Cidades

Os perigos dos anabolizantes

Produtos que aumentam a massa muscular rapidamente, sem a necessidade de grande esforço físico, podem causar uma série de doenças e até levar à morte. Especialistas criticam culto exagerado à beleza

postado em 12/06/2008 08:32

Qual o preço do corpo perfeito? Para muitos brasilienses, barriga dividida, peitoral definido e pernas e braços torneados custam a saúde do próprio organismo. Segundo especialistas e professores de educação física, o número de jovens e adultos que recorrem aos esteróides anabolizantes ; tipo de hormônio sintético, semelhante à testosterona, que aumenta a massa muscular do indivíduo ; é cada vez maior. No entanto, por trás do belo corpo, pode haver uma saúde fraca e debilitada pelo bombardeamento de hormônio (veja arte). Para pesquisadores do comportamento humano, o risco corrido pelos usuários é fruto das cobranças de uma sociedade que coloca padrões estéticos acima de valores como a moral, a honestidade e o companheirismo.

Conseguir anabolizantes ilegais, mais conhecidos como ;bomba;, é fácil. A maioria dos medicamentos de uso humano ; como o Deca Durabolin e o Growth Hormone (GH) ; são vendidos clandestinamente nas portas das academias da cidade ou em sites da internet. A aplicação é feita entre amigos, sem orientação médica. Eles podem ser injetados ou tomados em comprimidos ;Não deveriam ser usados para fins estéticos. Seu uso é prescrito em casos de perdas musculares em pessoas em coma ou em idosos;, alerta a professora de educação física Keila Elizabeth Fontana, da Universidade de Brasília (UnB). Doutora em fisiologia do exercício, ela conta que os usuários chegam a aplicar até 20 vezes mais do que a dose indicada clinicamente.

Como se não bastasse burlar a lei e colocar a própria saúde em risco, muitos jovens recorrem à medicamentos de uso veterinário. Remédios como o Androgenol e o Equifort, ambos anabolizantes para a engorda de gado, por exemplo, estão entre as substâncias buscadas pelos jovens para ganhar massa muscular. Vendidos indiscriminadamente em casas agropecuárias e pet shops, essas substâncias já causaram mortes de pessoas em Brasília e no restante do Brasil (veja memória). ;É uma atitude inconseqüente, pois os prejuízos são imprevisíveis;, ressalta Keila Elizabeth.

Narcisos
O técnico administrativo G.C.S, 25 anos, conhece bem os efeitos nocivos dos anabolizantes. Morador da Asa Norte, usou Deca por dois anos. Comprava com os amigos da academia de musculação. Em três semanas, ganhou 15 quilos. O corpo, apesar de desproporcional, ficou ;sarado;. ;Eu era muito magro e não tinha fama com as meninas. Não tinha paciência para ficar malhando e resolvi tomar;, lembrou. Os resultados estéticos deram a desejada fama. Mas hoje, seis anos após parar de injetar o hormônio sintético, ele colhe os resultados da decisão. ;Tenho inflamações nos tendões constantemente, pelo crescimento muscular abrupto. Além disso, algumas partes do corpo estão flácidas e com estrias;, conta.

O rapaz diz que pensaria duas vezes antes de repetir o feito: ;Foi coisa de menino;. Professor de educação física de uma academia, Allan de Almeida, 34 anos, conhece alunos que fazem uso de anabolizantes, apesar das orientações contrárias. ;É como o cigarro: quem toma sabe o mal que faz, mas ignora as orientações dos professores;, argumenta. Ele diz que o uso não se restringe aos homens. No caso das mulheres, os efeitos colaterais podem chegar ao crescimento de pêlos na face e à atrofia da mama. Para a especialista Keila Fontana, é preciso investir na orientação dos profissionais e em conscientização. ;As pessoas precisam conhecer os efeitos colaterais;, destaca.

Para a pesquisadora Eliana Lazzerini, do Departamento de Psicologia da UnB, especialista em assuntos como o narcisismo, há um exagero do culto à beleza na sociedade moderna. ;As pessoas fazem qualquer coisa pelo corpo perfeito;, comenta. Segundo ela, os casos clínicos envolvendo a baixa estima de pacientes com relação à estética corporal aumentam nos escritórios psiquiátricos da capital. ;E não dizem respeito só aos anabolizantes. Casos de bulimia, anorexia e a procura por cirurgias plásticas crescem a cada dia. É um reflexo da inversão de valores: a beleza supera atributos como a o companheirismo em uma relação.;

MEMÓRIA

Novembro de 2004
Danilo Miguel da Silva, 18 anos, morreu em um hospital de João Pessoa (PB), dois dias após tomar uma injeção de anabolizante de uso veterinário. Injetou 30 mililitros do medicamento Adethor, uma concentração de vitaminas destinadas à engorda de cavalos, bois e porcos.

Outubro de 2004
Sílvio Couto,19, morreu de parada cardiorespiratória e falência múltipla dos órgãos, após 15 dias internado na UTI do Hospital Regional do Gama. Ele havia tomado um complexo vitamínico usado na engorda de gado.

Setembro de 2004
Jackson Vieira de Souza, 21 anos, morreu de falência múltipla dos órgãos após injetar o esteróide anabolizante nandrolona nos braços. Ele morava em Padre Bernardo (GO).

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