Cidades

Grutas e paredões guardam vestígios dos primeiros habitantes do Planalto

Renato Alves
postado em 24/10/2011 07:00
O Distrito Federal está cercado por sítios arqueológicos. Grutas e paredões em meio a fazendas de gado do Entorno conservam pinturas rupestres e ferramentas feitas há até 12 mil anos pelos primeiros habitantes do Planalto Central. Essa riqueza se concentra em Formosa (GO), na Chapada dos Veadeiros (GO) e em Unaí (MG). Mas muito tesouro milenar já foi identificado em terras candangas.

Técnicos da Universidade Federal de Goiás (UFG) e da Universidade Católica de Goiás (UCG) fizeram a maioria dos estudos sobre os antigos animais e os primeiros homens do Planalto Central. O arqueólogo goiano Eurico Miller encontrou as primeiras pistas de sítios pré-históricos no DF, na região do Gama, em 1991.

[SAIBAMAIS]Miller deparou-se com dois sítios em uma antiga região de mata densa, derrubada em 1960. Neles, havia restos de cerâmica e artefatos de pedra, espalhados nas cabeceiras do córrego Ipê, onde hoje está a Universidade Holística e Cidade da Paz. No ribeirão Ponte Alta, Miller e um grupo de exploradores localizaram vestígios de quatro sítios arqueológicos.

O achado indica que ali havia uma aldeia indígena de formato circular, característica de um povo conhecido como Jê. Ainda na Ponte Alta, os arqueólogos identificaram outros dois sítios, com artefatos de cerâmica feita pelos homens das cavernas, um deles bem maior e também de formato circular. Já no começo de 1993, Miller descobriu em Taguatinga, às margens do córrego Melchior, cinco sítios.

O lugar tinha características de acampamento de caça. Um ano depois, os cientistas acharam 16 sítios arqueológicos na área do rio Descoberto. Cinco eram taperas de fazendas coloniais. Uma das ruínas de fazenda estava sobre um sítio indígena milenar. Pelos cálculos de Miller, alguns desses sítios teriam de 7 mil a 7,5 mil anos.

No entanto, nunca escavaram os 19 sítios arqueológicos do DF, espalhados principalmente por Gama e Taguatinga. A falta de exploração impede conclusões precisas. As peças fabricadas pelos primeiros moradores de onde viria ser a capital do Brasil se perderam em meio à ocupação desordenada, nos últimos 20 anos, quando finalizaram as pesquisas.

Artistas das cavernas

Desde o fim do século 19, quatro expedições científicas visitaram as grutas e os sítios arqueológicos de Formosa, a 70km de Brasília. Por dois anos na década de 1970, arqueólogos da UFG exploraram as cavernas da bacia hidrográfica do Rio Paranã. O resultado do trabalho deu origem à publicação de um relatório detalhado e único sobre a fase pré-cerâmica e de arte rupestre do Planalto Central, em 1977.

Devido aos traços finos, os desenhos das grutas de Formosa foram feitos com instrumentos fabricados só para a arte, como pincéis de madeira, concluíram os arqueólogos. No caso das pinturas maiores, eles supõem que os homens das cavernas usaram os próprios dedos para fazer os contornos. Já as tintas, à base do extrato de sementes, tinham formas variadas.

O estudo também traz o primeiro registro de oficinas líticas na região. As oficinas são pontos com vestígios de ferramentas e utensílios fabricados pelos homens das cavernas. Os pesquisadores encontraram 1.350 peças na área rural de Formosa. Os artefatos e fósseis humanos e animais coletados foram para o Museu Antropológico de Goiânia.

Acesso difícil
Diferentemente das famosas grutas de Minas Gerais, como Lapinha (Lagoa Santa), Maquiné (Cordisburgo) e Rei do Mato (Sete Lagoas), mantidas pelas prefeituras, nenhuma das cavernas do Entorno é explorada turisticamente. Elas não têm infraestrutura para visitas. Por isso, o passeio a esses sítios é aconselhável somente na companhia de pessoas que conheçam muito bem o lugar e com o uso de material de segurança adequado, como capacete, luvas, botas e lanterna.

O Sítio Arqueológico do Bisnau fica a 125km de Brasília, em uma propriedade distante 46km do centro de Formosa, próxima da BR-020, rodovia que leva à Região Nordeste do país. Nessa fazenda, em vez de tintas, os pioneiros do Centro-Oeste usaram ferramentas para desenhar em arenitos, uma rocha frágil. As gravuras em baixo-relevo são classificadas como petroglifos pelos cientistas.

Alguns dos poucos turistas que visitam o Bisnau não ajudam a preservá-las. Para aumentar a visibilidade do desenho, eles riscam o baixo-relevo com giz, tinta e outras pedras. Técnica desnecessária, pois a própria natureza dá destaque à obra pré-histórica. No pôr do sol, a sombra produzida no baixo-relevo ressalta a forma da gravura com o contraste da pedra.

Montanha de pedra
Além do Bisnau, onde o acesso é gratuito, as atrações mais fascinantes de Formosa são as grutas em uma faixa de serras e morros rochosos entre a Serra Geral do Paranã e o Espigão Mestre da Serra Geral, no vão do Paranã. Os blocos se estendem por 8,5km. A aparente descontinuidade da formação, com quatro picos mais elevados ; são apenas a ponta de uma montanha rochosa soterrada ao longo de milhares de anos ;, levou os moradores da região a batizar o bloco maior de Lapa da Pedra.

É nessa área, com 1,8km de extensão, que se concentra o maior número de grutas e pinturas rupestres. Apesar da proximidade do centro da cidade (8km), o acesso à Lapa da Pedra é difícil. Ela está em uma fazenda de gados de corte, em meio à mata fechada. Só há placa em frente a uma das porteiras da propriedade. Mesmo com os 70m de altura, o paredão rochoso não é visto da estrada. Para chegar até ele, só com um guia.

Apesar do difícil acesso, as grutas e os demais sítios arqueológicos de Formosa sofrem com a depredação. Muita coisa já se perdeu completamente. Ao longo dos tempos, fazendeiros arrendaram as terras para mineradoras. Alguns dos paredões e cavernas foram destruídos. Explodiram pinturas, fósseis e formações que levam milhares de anos para se compor, como estalagtites e estalagmites. Viraram pó ou pedras para exportação. O que sobrou é alvo constante de vandalismo.

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