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Promoções podem ser armadilhas

Pesquisa da Associação de Consumidores mostra que o custo dos financiamentos nos bancos pode ser menor do que o das concessionárias. Por isso, muita calma na hora de comprar seu carro Okm

postado em 19/04/2010 08:34
Na hora de comprar um carro a prazo, o consumidor não pode se iludir com as facilidades do financiamento. Hoje é possível comprar um automóvel zero quilômetro sem dar nenhum centavo de entrada, dividir o valor em até seis anos e seis meses, e sem juros. Parece atrativo? Então, é melhor pisar no freio. A calma e a paciência para pesquisar são regras básicas e imprescindíveis na hora de fechar um negócio, além de muita informação. A análise das ofertas não deve ficar restrita às opções de financiamento das concessionárias. Um levantamento da Associação de Consumidores (Proteste) divulgado este mês identificou melhores Custos Efetivos Totais (CETs) (1) nos bancos do que nas concessionárias (propostas geralmente oferecidas pelas revendedoras em parcerias com os bancos ou financeiras de sua montadora).

Elies de Paula conseguiu taxas menores no seu banco, mas o financiamento foi rejeitado pela concessionáriaNa pesquisa, o CET do financiamento de um carro de R$ 25 mil, por meio de CDC (Crédito Direto ao Consumidor), pago em 24 vezes, com 40% de entrada, variou entre 23% e 42% nas concessionárias. Já nos bancos, o CET para um carro de R$ 27 mil, financiado nas mesmas condições, variou entre 19% e 39%. O estudo consultou as quatro maiores montadoras e suas concessionárias (Chevrolet, Fiat, Ford e Volkswagen), nove bancos e as cinco administradoras de consórcios mais bem posicionadas no ranking do Banco Central. Também foram feitas simulações pelos sites das empresas.

;O consumidor não é obrigado a fechar negócio com o banco da concessionária ou montadora. Ele pode consultar outros propostas para aquele valor e a loja não pode se recusar a fazer o negócio ou condicioná-lo a uma determinada instituição financeira. Isso fere o princípio da liberdade de escolha;, explica a economista da Proteste Hessia Costilla.

Na prática, essa negociação não é tão simples assim. ;No sábado, 13 de março, ouvi no rádio a promoção Fest Saveiro, da Saga Veículos, na Epia. Fui até a loja e o vendedor apresentou a seguinte proposta: o carro sairia por R$ 31.890, financiado em 36 parcelas de R$ 1.257, com direito a trava elétrica, vidro elétrico, suporte no teto, capota marítima e jogo de tapetes. Aceitei e, como já estava quase no horário de fechamento da loja, fiquei de retornar na segunda-feira;, lembra-se o contador Elies de Paula Soares, 43 anos, que não levou a proposta impressa.

Antes de fechar o negócio, ele consultou o gerente de seu banco e obteve taxas mais vantajosas, com uma economia de R$ 3.450 ao fim do contrato. ;A concessionária tentou de todas as formas me vender pela financeira que faz o atendimento à loja. Segundo eles, aquele preço só poderia ser feito pelo banco da montadora. Ofereci pagar à vista, mas a Saga não aceitou. Disseram também que os acessórios seriam uma cortesia do banco com a fábrica. Eu não tenho nada a ver com os acordos firmados entre a fábrica e o banco;, diz Elies, que não conseguiu comprar o carro.

Induzir a erro
No entendimento do secretário-geral da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil ; seção Goiás (OAB-GO), Nayron Toledo, essa prática não chega a constituir venda casada (quando o fornecimento de um produto é condicionado à compra de outro), uma vez que a livre concorrência permite acordos de maneira a oferecer melhores preços e brindes. ;Mas se o anúncio da promoção não deixar claro que aquelas condições estão atreladas à parceria com determinada instituição financeira, isso é publicidade enganosa. O consumidor é induzido ao erro. Afinal, a concessionária vende carro e não crédito;, avalia Nayron.

Tanto interesse, por parte das concessionárias, em fechar o negócio por meio de um determinado banco tem uma explicação. Segundo o presidente da Associação Brasileira do Consumidor (ABC), Marcelo Segredo, as financeiras costumam oferecer um bônus às concessionárias para cada contrato firmado por meio da agência. ;E quem paga esse agrado ; sem saber ;, na maioria das vezes, é o consumidor. Esse valor é chamado de taxa de retorno e é abusivo. No entanto, é identificado no CET como serviços de terceiros ou serviços autorizados. Dessa forma, a financeira paga esse valor à vista para a loja e embute essa quantia no financiamento do consumidor, que irá saldá-lo ao longo dos meses, com juros e correção monetária;, alerta Marcelo.

Nesse sentido, não basta apenas comparar os CETs. É preciso saber quais tarifas, seguros e serviços compõem esse Custo Efetivo Total, e se eles são legais. ;Em geral, os consumidores não têm acesso ao contrato antes de assiná-lo. A concessionária apenas emite uma proposta, com o valor e forma do financiamento, se CDC ou leasing (arrendamento mercantil), e o CET não detalhado. É direito do cliente conhecer todos os encargos da operação por meio do CET discriminado;, ensina Marcelo.

André Peredo descobriu os incovenientes do leasing após ter o carro roubadoEsse detalhamento do CET é importante tanto para identificar as cobranças indevidas quanto para desmistificar propagandas muito vantajosas, como as do juro zero, por exemplo. ;Juro zero não significa custo zero. Em alguns financiamentos, os juros podem até ser zero, mas são cobradas taxas de administração e de abertura de crédito mais caras do que as convencionais;, alerta a economista da Proteste.

A falta de clareza sobre o que pode compor o CET também contribui para abusos contra os consumidores. ;A Resolução do Conselho Monetário Nacional n; 3.517/2007 institui apenas a obrigação de informar o Custo Efetivo Total, mas não especifica nem limita a quantidade de taxas e serviços em cada operação;, avalia a economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. Na prática, para um financiamento por meio do CDC poderia ser cobrado apenas juros, imposto sobre operações financeiras (IOF) e tarifa de abertura de cadastro, caso o cliente não seja correntista do banco. Já o leasing é isento de IOF;, acrescenta Ione. Por essa razão, o Idec encaminhou, semana passada, um documento ao Banco Central sugerindo uma limitação sobre os encargos que podem compor o CET.

1 - Custo total
O Custo Efetivo Total (CET) representa o custo total de uma operação de empréstimo ou de financiamento. Ele deve ser expresso em forma percentual e englobar não apenas a taxa de juros, mas também tarifas, tributos, seguros e outras despesas cobradas do cliente. Essa taxa deve ser informada ao consumidor antes de qualquer operação de crédito ou arrendamento mercantil.

Cuidado com o leasing
O consumidor pode adquirir um carro financiado por meio de CDC ou por meio de arrendamento mercantil (leasing). Embora a diferença entre os CETs das duas modalidades não seja significativa, as características das duas modalidaes são diferentes. Como no financiamento pelo CDC há cobrança de IOF, então esse CET é um pouco maior. Talvez por isso e por falta de informação sobre o assunto, a Proteste identificou em sua pesquisa uma tendência dos vendedores em oferecer o leasing aos consumidores. ;O consumidor precisa estar ciente da diferença entre as duas modalidades antes de assinar o contrato, afinal isso irá interferir no prazo para financiamento, nas condições de quitação antecipada e até na retomada do bem em caso de inadimplência;, alerta a economista Hessia Costilla.

Diferentemente do CDC, o leasing não é uma operação de crédito e sim um contrato de aluguel do carro com a opção de compra no final. Ocorre que as instituições financeiras se apropriaram do leasing como uma forma de financiamento e utilizam a condição de ;arrendamento mercantil; apenas quando lhe é conveniente. Dessa forma, não é oferecida ao consumidor a opção de devolver o carro ao final do contrato. No entanto, quando se deseja quitar o bem antes de dois anos é cobrada uma multa por rescisão contratual, já que no arrendamento mercantil isso só pode ser feito após a 24; parcela.

O psicólogo André Pereira Peredo, 26 anos, só descobriu os inconvenientes do leasing ao ter o automóvel roubado há pouco mais de um mês. ;O carro tem seguro e, como está arrendado em nome do Banco Fiat, a seguradora vai pagar a indenização à instituição financeira. Além disso, o banco quer cobrar multa de quase R$ 500 por quebra de contrato, além do mesmo valor por ter que passar o contrato para o nome da seguradora;, conta André. A advogada do Idec Maíra Feltrín Alves entende que ;essas taxas são excessivamente onerosas para o consumidor;. ;Primeiro porque o contrato não foi rompido por vontade do cliente. Segundo porque o aditamento contratual é custo que faz partes das operações bancárias. Se ele não conseguir retirar essas cobranças, deve questionar esse pagamento na Justiça;, orienta a advogada.

Respostas das empresas
Banco Fiat
;Esses serviços representam custos para a instituição e comodidade ao cliente. Também, para possibilitar o pagamento, deve ser realizada modificação contratual, uma vez que a seguradora assumirá os direitos sobre o veículo sinistrado, gerando também custos para a instituição. Como remuneração dos custos acarretados é cobrada a tarifa de aditamento contratual.;

Saga Veículos
;Não consta em nossos registros nenhuma negociação formal realizada com o Sr. Elies. Todas as negociações são realizadas formalmente, de maneira clara, objetiva e especiais para cada consumidor. A Saga não perde negócio e aceita financiamento por meio do banco indicado pelo cliente e, também, realiza parceria com alguns bancos na tentativa de buscar condições diferenciadas e mais atrativas. Em algumas negociações é possível obter das financeiras brindes ao cliente, tais como CD player, protetor de carter, tapetes, vidros elétricos, entre outros. Em relação ao relatado, entramos em contato com o Sr. Elies para identificar o ocorrido e buscar satisfazê-lo, esclarecendo, ainda, todas as dúvidas que eventualmente tenham surgido.;

ANTES DE PARCELAR A COMPRA DE SEU AUTOMÓVEL
; Pesquise o Custo Efetivo Total (CET) tanto nas concessionárias quanto nos bancos.

; Feche negócio com quem oferecer as melhores taxas.

; Cheque se as tarifas e os serviços incluídos na operação são legais. Para tanto, peça o CET discriminado.

; Em geral, no CDC é permitida a cobrança de juros, IOF e tarifa de abertura de cadastro, caso o cliente não seja correntista do banco. Já o leasing é isento de IOF.

; Questione a cobrança de taxas por serviços de terceiros, serviços autorizados e seguros não contratados.

; Juro zero não significa custo zero. Nesse tipo de operação, as taxas podem ser mais onerosas.

; O serviço de despachante é opcional. Você mesmo pode cuidar do emplacamento do seu carro e pagar apenas as taxas obrigatórias.

; Leasing não é uma operação de crédito. É um arrendamento mercantil e, portanto, tem alguns inconvenientes: o prazo mínimo de financiamento é de 24 meses, a quitação antecipada sem o pagamento de multa só é permitida a partir da 24; parcela e o carro fica em nome da empresa de leasing arrendado ao comprador até que o bem seja quitado.

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