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Perillo defende PM preso e investigado por liderar grupo de extermínio

Tenente-coronel que assumiu o comando do policiamento da Região Metropolitana de Goiânia é apontado como autor de mais de 100 mortes no estado. Metade das vítimas não tinha ficha criminal. PF e MPF ainda investigam o oficial

Renato Alves
postado em 27/02/2016 14:15

O governador de Goiás Marconi Perillo (PSDB) defendeu que Ricardo Rocha que foi absolvido de

Acuado, o governador de Goiás decidiu reagir. Após um dia de silêncio dele e dos seus assessores, Marconi Perillo (PSDB) falou sobre a polêmica nomeação do tenente-coronel Ricardo Rocha para o Comando do Policiamento da Capital, responsável pelo patrulhamento da Região Metropolitana de Goiânia. Irritado com o questionamento dos jornalistas, o tucano afirmou que o oficial é ;extremamente operacional; e ;rigoroso; no combate ao crime.

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Apontado pelo Ministério Público de Goiás (MPGO), pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Polícia Federal (PF) como líder de um grupo de extermínio ; acusação que lhe rendeu uma prisão ; o Ricardo Rocha assumiu o Comando do Policiamento da Capital nesta sexta-feira. A nomeação, tornada pública pelo site do Correio Braziliense, causou constrangimento no Palácio das Esmeraldas, sede do Governo de Goiás. Nenhuma autoridade quis dar entrevista ao longo de todo o dia.

Perillo foi o primeiro a falar sobre o caso. Ele deu a declaração após ser aboradado por um batalhão de jornalistas, na manhã deste sábado (27/2), durante o encontro nacional do PSDB, em Goiânia. Incomodado com a pergunta, Perillo defendeu que Ricardo Rocha foi absolvido de ;vários crimes;.

;Ele estava em Caldas Novas (GO) comandado um importantíssimo comando em uma cidade que recebe mais de 3 milhões de pessoas por ano. Eu nunca vi ninguém da imprensa questionar o coronel Ricardo Rocha quando ele estava em Caldas Novas. A população de Goiânia está amedrontada e o trago para cá, com o vice-governador (José Eliton, também secretário de Segurança Pública), um coronel que é extremamente operacional para combater o crime e de repente começam a criticar;, bradou o governador.

Marconi Perillo não parou por aí. ;Quando matam pessoas inocentes, criticam. Quando colocamos alguém rigoroso para combater os bandidos, criticam também. Não dá. Nós temos de levar estas coisas a sério. Nossa ordem é proteger os cidadãos de bem e correr com os criminosos;.

O governador continuou: ;Nós não queremos bandidos em Goiás. A população se cansou e nós tomamos medidas duríssimas para afugentar os bandidos;, finalizou. Ele, no entanto, não falou das mortes de inocentes atribuídas a Rocha e ao bando de policiais matadores supostamente liderado por ele.

A nomeação de Rocha faz parte de uma série de mudanças nas cúpulas das polícias Civil e Militar de Goiás, em um plano de segurança pública do governo estadual. Anunciado com o nome de Tolerânica Zero, ele teve início na manhã de sexta-feira, com o intuito de diminuir os índices de violência, em especial os de assassinatos, na Região Metropolitana de Goiânia. As mudanças começaram com a posse do novo secretário de Segurança Pública de Goiás, o vice-governador José Eliton, que assumiu a secretaria na quinta-feira (25).

Impunidade

Apesar de ainda não ter sido condenado por nenhum dos crimes atribuídos a ele ; processos estão em andamento ou foram extintos por falta de testemunhas ;, Ricardo Rocha é alvo de investigação sigilosa da Polícia Federal. A apuração, que está em andamento, culminou em prisões recentes em Formosa (GO) ; leia reportagens relacionadas nos links ao lado.

Impunes na esfera estadual, crimes atribuídos a PMs goianos (entre eles Rocha) que atuam ou trabalharam no Entorno do DF foram federalizados em dezembro de 2012. A decisão partiu do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Por unanimidade, ministros da Corte acataram parcialmente o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) e transferiram quatro processos da Justiça estadual para a Justiça Federal.

Parte dos crimes federalizados dizem respeito às mortes em série ocorridas em Goiás e denunciadas pelo Correio Braziliense desde 2009, por terem características de ação de um grupo de extermínio. Todas as vítimas eram moradoras de rua e teriam sido executadas por policiais militares goianos em uma espécie de limpeza, em troca de propinas de comerciantes.

Sexto Mandamento


Os casos estão entre os 50 apurados pela PF e que culminaram na Operação Sexto Mandamento (em referência ao decálogo bíblico, cujo sexto mandamento é ;não matarás;), em fevereiro de 2011, com a prisão de 19 PMs de Goiás. Entre eles, o então subcomandante-geral da PM goiana, coronel Carlos Cézar Macário, um tenente-coronel, um major, dois capitães, um tenente, dois subtenentes, um sargento e quatro cabos. O major era Ricardo Rocha.

Também estavam sob investigação o ex-secretário de Segurança Pública de Goiás e ex-deputado estadual Ernesto Roller e o ex-secretário da Fazenda estadual Jorcelino Braga, ambos na condição de suspeitos pela prática de tráfico de influência que resultaram nas promoções de patentes de integrantes da organização criminosa.


Os casos de homicídios estão entre os 50 apurados pela PF e que culminaram na Operação Sexto Mandamento
Roller, à época da Sexto Mandamento, era procurador-geral de Goiânia. Ele foi candidato a vice-governador de Goiás na eleição de 2010 pela chapa de Wanderlan (PP), derrotada. Segundo apuração do MPGO, responsável por uma série de investigações contra o bando de matadores, Roller teria protegido os PMs investigados, promovendo-os após serem denunciados à Justiça por suposto envolvimento nas mortes de inocentes.


Apoio político


Ricardo Rocha foi denunciado pelo MPGO por participação em uma chacina com cinco mortes e por crime de pistolagem. Tudo quando ele era o subcomandante da PM em Rio Verde, no Sudoeste goiano. Após as mortes em série, Rocha foi transferido para Goiânia, onde comandou a Rotam entre 2003 e 2005. Época em que a PM mais matou na capital.

De 6 de março de 2003 a 15 de maio de 2005, foram registrados 117 homicídios em Goiânia cuja autoria é atribuída a PMs, a maioria da Rotam. Das 117 vítimas, 48,7% (57 pessoas) não tinham ficha criminal. Outras 60 (51,3%) eram foragidas da Justiça ou acusadas de algum crime.

Em meio a investigação do MPGO sobre esses casos, o major voltou a Rio de Verde. Em seguida, foi para Formosa, terra natal e base eleitoral do então secretário de Segurança Pública de Goiás, Ernesto Roller.

Foi o próprio Roller quem nomeou Rocha para assumir o 16; Batalhão. Em solenidades e entrevistas à imprensa do estado, Roller não economizou elogios ao major. Declarou que ele diminuiu a violência, mas nunca apresentou as estatísticas.

Fazendeiros de Formosa também defendiam Rocha. Chegaram a fazer festa para ele após série de reportagens do Correio sobre a matança na região. Rocha ainda recebeu homenagem da PM, em Goiânia, na despedida do cargo que deixou para disputar a eleição de 2010 como deputado estadual, com apoio de Roller. Mas Rocha teve negado o registro de sua candidatura pela Justiça Eleitoral, por irregularidade na sua inscrição eleitoral.

Mortes em série

Em 2008, os PMs admitiram ter tirado a vida de 10 das 48 pessoas assassinadas em Formosa. Outros cinco casos ocorreram no segundo semestre de 2007. Na maioria dos registros, os militares alegaram confrontos com bandidos armados. Mas, grande parte das vítimas não respondia por delitos graves e morreu com ao menos um tiro na cabeça. Em quase nenhuma suposta troca de tiros houve moradores como testemunhas.

O aumento no número de mortes no município com a chegada do major Ricardo Rocha ao batalhão de Formosa, em 2007, chamou a atenção do MP e da Polícia Civil de Goiás, que abriram investigações sigilosas na capital do estado. Antes de Formosa, o major esteve em Rio Verde, onde é acusado de executar cinco condenados que haviam fugido da cadeia e de matar com cinco tiros um homem desarmado.


Cartaz do candidato a deputado estadual Ricardo Rocha, suspeito de envolvimento em crimes e com grupo de extermínio em Formosa e interior de Goiás
Apesar do histórico de violência, os PMs ficaram pouco tempo na cadeia após a Sexto Mandamento. Hoje, quase todos estão livres, na ativa e gozando de prestígio nos quartéis. Há suspeitas de que um deles voltou a matar por ordem de superiores.

Morosidade

A PGR queria que oito casos parados na Justiça goiana fossem repassados para a Justiça Federal, com acompanhamento do MPF e diligências da PF. Com a decisão do STJ, quatro vítimas tiveram os casos federalizados, o restante das ações foi mantida na Justiça de Goiás, mas com recomendação de prioridade.

[SAIBAMAIS] Em agosto de 2012, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deu parecer favorável à federalização de investigações das oito ações penais e inquéritos policiais de crimes de homicídio, tortura e desaparecimentos forçados cometidos em Goiás. O parecer consta da manifestação final enviada ao ministro Jorge Mussi, do STJ, relator do Incidente de Deslocamento de Competência (IDC-3), nome oficial do pedido.

O governo do Estado, segundo Janot, não tomou providências para investigar outros casos de desaparecimento forçado. Há ainda casos levados ao Judiciário que sequer têm a fase inicial do processo concluída. Por isso, o procurador considera a necessidade de federalização também para garantir o processamento dos autos em prazo regular. Dessa forma, ele rebate, além do governo goiano, o Tribunal de Justiça e o MP de Goiás, que se posicionaram contrários à federalização.

Em junho de 2012, a pedido de Mussi, uma diligência foi enviada à Goiás para analisar o andamento de cada investigação. Os técnicos do STJ constataram que os inquéritos não vinculados a pessoas presas estavam parados.

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