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Quadras destinadas à edificação de casas são tomadas por prédios em Águas Claras

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postado em 25/10/2008 08:33
Nágela Pessoa, 38 anos, morava na Candangolândia quando ouviu o cunhado falar de uma quadra em Águas Claras que seria destinada apenas para a construção de casas. Os terrenos eram quatro vezes maiores e ela se animou com a possibilidade de construir uma casa grande, com piscina e área verde para os filhos brincarem. Nágela se mudou para Águas Claras há seis anos e foi a primeira moradora do conjunto onde vive. Mas pouco tempo depois, a empolgação se transformou em frustração: prédios de até 12 andares começaram a ser construídos nos lotes vazios e, hoje, a casa da família está espremida entre os espigões. A descaracterização da Quadra 301 de Águas Claras preocupa os moradores, que já sofrem por causa do adensamento populacional maior do que o planejado. Pelo projeto inicial da cidade, apenas uma casa poderia ser construída em cada um dos 237 lotes residenciais da Quadra 301. O Plano Diretor Local de Taguatinga, que inclui Águas Claras, porém, alterou a norma e permitiu que dois domicílios fossem feitos nos terrenos. Assim, a quadra, que deveria abrigar 474 famílias, ou 2 mil pessoas, no máximo, já serve de moradia para mais de 30 mil. A lei autorizou que mais de dois domicílios fossem feitos nos terrenos, em caráter excepcional e desde que aprovados pelas concessionárias de serviços públicos (Leia O que diz a lei). A única regra é que os prédios não tivessem mais de 12 andares. Mas a exceção virou regra. Ao olhar a quadra, é impossível contar quantos edifícios foram erguidos no local. A administração regional da cidade também alega não saber o número exato. É muito comum encontrar casas espremidas no meio de edifícios. São pelo menos 30 prédios com obras em andamento. Há estimativas de que os empreendimentos residenciais aumentaram em até 900% o número de domicílios previsto por lote da Quadra 301. Um adensamento que, para os moradores, é sinônimo de perda da qualidade de vida. Nágela, por exemplo, desistiu de construir a piscina por causa da falta de privacidade. ;As pessoas do prédio enxergam todo o meu quintal;, reclama. Engarrafamentos A comunidade também reclama que a rede de água, luz e esgoto de Águas Claras não comporta mais o crescimento populacional, assim como as vias, que estão sempre engarrafadas. ;Quando me mudei para Águas Claras, a promessa era de que seriam 160 mil habitantes em 2045. Agora, a previsão é que passe de 260 mil;, diz o presidente da Associação de Moradores, José Júlio de Oliveria. O crescimento da cidade também preocupa o governo. Em julho de 2007, uma força-tarefa foi criada para investigar a concessão de alvarás em Águas Claras. Em setembro do ano passado, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (Seduma) solicitou que a administração suspendesse a aprovação dos projetos para a construção de edifícios e reestudasse os projetos já aprovados. Os técnicos do governo ainda estudam se novos prédios poderão ser erguidos na 301. Mesmo assim, a expansão de Águas Claras não acabou. Em uma área vizinha à quadra, um condomínio residencial busca ser licenciado e aprovado pelo governo. O empreendimento, da Direcional Engenharia, se chama Village Park e terá 13 torres de 14 andares. Mais 4 mil pessoas poderão se mudar para a cidade quando ele ficar pronto. ;O condomínio ocupa uma área de 140 mil metros quadrados e 50 mil deles serão área verde. É o menor adensamento populacional de Águas Claras;, defende Cristiano Goulart, responsável pelo projeto de impacto de vizinhança do empreendimento, que está em fase de aprovação pelo Instituto Brasília Ambiental (Ibram). O caso também foi levado ao Ministério Público do DF. O deputado distrital Chico Leite foi procurado por moradores e protocolou, no começo desta semana, uma representação denunciando o desvirtuamento da Quadra 301 aos promotores da ordem urbanística. ;O que tem havido em Águas Claras é o aproveitamento da necessidade de moradia da população pela ganância da especulação imobiliária, com a omissão ou cumplicidade do Estado;, afirma. O QUE DIZ A LEI As regras para a ocupação urbanística de Águas Claras foram definidas pela Lei Complementar nº 90/1998, que aprovou o Plano Diretor Local (PDL) de Taguatinga e que inclui a cidade. A lei permitiu que até dois domicílos fossem construídos nos lotes da Quadra 301 antes destinados para apenas uma habitação. Mas a legislação também deixou que uma quantidade maior de residências fossem construídas em caráter excepcional, desde que tivessem a anuência das concessionárias de serviços públicos do DF, como CEB e Caesb. Apesar disso, a norma não definiu um limite exato de número de domicílios que podiam ser feitos no lote. A única exigência é que os prédios respeitem o Código de Edificações de Taguatinga, ou seja, não podem ter mais de 12 andares.

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