Cidades

Secretaria investiga instituição escolar por emissão irregular de certificados de Ensino Médio

Guilherme Goulart
postado em 06/11/2009 08:15
Um esquema milionário de venda de históricos escolares e certificados de conclusão de ensino médio coloca em xeque a entrada de milhares de brasilienses na universidade. Irregularidades encontradas pela Secretaria de Educação do Distrito Federal no contrato de prestação dos serviços oferecidos pelo Instituto Latino-Americano de Línguas (Ilal) no Distrito Federal revelam a emissão de documentos sem qualquer valor perante os principais órgãos de educação do país. Em uma universidade particular do Plano Piloto, o ingresso de 39 alunos neste segundo semestre está sob suspeita.

O Ilal mantém quatro unidades de ensino na capital. Ficam na Asa Sul, Asa Norte, Águas Claras e Taguatinga. Como diz o próprio nome, deveria funcionar como centro de línguas. Nesse caso, o ensino é considerado livre e sem necessidade de credenciamento por parte do Ministério da Educação (MEC) ou das secretarias estaduais ou municipais de educação. Mas a Coordenação de Supervisão Institucional e Normas de Ensino (Cosine) da Secretaria de Educação do DF descobriu que a empresa oferece serviços de supletivo sem autorização e ainda gradua os estudantes no ensino médio.

A Cosine apurou que a fraude conta com instituições de outros estados. As declarações emitidas pelo Ilal são vendidas como comprovantes de conclusão de ensino médio ; parte delas atesta a modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA), em educação a distância. E aparecem acompanhadas de históricos escolares atestados pela Empresa de Pesquisa, Ensino e Cultura (Epec), com sede em Jacaparepaguá, no Rio de Janeiro. De acordo com a Secretaria de Educação, nenhuma instituição de ensino de fora do Distrito Federal tem competência para emitir diplomas na capital. Além da prática ilegal, a Epec teve as atividades encerradas por decreto pelo governo do Rio de Janeiro em setembro deste ano.
[SAIBAMAIS]
A coordenadora da Cosine, Leila Pavanelli, classifica a atuação do Ilal no DF como ;clandestina;. ;Entendemos que lesa o cidadão por não ter especificação para emitir qualquer certificado. Esta instituição, por exemplo, nunca entrou com nenhum pedido de credenciamento para ofertas de supletivo;, afirmou. A Ilal deixa evidente na própria propaganda, como folders e informativos, expressões como ;supletivo; e ;MEC;. O nome do Ministério da Educação também aparece pintado em muros das unidades da escola.

A reportagem conversou ontem pela manhã com uma atendente do Ilal, localizado na 502 Sul. Ela detalhou a forma de atuação da escola. Dá preferência, por exemplo, a candidatos às vésperas de prestar vestibular. Segundo a funcionária, o aluno precisa ser aprovado em uma prova feita via na internet para ser diplomado no ensino médio ; o preenchimento das questões pode ser feito com consulta. Depois disso, recebe os certificados. ;Seriam 90 dias úteis para a entrega do histórico e 120 dias úteis para a entrega do certificado;, explicou (leia diálogo ao lado).

A partir da situação exposta pelo Correio ; um estudante de 19 anos que reprovaria por faltas ;, a atendente informou que cobraria R$ 1,8 mil pelo serviço. Informações levantadas pela Secretaria de Educação revelam que são emitidos por mês, em média, 30 certificados de conclusão de ensino médio em pelo menos duas unidades do Ilal. Cálculo simples dá noção do tamanho do empreendimento. São 60 documentos expedidos por mês, o que levaria a 720 alunos lesados por ano. Em cinco anos, tempo de existência do Ilal no DF, alcançaria quase 4 mil universitários.

Matrícula cancelada
A Cosine recebeu três denúncias de pais de alunos que pagaram para ter o certificado do Ilal. Nenhum deles demonstrou saber da falcatrua antes de pagar pelo serviço. Também recebeu ofício do Centro Universitário de Brasília (Uniceub) em 30 de setembro deste ano, quando a universidade colocou em dúvida a aprovação de 39 alunos com menos de 18 anos ; segundo a Resolução n; 1/2009 do Conselho de Educação do DF, menores de 18 anos não podem se matricular no EJA. São 22 de direito, seis de administração, dois de engenharia civil, três de psicologia, dois de relações internacionais, um de biomedicina, um de análise e desenvolvimento de sistemas, um de ciência da computação e um de engenharia da computação.

Para o secretário-geral do Uniceub, Maurício Neves, o negócio praticado pelo Ilal é um absurdo e uma afronta. Ele aguarda uma resposta da Secretaria da Educação do DF para cancelar a matrícula provisória dos 39 universitários. ;Os alunos já estão de sobreaviso. Muitos deles sabem o que está ocorrendo porque já conseguiram liminares na Justiça para manter as matrículas;, afirmou. O secretário contou que não é a primeira vez que a fraude foi aplicada por calouros na universidade. No início do ano, um rapaz apresentou a declaração do Ilal, vinculada a uma instituição do Paraná.

; Análise da notícia
Apuração até o fim

Marcelo Tokarski

Não é de hoje que a educação virou um balcão de negócios em nosso país. Prova disso é o surgimento de várias faculdades que concedem diplomas não reconhecidos pelo Ministério da Educação, de cursos com baixa qualidade (mas com mensalidades salgadas) e de vestibulares sem qualquer critério para a seleção dos novos universitários.

Ainda assim, é inadmissível que, na capital do país, exista um suposto esquema de concessão irregular de certificados de conclusão do ensino médio. Justamente onde a fiscalização sobre esse tipo de ilegalidade deveria ser exemplar. Mas não é. Apesar de denúncias feitas pela Secretaria de Educação, órgãos de fiscalização nada fizeram.

Agora, a apuração dessa denúncia deve ir até o fim. Para que se punam os responsáveis, é claro, mas também para que se descubra se, entre os estudantes, existem aqueles que, por opção, se beneficiaram do esquema. Nesse caso, eles também devem ser punidos. Só assim, conseguirão aprender que educação não é uma mercadoria a ser comprada na prateleira do supermercado.

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