Cidades

Duas ocupações às margens da BR-060 preocupam chacareiros

Cerca de 500 famílias vivem irregularmente na região, em espaço sem infraestrutura. Chacareiros reclamam de insegurança desde o início da invasão

Marlene Gomes - Especial para o Correio
postado em 21/02/2017 21:15
Coordenadora do movimento garante que acampamento não gerou insegurança
Chacareiros que moram nas margens da BR-060 reclamam da proliferação de barracos em área pública na região. No local, a Frente Nacional de Luta Campo e Cidade, um movimento social que tem como objetivo criar um programa de reforma agrária e de moradia popular, patrocina a ocupação irregular de mais de mil hectares de terra pública. No agrupamento vivem 500 famílias, em espaços sem infraestrutura adequada. Elas se dividem em duas ocupações ; o acampamento Chico Mendes e o acampamento Rosa Luxemburgo, reunindo cerca de 2,5 mil pessoas aproximadamente.

Com as duas invasões, cresce a movimentação de pessoas em volta das propriedades rurais e de terrenos regulares e aumenta também a sensação de insegurança na região. Donos de chácaras, alguns vivendo no local há mais de 30 anos, temem até mesmo falar abertamente sobre o assunto. "A situação é muito complicada para os chacareiros. Já teve assalto dentro de chácara, gente sendo ameaçada, ladrão de galinha, problemas de droga e até tiro para tudo que é lado. A gente está no meio da bagunça e se alguém achar ruim o que estou falando vou ter problemas", disse um chacareiro que não quis se identificar.
De um sítio, uma senhora fez um relato das experiências negativas que a família já passou. Somente no ano passado, narrou, o local foi roubado três vezes, inclusive com violência contra o caseiro em um dos episódios. Há duas semanas, o sítio foi roubado novamente ; os ladrões levaram a bomba de água, que estava em um poço, e cortaram os fios de energia, para roubar fios e cabos. ;Em 20 anos morando aqui, nunca tínhamos sido assaltados. Depois da invasão é que passamos a sofrer esse tipo de coisa. A região ficou muito insegura e a gente tem que procurar um jeito de se precaver;, explicou a mulher, acrescentando que o marido colocou cadeado na porteira para dificultar a entrada de estranhos.

A coordenadora estadual da Frente Nacional de Luta Campo e Cidade, Petra Magalhães, afirma que é um erro se atribuir episódios de violência na região ao crescimento da ocupação. Ao contrário ; afirma que no local há igreja e a polícia jamais foi chamada para resolver qualquer situação de violência nos acampamentos. Além disso, argumenta que os moradores são trabalhadores e as crianças vão à escola. ;Isso aqui não é uma invasão. É um enfrentamento da grilagem de terras do Estado. Cerca de 80% das terras de Brasília são griladas. Nós apenas nos organizamos e ocupamos uma terra pública que não está cumprindo a sua função social;, declarou.

No Chico Mendes, o acampamento em área urbana que existe há pouco mais de um ano, vivem 200 famílias. Devido à proximidade com a BR-060, quem passa pelo local pode observar a proliferação de barracos, mastros com bandeiras do Brasil e do movimento. Para cada grupo de 10 famílias existem dois coordenadores, sendo que uma escala estipula a responsabilidade de cada grupo pela segurança. ;Me surpreende qualquer notícia de reclamação dos chacareiros. Depois que viemos para cá, a região ficou foi mais tranquila. Havia muitos carros queimados e assaltos nessa área. Tinha uma história de um roubo de três mil reais em uma chácara, mas ficamos sabendo que foi uma ação de um ex-funcionário da chácara. Ninguém aqui nunca se envolveu em nada;, garantiu Petra Magalhães.

Segundo Rosa Beatriz Costa Lima, ao contrário do que se possa imaginar, o local abriga famílias de trabalhadores e não tem histórico de violência. A jovem, que vive no acampamento Chico Mendes com a companheira, Jeniffer Araujo, e três filhos, de 6, 9 e 10 anos, busca um trabalho. Cozinheira, está desempregada desde o ano passado. Por isso, disse que não conseguiu pagar o aluguel e as contas de água e luz da casa em que morava, na Cidade Ocidental. ;Preferi cortar essas contas para ter o que comer. Aqui, contribuo com R$ 30 reais por mês. O lugar é muito tranquilo e os meus filhos vão normalmente para a escola;, esclareceu.
Terreno de cerca de mil hectares na região é da Terracap
No trajeto de cerca de 3km, no meio da estrada que liga a BR-060 ao acampamento Rosa de Luxemburgo, um senhor fez um relato desanimador. Sem querer dizer o nome, por medo de represálias da direção do movimento, o homem explicou que só morava no acampamento porque estava desempregado e não conseguiu pagar o aluguel de R$ 500, no Recanto das Emas. Para sobreviver, o jeito foi aceitar pagar R$ 50 de inscrição para fazer a ficha do movimento e entrar no acampamento. Agora, ele desembolsa, mensalmente, R$ 80. Desse total, R$ 50 são contabilizados como contribuição destinada ao advogado que defende o movimento. ;Não é a minha escolha morar aqui. É necessidade. Não tive opção. Essa estrada é rota de fuga de bandidos de Samambaia e de Santo Antônio do Descoberto. Não passo aqui a noite e ando com cuidado até de dia;, detalhou.

Reintegração

A Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap) é proprietária da área de cerca de mil hectares no Km 11 da BR-060, que liga o Distrito Federal a Goiás. A empresa informou que entrou com uma ação de reintegração de posse e aguarda o posicionamento da Justiça para tomar as providências cabíveis. Em relação ao acampamento Rosa de Luxemburgo, informou que a "área carece de uma apuração dos reais detentores de títulos da terra e posterior divisão, ou seja, será preciso delimitar os limites de cada propriedade".

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