Cidades

Bares incomodam em 12 entrequadras

Principais reclamações dos moradores são a ausência de vagas, o barulho e com a circulação de pessoas nas áreas residenciais. Empresários e governo defendem um local específico para os estabelecimentos

Rodolfo Borges
postado em 13/11/2009 08:00

Principais reclamações dos moradores são a ausência de vagas, o barulho e com a circulação de pessoas nas áreas residenciais. Empresários e governo defendem um local específico para os estabelecimentosO bar Miau que Mia abriu suas portas com enorme sucesso em 25 de agosto. Uma data que os moradores da SQS 108 não vão esquecer tão cedo. Desde que o estabelecimento, inspirado na França dos anos 1920, começou a funcionar, os condôminos dos 11 blocos da quadra residencial não têm sossego. ;Temos receio de circular à noite, nossos jardins viraram banheiros e faltam vagas para os moradores dos prédios, que não têm garagem interna;, reclama Sandoval Cervo, síndico do Bloco C, o mais afetado pelo bar. E reclamações semelhantes existem em outras quadras do Plano Piloto, onde a convivência entre donos de bar e moradores piora a cada ano.

Na Asa Sul, as quadras mais problemáticas são 108, 203, 204, 206, 208, 303 e 405. Na Asa Norte, as reclamações mais constantes ficam com os moradores das quadras 107, 109, 209, 210, 312, 408 e 704. São 14 pontos problemáticos em 12 das 57 entrequadras da cidade, além de um ponto na 704 Norte ; o que não significa que os moradores das outras quadras não tenham suas reclamações.

O incômodo causado pelos bares é antigo(1) no Plano Piloto, mas continua como a principal reclamação registrada pelo Conselho Comunitário da Asa Sul ; seis dos 13 prefeitos e representantes presentes à última reunião do grupo, em agosto, relacionaram problemas aos estabelecimentos ; e rivaliza apenas com as denúncias de invasão de área pública no conselho da Asa Norte.

São queixas com relação à ausência de vagas, ao barulho e à circulação excessiva de pessoas estranhas debaixo dos blocos. ;Depois que o bar abriu, já houve tiroteio na quadra. Um dos nossos porteiros disse que pensa em voltar para o Piauí porque por aqui ficou muito perigoso, e um inquilino já decidiu se mudar;, afirma Cervo.

Confusão
Também incomodados pela implicância constante dos vizinhos, os donos dos bares argumentam que há boates e restaurantes próximos a residências em todo o Brasil, e apenas os brasilienses não conseguem conviver com isso. Para o presidente do Sindicato dos Hotéis, Bares e Restaurantes (Sindhobar), Clayton Machado, o o atrito no Plano Piloto é fruto de confusão acerca do tombamento da cidade. ;Engessaram Brasília. As pessoas não entendem o que pode ou não ser feito e defendem a proibição de tudo;, explica Machado, que atribui o problema ao mau aproveitamento dos setores de diversões Sul e Norte.

;O empreendedorismo imobiliário tomou conta desses espaços e o Setor de Diversões teve de se espalhar;, explica Machado, acrescentando, contudo, que esse tipo de concentração em um setor não existe em outro lugar do mundo. ;Sabemos que as pessoas de mais idade merecem paz, mas a cidade está crescendo. É preciso conviver com isso;, conclui.

O urbanista Frederico Flósculo discorda e dá exemplo de cidades do exterior que conseguiram crescer sem prejudicar os próprios moradores. ;Nova York é muito silenciosa. Mesmo na hora do rush, parece domingo. Tóquio também. E essas cidades nem têm a qualidade urbanística de cidade parque a partir da qual Brasília foi planejada;, compara o professor de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB). ;Temos de chegar no primeiro mundo em silêncio. Ele vale ouro;, complementa o urbanista.

Na opinião de Flósculo, o incômodo provocado pelos bares é o mesmo em todo o país, mas o brasiliense é mais sensível aos transtornos. ;A população que mora nos bairros de alta qualidade urbanística de Brasília desenvolveu uma compreensível intolerância a coisas que são toleradas em qualquer localidade do planeta;, argumenta. Outra explicação para o crescimento da implicância com os bares é o envelhecimento dos moradores do Plano Piloto, que já não têm tanto interesse na vida noturna quanto antigamente.

Solução
A melhor saída para o problema, segundo os empresários e administradores públicos consultados pelo Correio, seria arrumar um local para os grandes bares se instalarem. É nisso que a Administração Regional de Brasília trabalha. ;Precisamos de outras áreas para estabelecimentos maiores e já estamos urbanizando o Beira Lago (leia Para saber mais), próximo à terceira ponte;, diz a administradora Ivelise Longhi. Segundo ela, o Setor Comercial Sul e a Avenida W3 também podem servir à instalação dos bares.

A área próxima ao lago, que está na fase de colocação dos jardins, deve abrigar alguns bares junto com um terreno mais afastado do lago que hoje pertence à Terracap. Estima-se que a região possa abrigar 20 estabelecimentos ; ainda falta avaliar a amplitude dos estacionamentos. Existe a expectativa de que os bares que causam mais transtornos tenham preferência para ocupar o local, mas essa possibilidade ainda é avaliada do ponto de vista legal, segundo Ivelise.
[SAIBAMAIS]
Enquanto isso, a Administração Regional instrui os comerciantes para que eles se adequem à Lei dos Puxadinhos(2) até abril do próximo ano, quando as novas regras para a ocupação das quadras comerciais da Asa Sul entram em vigor ; levantamento realizado pelo Correio no mês passado mostrou que apenas três das cerca de 1,2 mil lojas apresentaram proposta de regularização. ;Estabelecemos um prazo de seis meses para estar com tudo amarrado;, diz Ivelise.

Inaugurado em 25 de agosto, o Miau que Mia se tornou alvo das reclamações dos moradores da 108 Sul

1- Fechamento
Desde 17 de janeiro de 2008, os bares do Plano Piloto devem fechar as portas à 1h, de domingo a quarta-feira, e às 2h de quinta-feira a sábado ou vésperas de feriado. O acordo firmado entre governo, moradores e empresários também estabelece que música mecânica, ao vivo ou com amplificadores só será permitida em ambientes com isolamento acústico.


2- Limites
A Lei n; 766, de 2008, aprovada em junho de 2008 e regulamentada em abril passado, estabelece que no caso da ocupação das laterais, como a utilizada pelos bares das pontas das quadras, só será permitida a colocação de mesas e cadeiras se respeitado o limite de 5m, e com a condição de que exista projeto paisagístico aprovado pela Administração Regional de Brasília.

; Para saber mais
Às margens do Paranoá


Encarado como uma das saídas para o problema dos bares no Plano Piloto, o Projeto Orla foi criado em 1995 com a finalidade de integrar os moradores de Brasília ao Lago Paranoá, mas nunca chegou a ser posto em prática efetivamente. O complexo Beira Lago, próximo à ponte JK, estava previsto como o Polo 6 do projeto ; que continha 11 polos ;, mas não previa exatamente um espaço gastronômico.

No plano original, o Polo 6 tinha por objetivo atender às necessidades cotidianas da população vizinha à área, com comércio de pequeno e médio porte, além de centros de lazer com casas de espetáculos e uma marina. Para materializar o Beira Lago, o Governo do Distrito Federal prometeu investir R$ 2,1 milhões. O investimento inclui a construção de píeres e calçadões do início da Ponte JK até o Clube da Associação dos Delegados de Polícia (Adepol).

Estão previstos também estacionamentos públicos (sem número de vagas definido), um parquinho infantil e uma praça com fontes. Além disso, instalação de lixeiras e jardinagem completa, com o plantio de grama, palmeiras e sistema de irrigação. Os empresários consultados pelo Correio acreditam que o complexo gatronômico pode ajudar a solucionar o problema dos bares do Plano Piloto e esperam avidamente pelo início do funcionamento.

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