Cidades

Idosos são mais de 40% dos analfabetos do DF

Naira Trindade
postado em 07/07/2011 08:00
José Augusto de Jesus, que veio de uma região rural, só se alfabetizou no ano passado:
Escrever uma carta, ler um livro ou simplesmente tomar o ônibus certo. Medidas singelas de sobrevivência se transformam em um desagradável obstáculo quando a tarefa de unir as letras não é compreendida por conta do analfabetismo. No Distrito Federal, pelo menos 67 mil pessoas acima dos 19 anos não sabem ler ou escrever, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Desse total, 29 mil ; o equivalente a 43,2% ; têm mais de 60 anos, perfil que, de acordo com especialistas, dificulta o aprendizado. Quase metade dessas pessoas está em casa. São 29 mil senhores e senhoras com 60 anos ou mais, que tiveram poucas oportunidades de frequentar um colégio na época certa. Outras 13 mil pessoas têm entre 50 e 59 de idade e 12 mil estão entre 40 e 49 anos (veja Radiografia ao lado).

Aos 50 anos, o trabalhador rural José Augusto de Jesus, hoje com 51, assinou seu nome pela primeira vez. A dura rotina de labuta numa roça de Anápolis ao longo de 40 anos de sua vida impossibilitou a frequência numa instituição de ensino. ;Não tinha escola, muito menos ônibus;, ressaltou o homem de origem simples, morador da Estrutural. As mãos calejadas retratam a dificuldade no trabalho de ajudar os pais a ganhar a vida no campo. Perdeu um dos dedos com a força da foice ao cortar madeira e jamais conseguiu entrar numa sala de aula.

A sorte do trabalhador rural começou a mudar no ano passado após a insistência da sobrinha Márcia Mariza Alencar,
33 anos. Penalizada com as dificuldades do tio, a dona de casa resolveu ensiná-lo a assinar o próprio nome. A letra legível, mas levemente garranchada, foi registrada em 21 de dezembro passado na nova Carteira de Identidade. ;A antiga tinha o carimbo do polegar;, conta, orgulhoso.

Desafio
A taxa total de analfabetismo do DF é a segunda menor do país. O percentual de habitantes acima dos 15 anos sem escolaridade na capital do país é de 3,4%. A média nacional é bem maior, de 9,7%. Para tentar mudar essa realidade, a Secretaria de Educação lança amanhã o programa DF Alfabetizado. A ideia é escolarizar 10 mil pessoas por semestre e zerar o analfabetismo até o fim de 2014.

Para convencer os adultos a retonarem à sala de aula, a secretaria vai contar com os alunos de escolas públicas em uma espécie de ;trabalho de formiguinha;, no qual os estudantes devem identificar na vizinhança possíveis analfabetos acima dos 15 anos interessados em retomar ou em começar a estudar. ;Diante desse perfil, estamos preocupados com a metodologia de ensino. Educar jovens e adultos não é mesma coisa que educar crianças. Eles precisam saber que não serão tratados como crianças. A forma de abordagem será diferente, voltada para essas pessoas que já trazem um grau de conhecimento avançado;, explicou o secretário adjunto de Educação, Erasto Fortes.

Neste segundo semestre, serão abertas 500 turmas. Até dezembro de 2014, serão ao todo 3.250. De acordo com Erasto Fortes, haverá uma ação prioritária em três territórios que apresentam o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mais baixo do DF: Estrutural, Itapoã e Sol Nascente/Pôr do Sol ( locais ligados à Diretoria Regional de Ceilândia). As estratégias de ação contemplam a territorialidade, consideram que a escola pública seja responsável pela alfabetização em sua área geográfica de abrangência e ainda preveem a continuidade dos cursos de alfabetização e Educação de Jovens e Adultos (EJA).

O secretário adjunto explica que o programa tem o intuito de ampliar a oferta na rede pública do DF e efetuar a matrícula do alfabetizado na escola mais próxima do local (espaço físico externo) em que estiver ocorrendo a ação alfabetizadora. A matrícula no DF Alfabetizado vai ocorrer a qualquer período, na secretaria da escola pública de EJA. A garantia da oferta de vagas para a continuidade de estudos na rede pública de ensino em turmas de EJA e regulares cumpre a determinação do artigo 225 da Lei Orgânica. Será trabalhado um currículo contextualizado com o mercado de trabalho, reconhecendo o alfabetizando como ser de cultura e saber.

Fique por dentro
Analfabetismo absoluto: ocorre quando a pessoa recebeu pouca ou nenhuma instrução e não consegue ler e escrever. Nesse caso, não
faz a decodificação dos símbolos alfabéticos. Grande parte não consegue nem mesmo assinar o próprio nome.

Iletrismo: quando não há compreensão daquilo que se lê. O problema atinge todas as camadas da sociedade e, geralmente, está ligado a
um ensino falho recebido na escola. No Brasil, a falta de incentivo
aos sistemas educacionais é um dos causadores do iletrismo.

Analfabetismo funcional: é o tipo mais comum. Nele, a pessoa consegue ler e escrever frases curtas, mas não tem noção do seu significado. Consegue decodificar os símbolos, mas não compreende o que eles querem dizer.

Radiografia
67 mil habitantes do Distrito Federal acima de 19 anos ainda não são alfabetizados, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Desses:

; 1 mil têm entre 20 e 24 anos
; 4 mil, entre 25 e 29 anos
; 8 mil, entre 30 e 39 anos
; 12 mil, entre 40 e 49 anos
; 13 mil, entre 50 e 59 anos
; 29 mil, acima de 60 anos

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