Cidades

Escutas telefônicas confirmam esquema de fraudes na máfia das próteses

Em quase 4 minutos de conversa, o médico Juliano Almeida e Silva e o empresário Micael Bezerra Alves, um dos sócios da TM Medical, empresa que fornecia as próteses, falam sobre como melhorarum pedido de uma cirurgia de retirada de hérnia

Isa Stacciarini
postado em 05/09/2016 17:09

Em quase 4 minutos de conversa, o médico Juliano Almeida e Silva e o empresário Micael Bezerra Alves, um dos sócios da TM Medical, empresa que fornecia as próteses, falam sobre como melhorarum pedido de uma cirurgia de retirada de hérnia

Escutas telefônicas da polícia confirmam o esquema deflagrado na operação Mister Hyde, que atuou contra uma investigação criminosa formada por médicos e empresários do ramo de prótese acusada de superfaturamento de equipamentos, troca fraudulenta de próteses e até mesmo a realização de cirurgias desnecessárias em pacientes com o uso de material vencido nos procedimentos.

Em quase 4 minutos de conversa, o médico Juliano Almeida e Silva e o empresário Micael Bezerra Alves, um dos sócios da TM Medical, empresa que fornecia as próteses, falam sobre como ;melhorar; um pedido de uma cirurgia de retirada de hérnia. Os dois articulam quais procedimentos e equipamentos podem ser usados na cirurgia.

O médico fala com Micael e diz que está pedindo uma discectomia aberta e quer saber o que ;pode colocar a mais; e pergunta se tem ;aquele; de irrigação contínua, que ;joga e aspira;, sem saber exatamente qual aparelho seria o ideal para o procedimento. Ao fim da conversa, Micael diz que está vendo se tem mais algo a acrescentar e tranquiliza o médico: ;A Unimed paga R$ 8 mil, fica ruim não. Vamos tentar, né?;.

Fornecedor: Oi, Dr.
Médico: Micael, bom dia, tudo bom? To pedindo uma discectomia aqui, aberta, e o que dá pra gente colocar mais aqui? Vocês tem aquele de irrigação contínua, que joga e e aspira;
Fornecedor: Aspiração? Bomba de irrigação você fala?
Médico: Um aspirador que parece que joga o soro e aspira ao mesmo tempo...
Fornecedor: Tem irrigação aquele igual da ortopedia.
Médico: Acho que é isso mesmo, como é o nome, Equipo de irrigação?
Fornecedor: Equipo de irrigação, só isso mesmo que a gente pede. O mesmo que pede na discectomia fechada. Você vai fazer aberta né, vai tirar a hérnia, né?
Médico: É que to tentando melhorar aqui, que mais que a gente pode por aqui? Botei bipolar, botei brill, dois drill, botei mostático, botei motorização, equipo de ligação. O que mais?
Fornecedor: E se pedir a cânola para debridação, vale a pena?
Médico: O que é? Essa cânola. O que que é? Debridação?
Fornecedor: É a canolazinha que vem no kit da discectomia. Aí é só para enrolar mesmo.


[SAIBAMAIS]Desde o início da manhã, 15 vítimas procuraram a Divisão Especial de Repressão ao Crime Organizado (Deco). Pacientes preenchem um formulário sigiloso para, posteriormente, prestarem depoimento. Do total, duas foram ouvidas formalmente por delegados que trabalham nas investigações. Em razão da alta procura de denúncias, a Deco tenta com a Direção Geral da Polícia Civil autorização para que unidades circunscricionais possam, também, colher depoimentos de vítimas.

Um paciente de 41 anos que recebeu atendimento do médico Jhony Wesley, o neurocirurgião apontado pela polícia como líder do esquema, também compareceu à Deco para fazer a denúncia. O homem relata que passou por um procedimento cirúrgico, em maio de 2013, onde colocaram seis pinos e uma placa na coluna. Após o período de recuperação, as dores se tornaram frequentes. "Até hoje não consigo ficar muito tempo na mesma posição, sinto muito desconforto", alega. Mesmo antes da total recuperação, ainda foi sugerido outra cirurgia ao paciente. "Resolvi por conta própria não fazer. Mas nunca suspeitei de um esquema deste tipo, a gente acaba confiando nos médicos", frisa. O homem ficou quase 20 dias internado depois do atendimento. De acordo com o paciente, a cirurgia realizada custa R$ 120 mil.

A operação Mister Hyde teve início na última quinta-feira. Promotores do Ministério Público do DF e agentes da Polícia Civil cumpriram 21 mandados de busca e apreensão e 12 mandados de prisão contra a organização criminosa, após iniciarem a investigação em março deste ano. Médicos e empresários do ramo de órtese e prótese agiam em Brasília realizando superfaturamento de equipamentos, troca fraudulenta de próteses e até mesmo uso de materiais vencidos nos procedimentos realizados em pacientes.

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