qualquer percentual, seja física ou jurídica, não necessita requerer autorização para adquirir imóveis rurais no território nacional. ;Essa situação permite a ocupação desenfreada de terras em nível nacional por estrangeiros, mascaradas legalmente, com a justificativa de serem adquiridas por empresas brasileiras;, frisa a cartilha. No cartório de Unaí estão registradas outras 28 aquisições feitas por estrangeiros, a maioria de holandeses, além de americanos e portugueses. Mas essas pequenas propriedades no município somam apenas 2,7 mil hectares.

Mistério
A Fazenda Agroreservas está envolta em mistério. Por telefone, seus funcionários informam apenas que a empresa ;é muito reservada;, mas não escondem que é ;americana;. Em Unaí, as informações de várias fontes são coincidentes. ;É estrangeira. É de uma seita religiosa;, afirma o presidente do Sindicato de Produtores Rurais de Unaí, Hélio Machado. Ele telefona para amigos e colhe mais informações: ;São mormons, são americanos. A companhia está em oito países.;

A companhia mantém uma página na internet. No site, está escrito que, em 24 de julho de 2003, a Farm Management Company comprou a maior parte da Fazenda São Miguel Ltda. ;A área adquirida recebeu o nome de AgroReservas do Brasil Ltda.;, diz o texto. O registro de compra no cartório diz que a Agroreservas se tornou proprietária de 29,1 mil hectares da Fazenda São Miguel há sete anos. A propriedade tinha, originalmente, 44,9 mil hectares.

O preço da fazenda é outro mistério. O documento cita como valor de venda R$ 7 milhões. Mas o valor fiscal, para efeito de pagamento de impostos, foi estipulado em R$ 32,4 milhões. Hélio Machado afirma que o hectare de terra naquela região fica entre R$ 10 mil e R$ 15 mil hoje. Considerando os 29 mil hectares, a fazenda valeria pelo menos R$ 290 milhões. E vale, assegura o presidente do sindicato: ;É coisa de primeiro mundo. Eles têm alta tecnologia;.

Segundo relato de Machado, a fazenda produz soja, milho, feijão, laranja, mamão, leite e gado de corte. No período de seca, utiliza grandes extensões de pivô para irrigação. A água é retirada de oito barragens construídas pela própria empresa. O rebanho atinge 7 mil cabeças. O sindicalista Hélio Machado conta uma história curiosa, repetida por outros moradores: ;Eles derrubaram toda a plantação de café que tinha na fazenda. A religião deles não permite o consumo de café, que é considerado um estimulante;. Machado acrescentou que os proprietários trabalham muito. Costumam ir para a lavoura com os empregados. Oito americanos estariam sempre na fazenda. A reportagem tentou entrar em contato com representantes da empresa, que não retornaram as ligações.

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