Cidades

Pesquisa mostra que DF é onde tem mais ciclistas de classe média

Pesquisa traça o perfil de quem pedala no Brasil e aponta que 81,3% dos ciclistas vão trabalhar sobre duas rodas

postado em 08/12/2015 06:05

Todos os dias, Sabrina Mendes roda 20km de bike: hábito adquirido quando morava em Paris e nunca esquecido

O ciclista brasiliense usa a bicicleta principalmente para ir ao trabalho, está insatisfeito com a infraestrutura cicloviária do Distrito Federal e reclama que falta educação na relação dos motoristas com quem está sobre duas rodas. A conclusão faz parte da pesquisa Perfil do Ciclista Brasileiro, primeira do gênero no país e que será lançada oficialmente na capital hoje. Dez cidades foram analisadas, em um universo de 5.012 ciclistas ; 433 deles no DF. A amostragem trouxe um dado curioso: o perfil de renda do DF é o mais bem distribuído entre todas as cidades pesquisadas. ;Isso demonstra que a adesão de quem ganha mais ao uso das bicicletas começou a ocorrer de fato. E mostra uma mudança de pensamento maior em relação ao meio de transporte em Brasília;, garante Renata Florentino, coordenadora da ONG Rodas da Paz, responsável por dirigir a pesquisa na capital.

De acordo com os dados, 81,3% dos entrevistados usam as bikes para se dirigirem ao trabalho e 76,9% vão para a escola e a faculdade sobre duas rodas (era possível marcar mais de uma opção). Sobre a renda, a maior porcentagem entre os usuários é de quem ganha entre um e dois salários mínimos ; 22,2%. Os que recebem entre cinco e 10 salários representam 11,1%.

A analista de inteligência de mercado Sabrina Mendes, 30 anos, representa bem esse perfil. Ela começou a andar de bicicleta há cinco anos, quando morava em Paris. ;Foi aos poucos, como uma forma de tentar ajudar o meio ambiente. Só que, quando me dei conta, estava necessitando disso diariamente. Hoje, só me sinto disposta a trabalhar se venho pedalando.; Diariamente, ela percorre 20km para ir e voltar do trabalho, e, apesar de entender que viver no Plano Piloto é melhor para quem quer trocar o carro pela bicicleta, não nega os problemas que enfrenta. ;A falta de educação é o pior. Não tenho carro por opção, mas há muitos motoristas que acham que, quem não tem, é um cidadão de segunda qualidade. Já fui xingada várias vezes.;

Um dos grandes problemas apontados por usuários e especialistas é a falta de planejamento das ciclovias. O DF tem 411km de malha cicloviária, mas as reclamações são constantes, como trajetos mal definidos, falta de placas de sinalização ou em desacordo com o Código de Trânsito Brasileiro em ciclovias, além da ausência delas nas pistas de velocidade entre as regiões administrativas.

Para o cicloentregador Mateus Bartuci, 24, apesar da necessidade dessas faixas como uma tentativa de trazer mais conscientização no trânsito, é preciso entender também que a bicicleta é um meio de transporte e pode dividir a mesma pista que os carros. ;As ciclovias são importantes para dar visibilidade, mas, para locomoção, elas não condizem com a necessidade de quem precisa usá-la para trabalhar. Há pedestres demais, além de muitas dessas faixas serem mal pensadas;, analisa. Bartuci é sócio em uma empresa que usa bicicletas para fazer entregas e, garante, as vias expressas são pensadas apenas para quem está em veículos motorizados. ;Há motoristas que ainda ficam indignados de terem que compartilhar a pista. Mandam a gente ir para calçada, para o parque, até para Cuba. Não veem a bike como um meio de transporte.;

Brasília também é, entre as cidades pesquisadas, aquela com maior quantidade de ciclistas que fazem integração com outro meio de transporte ; no caso da capital, o metrô. ;Comecei a pedalar para fugir do estresse do trânsito em Águas Claras. Ia de metrô até o Plano Piloto e, depois, seguia de bicicleta;, conta o cientista político Marcelo Sabóia, 30. ;O transporte público precisa ser de qualidade, mas é também necessário pensar nessas outras formas de mobilidade;, garante.

Em nota, a Secretaria de Mobilidade afirma que está desenvolvendo dois planos de mobilidade, a pé e por bicicleta, que servirão como diretrizes para os próximos anos de governo, mas sem especificar que tipo de ação será efetivamente tomada.

Segurança e educação

O profissional de educação física Elmio Tagy Felipe dos Reis, 40, trocou definitivamente o carro pela bicicleta depois de um acidente, em 1991. Desde aquela época, percorre os mais diversos trajetos sempre sobre duas rodas e consegue ver bem as mudanças que ocorreram não só na estrutura oferecida aos ciclistas, mas na relação deles com quem dirige. ;Eu morava no Jardim Botânico e ia para as escolas em que dava aula, em Taguatinga Sul e em Ceilândia. A educação é um processo lento, mas ela é melhor agora, sim;, lembra. Para ele, a mudança de consciência que aconteceu entre 1991 e 2015 existe, mas ainda não é totalmente satisfatória. ;Temos muito mais motoristas entendendo o lado dos ciclistas e respeitando. Mas o poder público ainda continua se preocupando mais com quem tem carro.;

Para Zé Lobo, coordenador-geral da pesquisa, há uma relação direta entre a falta de infraestrutura cicloviária e a pouca educação no trânsito. Ele acredita que, ao oferecer mais base para a segurança da relação entre quem anda de bicicleta e carro, mais pessoas vão se sentir à vontade para buscar na bike uma opção de transporte. ;As ruas estão aí, e o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é claro quanto ao nosso direito de circular nelas com preferência sobre motorizados. Mas, sem educação e respeito, só a lei não basta.;

O artigo 58 do CTB é claro: ;Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores;.

Essa preocupação com uma relação mais pacífica entre motoristas e ciclistas fica mais evidente no DF quando é sabido que 38,1% dos entrevistados estão entre 15 e 24 anos. De acordo com Renata Florentino, da Rodas das Paz, o número mostra o potencial em cativar as faixas etárias mais jovens para que elas continuem a pedalar. ;Se eles usam a bike para ir à escola e à faculdade, também podem querer continuar a usá-la para ir trabalhar;, justifica.

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