Cidades

Permissionários de táxi alimentam esquema milionário no DF

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postado em 08/02/2009 08:23
Os carros de placa vermelha em circulação nas ruas do Distrito Federal escondem um esquema milionário em que um seleto grupo de proprietários de concessões de táxi fatura alto. O mercado clandestino de documentos gerou uma farra de permissões na capital federal. A lei determina a realização de licitação para a entrega das autorizações para conduzir táxis. Mas as permissões são vendidas de forma ilegal por valores que chegam a R$ 50 mil. Para driblar a legislação, os integrantes dessa máfia fazem contratos de gaveta ou procurações em nome de laranjas. Na outra ponta do esquema estão os motoristas que trabalham em um regime semelhante à escravidão. Os taxistas alugam as concessões e precisam dirigir até 18 horas por dia para conseguir pagar os custos do negócio. Documentos obtidos pelo Correio dão uma amostra das ilegalidades que estão em todo o sistema. Funcionários públicos do GDF ou do governo federal são proprietários de concessões, o que é proibido por lei. Algumas pessoas controlam mais de 50 autorizações para conduzir os veículos e alugam os documentos aos taxistas. O aluguel de um carro de placa vermelha, juntamente com a permissão, custa entre R$ 70 e R$ 100 por dia. Para dirigir um táxi, o condutor precisa pagar esse valor ao dono da concessão, além dos gastos com combustível, alimentação e limpeza do veículo. Assim, o taxista já começa o dia de trabalho devendo cerca de R$ 200, enquanto os permissionários estão longe das ruas, apenas administrando a pequena fortuna que o negócio movimenta. O secretário de Transportes, Alberto Fraga, diz ter conhecimento do problema e reconhece a situação do atual sistema de táxi na capital federal. ;Está uma esculhambação;, resume. ;Por isso, proibimos todas as transferências até concluirmos um cadastramento dos permissionários. Nesse levantamento, já foi possível constatar que há permissões vendidas e revendidas dezenas de vezes, o que configura uma irregularidade;, explica Fraga. Um dos pontos dessas transações ilegais funciona na 905 Norte. Em uma construção erguida irregularmente em área pública, o sargento do Exército Ari Henrique Henke administra um lucrativo negócio. Dono da empresa Henke Transportes LTDA, ele controla hoje pelo menos oito permissões. De acordo com taxistas que trabalham para o sargento, ele seria dono de 52 concessões. Além de deter a documentação, Henke também é dono de carros de praça. Diariamente, os motoristas que alugam carros da empresa do sargento passam pela 905 Norte para pagar de R$ 70 a R$ 100 ao controlador das permissões. Durante dois dias, o Correio acompanhou a movimentação no local. No barraco escondido em meio ao cerrado, o vaivém de táxis é grande. No período em que a reportagem acompanhou o movimento no local, o sargento Henke foi à 905 Norte quatro vezes, uma delas com farda do Exército. Em dois dias, 19 taxistas entraram e saíram da área para pagar a diária. Quando o militar não está, funcionários se encarregam de receber as taxas. ;Se a gente fica dois ou três dias sem pagar, eles já ligam cobrando;, conta um dos condutores que se valem do aluguel pela empresa do sargento. ;As permissões deviam estar nas mãos dos motoristas que ralam o dia todo;, reclama o taxista, que preferiu não se identificar. A reportagem teve acesso a 19 procurações registradas em cartório e assinadas pelo sargento Henke, em seu nome ou de sua empresa. Com elas, o militar recebe ou outorga poderes para administrar permissões de táxi e para tratar de assuntos relacionados a carros. As procurações foram assinadas entre 1998 e 2008. Por meio delas, Henke faz negócio com taxistas, uma dona-de-casa, uma cabeleireira, um diplomata e dois militares do Exército. O documento registrado em cartório autoriza o procurador a representar o dono da permissão nos órgãos competentes e a negociar o documento como bem entender. Ari Henrique Henke foi localizado pela reportagem mas, informado sobre o conteúdo das denúncias, afirmou não ter ;nada a declarar;. O aluguel das concessões é amparado pela figura do motorista auxiliar, prevista pela Lei 4.056/07, que regulamenta o sistema de táxi no DF. Pela legislação, o permissionário pode cadastrar um outro condutor na documentação. Nesses casos, o permissionário ;deverá prestar o serviço de táxi em pelo menos 50% do horário de operação, comunicando por escrito tal horário à unidade gestora para registro e fiscalização;. Somente em caso de doença ou incapacidade física é possível cadastrar dois condutores auxiliares que se revezariam no veículo enquanto o proprietário da permissão estivesse incapacitado de dirigir. Mas, na prática, o motorista registrado como auxiliar é quem trabalha no carro 100% do tempo. É ele quem paga aluguel para utilizar a documentação e poder trabalhar. O número O preço R$ 50 mil chega a custar uma concessão de táxi no mercado clandestino Ilegal, mas costumeiro Apesar de ilegal, o mercado das concessões está anunciado em classificados, na internet e estampado em cartazes próximos a pontos de táxi. Para repassar as permissões a terceiros, os proprietários cobram de R$ 40 mil a R$ 50 mil. Em dezembro do ano passado, a Secretaria de Transportes começou a fazer um cadastramento dos permissionários e proibiu as transferências de documentação. Ainda assim, as negociações continuam. Sem se identificar, a reportagem conversou por telefone com nove pessoas que anunciaram concessões de táxi para alugar ou vender. A maioria falou abertamente sobre o comércio, apenas dois vendedores pediram para tratar do assunto pessoalmente. Os interessados em ter documentação para dirigir táxi têm à disposição dezenas de opções de modelos de carros com placa vermelha, além de permissões para a compra ou aluguel. ;Peixes; Um dos vendedores disse que conseguiria transferir sua concessão, mesmo com a proibição estabelecida pela Secretaria de Transportes. ;Tenho uns ;peixes; (contatos) que conseguem resolver isso para mim;, disse o anunciante. Uma prova de que o comércio de placas está aquecido é a grande quantidade de pessoas interessadas em vender ou comprar permissões. ;Compro placa, pago à vista;, diz um anúncio. Até mesmo concessões de táxi emitidas por prefeituras do Entorno são negociadas. Um permissionário de Valparaíso cobra R$ 25 mil pelo documento. A lei proíbe que táxis de outras cidades peguem passageiros na capital, mas o dono da concessão goiana garante que é possível. ;Se você tiver contatos na praça, consegue fazer corridas no Distrito Federal. Só é difícil entrar em filas como a do aeroporto;, garante o vendedor. ;Mas se você quiser atuar aqui em Valparaíso, o mercado está melhor do que em Brasília. Tem menos concorrência;, finaliza. (HM)

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