Cidades

Nasce um talento do balé

Único candidato brasiliense do sexo masculino selecionado para a disputada Escola Bolshoi de Joinville, aluno de 14 anos do Colégio Militar de Brasília prepara-se para o voo mais alto de sua vida, que inclui mudar-se da cidade e passar a ter dedicação integral a um curso que pode ajudá-lo a construir uma carreira internacional

postado em 25/08/2010 08:23
Único candidato brasiliense do sexo masculino selecionado para a disputada Escola Bolshoi de Joinville, aluno de 14 anos do Colégio Militar de Brasília prepara-se para o voo mais alto de sua vida, que inclui mudar-se da cidade e passar a ter dedicação integral a um curso que pode ajudá-lo a construir uma carreira internacionalOs movimentos são precisos; o olhar, distante e focado. A impressão que o espectador tem ao ver Vítor Sousa de Oliveira, 14 anos, dançar balé clássico é a de que a relação entre ele e o palco é antiga. Há apenas três anos praticando a arte, no entanto, o adolescente é o primeiro brasiliense do sexo masculino a ser selecionado para a Escola Bolshoi(1), em Joinville (SC) ; a única instituição do gênero fora da Rússia. Para participar do grupo, Vítor disputou, com outros 500 bailarinos, um total de 12 vagas. Agora, o aluno do 9; ano no Colégio Militar de Brasília (CMB) prepara-se para deixar a capital em fevereiro. A aprovação no concurso o fez desistir de vez daquele que era seu sonho profissional até então: ser médico. Quem quiser conferir seu talento tem, a partir de hoje, uma boa oportunidade, durante o festival de dança realizado em comemoração aos 32 anos do colégio.

;Agora tenho certeza de que o que eu quero é ser um grande bailarino. Vou estudar e me dedicar muito para isso. Quero me formar e ser chamado para dançar em algum grande grupo;, afirmou. Filho de um militar mineiro e de uma professora carioca, Vítor teve seu talento para a dança descoberto por acaso. Aos 12 anos, na abertura dos Jogos Internos do colégio, o menino foi até o local onde as bailarinas ensaiavam para líderes de torcida e, de brincadeira, fez uma estrela e uma abertura, movimentos que aprendeu nas aulas de ginástica olímpica que frequentava desde os 10 anos. Foi então que uma das dançarinas do corpo de baile, Maria Eduarda Medved, despertou para o possível talento do garoto. ;Eu chamei a nossa professora e falei para ela. Quando ela viu, resolveu convidá-lo para fazer parte do corpo de baile. Não era comum um menino ter tanta habilidade;, orgulha-se a adolescente que, a partir de então, tornou-se amiga de Vítor. ;Assim que vi o Vítor, tive certeza de que ele seria um grande bailarino. Ele tem o perfil, o físico para a dança;, lembra a diretora, professora e coreógrafa do Corpo de Baile do Colégio Militar, Regina Helena Baston, responsável pela formação do artista.

De lá para cá, Vítor só cresceu ; tanto na dança quanto na estatura. ;Ele era pequenino, espichou de uma vez e amadureceu seu talento. De um ano para cá, principalmente, ele se desenvolveu muito profissionalmente;, considera a professora. A disciplina militar foi usada em prol da arte. Para se aperfeiçoar, o bailarino treina durante 2h30 todos os dias. Nada que o impeça de manter um boletim escolar impecável, com destaque para a área de ciências. Na nova escola, que ele conhecerá em novembro ; quando vai até Santa Catarina fazer a matrícula ;, as aulas de dança ganharão mais espaço na agenda, das 8h às 12h. Durante a tarde, por sua vez, Vítor se dedicará aos estudos regulares em uma escola pública. ;Quero aumentar ainda mais a minha concentração e disciplina. Acho que é o que falta;, planeja.

Hoje, dos 40 componentes do Corpo de Baile do CMB, apenas quatro são homens, contando com Vítor. ;Para o homem é mais difícil, o físico tem que ajudar. Não é como no caso das mulheres, que podemos tentar moldar;, destaca Helena Baston. Vítor é amigo de todas as meninas, que já começam a reclamar a falta que o talentoso colega fará. ;Quando fiquei sabendo que ele passou, não sabia se comemorava ou se chorava;, diz Maria Eduarda. Mesmo com a paixão evidente pelos palcos, Vítor revela que já pensou em desistir da dança. ;Houve uma época em que estava difícil conciliar com os estudos e eu pensei em parar. Mas depois vi que não queria sair, me dediquei mais e insisti.;

DestaqueVítor Sousa de Oliveira, entre o Corpo de Baile do CMB: %u201CVou estudar e me dedicar muito. Quro me formar e ser chamado para dançar em um grande grupo%u201D
Acompanhando o pupilo desde os primeiros passos, a professora Helena Baston surpreende-se com a conquista do garoto, apesar do pouco tempo de treino: ;É uma emoção e gratificação divina. Um presente da minha vida. Ele foi meu aluno desde o início, é minha cria;. O teste que garantiu a vaga na Escola Bolshoi veio após um festival do qual o dançarino participou em Joinville. Após um dia inteiro de provas, o resultado só foi conhecido momentos antes da meia-noite. ;Vimos juntos pela internet, foi uma festa;, lembra Helena. Em uma relação de confiança mútua, a única divergência entre aluno e professora vem quando o assunto passa longe do balé. ;Eu sou corinthiano, ela é palmeirense. Só tem esse probleminha;, brinca Vítor.

Para seguir sua trajetória nos palcos, o adolescente conta com o apoio de toda a família. A mãe e a irmã mais velha, de 16 anos, são as principais fãs. E a irmã mais nova, 6, resolveu entrar para o mundo da dança em homenagem ao irmão. ;Elas tiram muitas fotos e colocam em quadros na casa. Sou muito ligado à minha família e vou sentir saudades, já que vou morar sozinho, mas será por um bom motivo;, avalia o maduro menino. O pai do bailarino também dá todo o incentivo.;Meu pai sempre gostou de música, ele inclusive ensinou minha irmã a tocar violão. Está tudo em família;, diz o rapaz.

O segredo para o sucesso do garoto na dança, no entanto, vai além dos passos firmes e da flexibilidade. A tranquilidade de Vítor é um de seus trunfos. ;Ele nunca se exalta, tem um controle muito grande, o que é essencial no balé;, confirma a professora. Para o bailarino, o público também não é motivo de medo. ;No início dá um frio na barriga, mas quando vejo já estou lá.;

A Bolshoi já formou 104 alunos em seus cursos no Brasil. Alguns ex-alunos são reconhecidos no cenário mundial da dança, outros se encaminharam para a área pedagógica. E, se depender do histórico da instituição, após oito anos de estudos, o destino de Vítor será ainda mais longe do DF. Bailarinos que passaram pelo treinamento dançam atualmente em companhias da Áustria, da Alemanha, dos Estados Unidos, da Polônia e da Rússia. ;Quero dançar no American Ballet Theatre(2). Vi o grupo em um documentário e gostei muito. Quem sabe um dia?;, sonha.

1 - Patrimônio
O Teatro Bolshoi é uma das principais companhias de balé e ópera do mundo. É considerado patrimônio cultural da humanidade pela ONU e pela Unesco. O Bolshoi ; nome que em russo significa ;grande; ; foi fundado em 1776, quatro anos depois ganhou sua primeira sede e, em 1825, o prédio onde funciona até hoje. A Escola do Teatro Bolshoi no Brasil tem o mesmo ideal da Escola Coreográfica de Moscou, criada em 1773: proporcionar formação e cultura por meio do ensino da dança, para que seus alunos tornem-se protagonistas da sociedade.

2 - Referência
A American Ballet é a instituição oficial do balé de Nova York, EUA. Está localizada no Lincoln Center for Performing Arts. É considerada uma das mais prestigiosas escolas dos Estados Unidos. Fundada pelo coreógrafo George Balanchine, com ajuda do filantropista Lincoln Kirstein, funciona desde 1934, com destaque para o estilo clássico.

Para saber mais
Escola completa


A Escola de Bolshoi educa 244 alunos, dos quais 98% são bolsistas que recebem gratuitamente estudo, alimentação, uniformes, figurinos, materiais didáticos, transporte, orientação pedagógica, assistência médica emergencial e odontológico-preventiva, nutricional e fisioterápica, exames laboratoriais e oftalmológicos. Além disso, participam de intercâmbios internacionais, mostras artísticas, oficinas, palestras e têm acesso a laboratório de informática e música. O processo educativo é integral. Os alunos têm aulas de dança em um turno e, no outro, frequentam o ensino regular. A seleção anual para novos alunos compreende etapas que incluem avaliações médico-fisioterápicas e artísticas específicas.


Serviço

Programação do 3; Festival de Dança do Colégio Militar de Brasília

Hoje
Dança de salão: às 20h, na
Sala de Dança do CMB

Amanhã
Jazz, dança de salão, danças urbanas e dança do ventre: às 20h, no Auditório Presidente Castello Branco do CMB

Sexta-feira
Encerramento com grupos convidados:
às 20h, no Auditório Presidente Castello Branco.

Ingresso: 1kg de alimento não perecível ou 1 litro de leite longa vida.

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