Brasil

Em 2017, 21 mil pessoas saíram do Brasil para tentar a vida no exterior

Segundo especialistas, o motivo é a falta de perspectiva econômica e política no país. Número cresceu mais de 160% nos últimos seis anos

Bruno Santa Rita*
postado em 01/01/2018 07:00
Segundo especialistas, o motivo é a falta de perspectiva econômica e política no país. Número cresceu mais de 160% nos últimos seis anos
O momento conturbado na política e na economia fez com que mais brasileiros passassem a olhar com interesse a possibilidade de morar e trabalhar no exterior. Segundo a Receita Federal, o número de declarações de saída definitiva do país, que foi de 8.170 em 2011, saltou para 14.612 em 2015 e chegou a 20.493 em 2016. Em 2017, o total chegou a pouco mais de 21,2 mil ; um aumento de 160% num espaço de seis anos. Para analistas, a falta de perspectiva econômica e as tensões sociais são os principais fatores que têm levado as pessoas a deixar o Brasil. E os dados da Receita, obtidos a partir das declarações de Imposto de Renda, mostram que esse movimento tem crescido entre os profissionais de maior qualificação.

;Um dos motivos para me mudar foi a incerteza em relação ao futuro do Brasil;, diz o analista de sistemas André Erthal, 41 anos, que foi morar em Vancouver, no Canadá, no início de 2017. André tinha uma vida que considerava ;muito confortável; em Manaus, onde morava com a mulher e a filha de sete anos. Entretanto, a falta de perspectivas para o futuro, a escalada da violência no país e a oportunidade de oferecer, no exterior, uma educação de qualidade para a filha o convenceram a emigrar.

Antes da mudança, André era diretor executivo do Instituto de Desenvolvimento Tecnológico (INDT), com escritórios em Manaus, Brasília e Recife. Nascido no Rio de Janeiro, ele morava em Manaus desde 2004, quando recebeu o convite para trabalhar na empresa. ;O trabalho não foi um fator que motivou a saída do Brasil. Eu estava bem empregado;, explica.

Conseguir emprego no Canadá não foi problema, diz André. Após duas semanas de busca, recebeu uma oferta no fim de maio, quando a permissão para trabalhar ficou pronta. ;Existe muita demanda para profissionais especializados, especialmente em tecnologia da informação;, afirma. Hoje, ele trabalha para o Digitalist Group no desenvolvimento de soluções de tecnologia para diversas áreas e mercados.

O professor de economia da Universidade de Brasília Carlos Alberto Ramos explica que os motivos que levam as pessoas a deixar o Brasil são variados, mas o mais significativo é a expectativa das pessoas sobre o país. ;Uma pessoa emigra considerando as perspectivas da economia. Se você não espera que o Brasil progrida, vai embora;, diz. Embora considere que o número total de pessoas que deixam o país não é muito expressivo, Ramos observa que os dados da Receita Federal, baseados nas declarações de Imposto de Renda, mostram que a evasão está aumentando entre profissionais com maior qualificação. ;Se você está pegando os dados da Receita Federal, as pessoas que você está monitorando são qualificadas;, frisou.

O analista de sistemas Roberto Soares, 35, deixou Brasília por não se sentir seguro. ;Não poder sair de casa e viver com medo de ser assaltado ou ter a casa invadida sempre me preocupou muito;, conta. Ele já havia passado pelo Canadá duas vezes antes de se mudar, em maio de 2017, e diz que sempre teve muita simpatia pela cultura canadense. Atualmente, Roberto trabalha com cloud computing (armazenamento de dados na internet) na Azzurra, uma empresa de marketing digital. O processo de mudança foi bem longo e trabalhoso, mas valeu a pena. ;Se precisasse, eu faria de novo;, afirma.

Bruno Ottoni, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), aponta a situação ruim do mercado de trabalho no Brasil como um dos motivos da migração de profissionais. Mesmo com a recuperação lenta e gradual da economia, muita gente que perdeu o emprego formal não está conseguindo encontrar ocupação semelhante. ;O mercado formal não está se recuperando muito bem. Muitos empregos nessa área foram eliminados;, observa.

O brasileiro, quando comparado com imigrantes de outros países, sofre menos com desemprego nos Estados Unidos (EUA), segundo a pesquisa mais recente realizada pelo Ministério das Relações Exteriores, em 2014. De acordo com os dados, são mais de um milhão de brasileiros que moram no país norte-americano. Segundo um estudo recentemente publicado pela Forbes, o número de imigrantes procurando emprego nos EUA cresceu de 30% em 2016 para 37% em 2017.

Para o CEO da Morar EUA, Roberto Spighel, mudar-se para os Estados Unidos é atrativo para o brasileiro, uma vez que, em algumas regiões, como na Flórida, o clima e o fuso são semelhantes aos do Brasil. ;Independentemente da forma de emprego, a cultura do país, principalmente na Flórida, é parecida com a do Brasil;, explica. Além disso, Spighel explica que os brasileiros encontram muita segurança e uma perspectiva de vida mais estável.

;A grande mudança é a procura de brasileiros para empreender nos EUA;, revela. Segundo ele, muitos brasileiros com um capital médio procuram o país norte-americano para consolidar novas formas de empreendimento. Essas pessoas chegam a ter a renda média anual de US$ 48.707 a US$ 75.632.

Volta às terras lusitanas


Segundo Alice Autran Garcia, diretora de Comunicação da Athena Advisers, uma corretora de imóveis especializada que atua em vários países, os brasileiros representam a maior parte dos clientes da empresa em Portugal. O governo português concede automaticamente o ;Golden Visa; (Autorização de Residência Para Atividade de Investimento) a qualquer pessoa que compre no país um imóvel com valor mínimo de 500 mil euros. Ao final de cinco anos, o visto de residência temporária garante a cidadania europeia. ;Quando você faz um investimento de 500 mil euros, você ganha esse visto e depois se torna cidadão;, explica.

Os dados da pesquisa da Athena Advisers mostram um aumento de 222%, entre março de 2016 e outubro de 2017, nos pedidos de brasileiros para obtenção do Golden Visa português. Logo atrás vêm sul-africanos, com 160%, e libaneses, com 116%. Alice explica que os brasileiros que estão indo para Portugal são, na maioria, pessoas financeiramente bem-sucedidas. ;Portugal experimenta uma leva de brasileiros com características muito diferentes dos que vieram antes. São pessoas com uma bagagem intelectual maior, normalmente investidores;, afirma. (BSR)

*Estagiário sob a supervisão de Paulo de Tarso Lyra

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