Cidades

GDF fará gestão das UPAs

Um ano depois de terceirizar os serviços das unidades de pronto atendimento, o governo volta atrás e garante que o contrato com a Cruz Vermelha será rompido. A organização já recebeu R$ 1,6 milhão

Helena Mader
postado em 24/08/2010 07:32
Quase um ano depois de terceirizar a gestão das unidades de pronto atendimento (UPAs), o Governo do Distrito Federal suspendeu o contrato com a Cruz Vermelha Brasileira e decidiu que vai colocar as UPAs em funcionamento com recursos e funcionários próprios. Os prédios que vão abrigar as quatro primeiras unidades já estão prontos e a população cobra rapidez no início dos atendimentos. O governo já havia repassado R$ 1,6 milhão à organização social que venceu a licitação, mas auditorias realizadas pela Secretaria de Saúde detectaram supostas irregularidades no contrato, que acabou cancelado. A Cruz Vermelha Brasileira de Petrópolis (RJ), que ganhou a concorrência pública para gerir as duas primeiras UPAs, estuda recorrer à Justiça para retomar a parceria com o governo local.

Concluída há cinco meses, a unidade do Recanto das Emas, que fica na entrequadra 400/600, sofre com a ação constante de vândalosPelo cronograma inicial da Secretaria de Saúde, as unidades de Recanto das Emas e de São Sebastião deveriam ter aberto as portas aos pacientes em dezembro do ano passado. Mas o contrato com a Cruz Vermelha seguiu para análise no Tribunal de Contas do DF e a execução também foi prejudicada pela crise política que atingiu a cidade em novembro, com a Operação Caixa de Pandora. Quando assumiu a pasta, Fabíola Nunes de Aguiar abriu auditoria para reavaliar o contrato e, agora, decidiu suspender a parceria com a organização. Mas o governo ainda não sabe como vai conseguir destacar mais de 200 servidores para cada uma das UPAs, já que há empecilhos à contratação de pessoal em ano eleitoral.

Enquanto dura o impasse sobre a gestão, as estruturas que estão prontas sofrem com atos de vandalismo e com o desgaste do tempo. No Recanto das Emas, a construção do prédio foi concluída há mais de cinco meses e a comunidade se indigna ao ver as instalações vazias, sem médicos ou equipamentos. A UPA da cidade, que fica na entrequadra 400/600, está com as paredes pichadas e os vidros quebrados. No último dia 17, um homem de 38 anos morreu no posto de saúde do Recanto das Emas à espera de atendimento, o que só aumenta a revolta da população diante do abandono da unidade de pronto atendimento.

O diretor de Urgência e Emergência da Secretaria de Saúde, Airton de Castro Barroso, diz que o objetivo do governo é gerir as UPAs em parceria com o Corpo de Bombeiros. ;A Secretaria vai assumir a contratação de pessoal, a compra de insumos e a organização da rede para colocar pelo menos quatro UPAs em funcionamento até o fim deste ano;, afirma Airton. ;A primeira a abrir as portas deve ser a de Samambaia, o que vai acontecer até o fim de setembro;, acrescenta o diretor.

Para cada unidade, é necessário pelo menos 205 funcionários, entre médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem e auxiliares administrativos. A Secretaria de Saúde ainda não sabe como vai deslocar essa quantidade de servidores para cada unidade de pronto atendimento. A expectativa é que a inauguração das UPAs esvazie a emergência dos hospitais. ;Com as unidades em funcionamento, será possível fazer efetivamente a classificação de risco no pronto-socorro dos hospitais. Isso certamente terá um impacto positivo no atendimento;, afirma Airton.

Auditoria
O contrato entre a Secretaria de Saúde e a Cruz Vermelha Brasileira foi analisado pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal por conta de denúncias do Ministério Público do TCDF. Em representação apresentada aos conselheiros, a procuradora Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira questionou a legalidade do contrato e pediu a sua suspensão. ;Não se prova por qual motivo se socorre da terceirização, sem tentar investir na própria capacidade instalada. Prefere-se o trespasse de recursos para instituições privadas, à custa da frouxidão dos controles, em vez do investimento sólido em ações e serviços públicos de saúde;, justificou a procuradora em sua representação.

Ela também questionou o projeto básico apresentado pela Cruz Vermelha. ;Basta ler o projeto das UPAs. De tão vago, não obedece aos conceitos legais de projeto básico, por isso, não serve para orientar um procedimento de contratação legítimo. Não há (no contrato), objetivamente, parâmetros e critérios de aferição e pagamento desses serviços;, finaliza Cláudia Fernanda. O Tribunal de Contas não acatou o pedido para suspensão do contrato, os conselheiros pediram apenas informações complementares à Secretaria de Saúde. Mas depois de analisar uma auditoria interna, a própria secretária Fabíola Aguar decidiu suspender a parceria.

O advogado da Cruz Vermelha, Ricardo Binato, diz que a entidade não recebeu informações detalhadas sobre os motivos da suspensão e afirma que a organização pode recorrer à Justiça para tentar manter o acordo. ;O processo passou pelo Tribunal de Contas, que, em nenhum momento, recomendou a suspensão do contrato. Apresentamos as informações solicitadas, mostrando que o contrato era perfeitamente regular, mas, ainda assim, fomos surpreendidos com o cancelamento. Provavelmente vamos recorrer à Justiça porque não tivemos direito à ampla defesa;, afirma o advogado.


Comunidade protesta


Quem depende da rede pública de saúde se revolta diante do abandono das UPAs que estão prontas, mas continuam de portas fechadas. As unidades do Núcleo Bandeirante, Samambaia, São Sebastião e Recanto das Emas foram concluídas mas, como não há definições sobre a forma de gestão, continuam vazias.

A dona de casa Eva Ferreira Lima da Silva, 53 anos, mora no Recanto e tem um filho com deficiência mental que necessita de atendimento médico regular. A família precisa sempre recorrer ao Hospital de Base ou à emergência da unidade de Taguatinga. ;É um absurdo esse prédio abandonado e todo pichado enquanto a gente precisa de médico. Temos que pegar vários ônibus para buscar atendimento e se a UPA já estivesse funcionando tudo seria mais simples;, explica.

Para a servente Maria Aparecida Moreira, 44 anos, também moradora do Recanto das Emas, é necessário investimento rápido para que as UPAs comecem logo a funcionar. ;No posto de saúde, quase nunca tem médicos. Então, temos que ir para os hospitais de outras cidades, como Ceilândia ou Samambaia;, reclama. ;Este mês, morreu um homem no posto de saúde do recanto porque não tinha ninguém para atender. O povo precisa de melhorias na saúde;, acrescenta a servente.

O pedreiro Sebastião dos Santos, 61 anos, recorre ao Hospital de Base quando necessita de atendimento médico. ;Mas lá, além de longe, é muito bagunçado. Eu precisei de uma cirurgia, mas perderam o meu prontuário e tudo atrasou. O ideal para a gente é que tenha um lugar de atendimento perto de casa;, afirma.


Como funcionam as UPAs

; As unidades de pronto atendimento são um projeto do Ministério da Saúde para a realização de procedimentos de média complexidade. Seria um espaço intermediário o que oferece um posto de saúde e um hospital. Lá, os pacientes podem ficar em observação por até 24 horas, com atendimento em especialidades como clínica médica, pediatria, ortopedia e odontologia. Pela estratégia do governo federal, as UPAs devem funcionar em parceria com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).

; Assim, quando um paciente em estado grave chega a uma UPA, ele pode ser levado com rapidez ao hospital mais próximo. As UPAs são divididas de acordo com o número de pessoas que pode atender. A classificação varia de 1 a 3. As oito UPAs previstas para o DF são de nível 3, ou seja, podem atender uma população de 200 mil a 300 mil habitantes. Pelo projeto da UPA, o Ministério da Saúde faz três repasses aos estados ; os dois primeiros de R$ 1,6 milhão e o último de R$ 600 mil ; para edificar e equipar as unidades. Até agora, o DF recebeu a primeira parcela de cada uma das quatro unidades já prontas.

Onde serão construídas as oito UPAs previstas para o DF (os prédios das quatro primeiras já estão prontos):
; Recanto das Emas
; Samambaia
; São Sebastião
; Núcleo Bandeirante
; Arapoanga
; Taguatinga
; Ceilândia
; Sol Nascente

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