Cidades

MP diz não abrir mão das UTIs

Apesar de os médicos afirmarem não ser necessária a instalação de unidades de terapia intensiva nas clínicas, promotoria insiste na exigência

postado em 14/07/2010 08:05
Desde 2000, pelo menos 11 mulheres já morreram no Distrito Federal e em Goiás durante cirurgias plásticas realizadas em clínicas. O caso mais recente é o da tesoureira Marinalda Araújo Neves Ribeiro, 46 anos, que não resistiu ao um procedimento de lipoaspiração a que foi submetida na última sexta-feira. Diante da série de mortes, o Ministério Público do DF sinaliza para a obrigatoriedade da instalação de um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) nas 17 clínicas de cirurgia plástica que funcionam na capital. O objetivo é garantir pronto atendimento aos pacientes, que, na mesa de operação, correm risco de sofrer complicações, como perfuração de órgãos, alterações na circulação sanguínea, tromboelismo, entre outras. Apesar disso, os representantes da área médica especializada acreditam que a medida é desnecessária. Para o promotor de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-Vida), Diaulas Costa Ribeiro, ;existe interesse econômico; por trás dos argumentos contrários à implantação das UTIs.

Para Diaulas Costa Ribeiro, por trás dos argumentos contrários está o O valor da diária de um leito dessas unidades é de R$ 10 mil. A quantia mensal chega a R$ 300 mil. De acordo com o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica(SBCP), Sebastião Guerra, a obrigatoriedade resultaria no fechamento de 805 das clínicas do Brasil. Em Brasília, 17 estabelecimentos realizam procedimentos cirúrgicos estéticos, segundo a SBCP. ;Isso (a implantação de UTI nas clínicas) é um absurdo. O MP não sabe o que está fazendo. O índice de complicações em uma cirurgia plástica é tão pequeno que os equipamentos da UTI nunca vão ser usados. No dia que precisar, eles estarão obsoletos;, argumenta. ;Se for para criar as unidades em clínicas, vão ser fechadas 80% das clínicas do país;, completa. Para Guerra, três motivos podem levar um paciente à morte durante esses procedimentos: negligência, incompetência e imprudência do médico . ;Estamos lutando para evitar e prevenir essas situações;, afirma.

Necessidade
O vice-presidente da SBCP, Ognev Meireles, afirma que para manter um leito de UTI 24 horas em funcionamento é preciso um efetivo médico reforçado ; o que implicaria um aumento significativo na folha de pagamento das clínicas. ; Seria preciso quatro médicos, dois auxiliares de enfermagem e duas enfermeiras. Ao todo, oito funcionários para manter um leito;, explica. O número, segundo ele, é o mesmo necessário para o funcionamento de 10 leitos. ;Fica mais barato ir ao hospital;, argumenta. ;Se tiver que aumentar o custo, vamos fazer isso para dar uma suposta segurança;, acrescenta.

No entanto, Ognev reconhece a qualificação da medida do MP. ;É claro que, com a UTI estando mais próxima, o risco é menor. Dois minutos para chegar até uma unidade são fatais para esse paciente. Mas o atendimento que de emergência que ele precisa receber é dentro da sala de cirurgia. E os centros cirúrgicos têm os equipamentos necessários para prestar esse atendimento imediato;, destaca.

De acordo com o conselheiro Antonio Carvalho do Conselho Regional de Medicina do DF, o CRM está em consonância com MP. Para ele, as clínicas que realizam procedimentos cirúrgicos devem ter uma estrutura adequada para realizar a transferência do paciente, quando necessária, para uma UTI já contratada em um hospital regularizado, conforme determina a Resolução n; 7 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. ;Em princípio, fazer com que todas as clínicas tenham esses leitos não é uma medida possível, não há necessidade. É preciso que haja um acesso físico adequado para que o paciente seja removido em caso de urgência, como elevadores largos e rampas de acesso;, destaca o conselheiro.

;Se não fosse necessário, o MP não estaria pedindo. A presença da UTI não é facultativa. Isso é uma questão econômica, porque vai aumentar o custo. Os médicos vão ter que fazer isso de uma forma ou de outra;, declara o promotor Diaulas Ribeiro.

FAMÍLIA ABRE PROCESSO
; Na última sexta-feira, a família da jornalista Lanusse Martins Barbosa, 27 anos, protocolou na Justiça uma ação de responsabilidade civil contra o Hospital Pacini. A jovem perdeu a vida durante lipoaspiração realizada em 25 de janeiro de 2010, no hospital localizado na 715/915 Sul. Investigações concluíram que houve erro do médico Haeckel Cabral Moraes, que acabou denunciado por homicídio qualificado pela morte da jornalista. O processo está na 4; Vara Cível de Brasília.

Principais complicações

; 1; ; Perfuração de órgãos: pode acontecer por descuido médico. Dependendo da gravidade da lesão e do órgão afetado, pode ser fatal. Além disso, pode provocar graves hemorragias.

; 2; ; Retirada excessiva de gordura corporal: pode causar alterações na circulação do sangue e anemia aguda.

; 3; ; Tromboelismo: é a formação de coágulos nas veias, que podem migrar para o pulmão, onde impedem a passagem de sangue por uma artéria. Como consequência, ocorre a embolia pulmonar, que pode levar ao aumento da frequência cardíaca e ao aumento exagerado da respiração, entre outros sinais clínicos.

Fonte: Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica


GDF aguarda posição final

O governador Rogério Rosso (PMDB) comentou ontem a hipótese de o Ministério Público pedir a cassação dos alvarás das clínicas que realizam cirurgias plásticas e não contam com a estrutura de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). ;Já até pedi um parecer sobre isso às áreas de saúde e de fiscalização. Temos que agir a respeito de qualquer coisa que apresentar riscos à vida. Se, tecnicamente, for considerado que há risco sem a UTI, se necessário for, vamos ter que cassar o alvará. Mas vamos aguardar.; O diretor de Vigilância Sanitária do DF, Gustavo de Lima, afirma que mesmo que haja a possibilidade legal, o fechamento das clínicas que não se adequarem às exigências não será feito de imediato. ;É problemático, de uma hora para outra, fechar tudo. Estamos estudando com o Conselho Regional de Medicina e o MPDF a melhor maneira;, destaca.

Caminho certo
Para o diretor, o MPDF está no caminho certo ao defender a obrigatoriedade de leitos nesses estabelecimentos. ;Cada clínica tem que fazer um contrato com um hospital. O problema que estamos percebendo é que o paciente não consegue chegar a tempo à UTI, pois morre antes.; Na opinião dele, a questão econômica não pode falar mais alto que a saúde. ;Qual é o custo maior, o financeiro ou a vida?;, indaga.

;A grande complexidade é identificar qual é o real perigo de uma cirurgia plástica;, aponta Gustavo. Segundo ele, antes, havia o entendimento de que o risco seria baixo. ;Primeiro porque a pessoa não está doente, é uma cirurgia de embelezamento.; Mas, de acordo com ele, o que tem ocorrido com frequência são procedimentos que resultam em perdas de vidas e em outras deformidades. ;O risco da cirurgia plástica vai muito além da morte. Muitas pessoas que ficam com sequelas sofrem para o resto da vida. Algumas em estado vegetativo. Daí a importância de restringir esse procedimento. Para evitar mortes, a UTI é um passo gigantesco;, avalia. (MS)


"A grande complexidade é identificar qual é o real perigo de uma cirurgia plástica"
Gustavo de Lima, diretor de Vigilância Sanitária do DF

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