Cidades

Taxistas são obrigados a se modernizar após chegada de aplicativos

Desde o surgimento de empresas como o Uber, os valores das permissões e do aluguel dos veículos de placa vermelha despencaram no DF

Adriana Bernardes
postado em 05/04/2017 06:00 / atualizado em 19/10/2020 17:36



Durante 55 anos, dirigir um táxi em Brasília era exclusividade de profissionais credenciados pelo governo. Em um mercado sem concorrentes e com fiscalização precária por parte do Executivo, a categoria ditava as regras e, historicamente, cometia todo tipo de abuso. De recusa de passageiros a agressão a usuários, há de tudo um pouco. Esse cenário, porém, começou a mudar nos últimos três anos, após a chegada de aplicativos de celular que conectam o passageiro diretamente a um motorista, que pode ser taxista autorizado ou um prestador de serviço sem vínculo com o poder público. Desde 2014, há pelo menos cinco desses sistemas em funcionamento no Distrito Federal. A inovação transformou o mercado na capital, mas, sem regulamentação, atua sem qualquer controle público.

 



Motoristas mais gentis, carros limpos e possibilidade de pagamento da corrida por meio de cartão estão entre as mudanças sentidas pelos passageiros. Outras só sente quem vive do táxi. O comércio clandestino de permissão e o aluguel de placa vermelha sofreram um golpe. Como a última licitação do governo ocorreu há 38 anos — em 1979 —, os interessados em entrar no negócio desembolsavam até R$ 100 mil por uma licença. O aluguel de um carro com placa vermelha chegava a R$ 600 por semana. Depois que Uber, Easy Táxi, 99, YetGo e Cabify começaram a operar no DF,  o valor da permissão caiu para R$ 25 mil, e a locação, para cerca de R$ 400, por sete dias.

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No Distrito Federal, além do Uber, o YetGo e o Cabify conectam condutores direto ao usuário. A 99 e a Easy Táxi intermedeiam o serviço de taxistas, mas a primeira deve ampliar a atuação até o fim do ano, fazendo a conexão de consumidores com motoristas de placa cinza, como existe em São Paulo e no Rio de Janeiro. Para o músico André Luis (nome fictício), 47 anos, o Uber se tornou a principal fonte de renda há 10 meses. “Trabalho durante a manhã e parte da tarde. Recebo 75% do valor das corridas toda quarta-feira. Os ganhos chegam a R$ 3,5 mil”, conta.

Os aplicativos fizeram com que a estudante Emilly Ferreira, 22, migrasse do transporte público para o individual. Táxi está fora dos planos por causa do alto preço da corrida. “Os aplicativos deixam os preços mais baratos, e o serviço é melhor”, afirma. Mas também há um movimento inverso. Segundo Luísa Medeiros, 35, a concorrência melhorou a qualidade do serviço prestado pelos taxistas. “Acho (o táxi) mais seguro. E, agora, os motoristas estão mais gentis e até dão desconto”, comenta.

No ano passado, Hiran Magalhães Menon, 45, pagou R$ 75 mil pela permissão. “Ainda falta muito para recuperar o investimento”, conta. Sobre os aplicativos, ele se cadastrou em dois. No começo, viu vantagens no aumento do número de clientes. Mas, depois, a demanda se estabilizou. “O que o governo tem de fazer é aumentar o número de permissões. Faz muitos anos que promete ampliar a frota de táxi e não cumpre”, cobra Hiran.

Após série de agressões físicas entre taxistas e motoristas de aplicativos e até contra passageiros, o governo de Brasília regularizou o uso de aplicativos de transporte de passageiros. Mas ainda falta regulamentar a lei. Enquanto isso, o Executivo local desconhece quantas empresas desse tipo operam no DF, quantos motoristas prestam o serviço, se realmente são capacitados e se há pesquisa de antecedentes criminais. No sistema convencional, há 3,4 mil autorizações. Dessas, 3.181 pertencem a pessoas físicas e 219, a empresas.


 

Concorrência


Enquanto o mercado chega à modernidade, o governo continua estacionado no tempo. Historicamente, permite que funcionários públicos e motoristas com passagens pela polícia permaneçam no sistema e não abre chance para novas autorizações, apesar das reiteradas recomendações do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT). No ano passado, a Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep) recomendou o recadastramento dos profissionais, a exclusão daqueles que não se adéquam à lei, além da ampliação da frota.

De acordo com a Secretaria de Mobilidade (Semob), das 3,4 mil autorizações de táxis, os donos de 3.371 apresentaram a documentação. A análise de todo o material e a abertura das cassações de permissões só devem ocorrer a partir deste mês. Isso não significa a perda automática do benefício. O dono da licença que tiver alguma irregularidade terá prazo para ampla defesa e poderá, inclusive, recorrer à Justiça para garantir o direito de mantê-la. Em série de reportagens publicadas em 2015, o Correio revelou que, entre os taxistas, havia funcionário público e até condenados pela Justiça.

Sobre a ampliação do número de permissões, até agora ficou na promessa. Em julho de 2015, a Semob anunciou a abertura do processo seletivo para 1,1 mil novas autorizações para taxistas, sendo 700 vagas para início imediato. Depois, em setembro de 2016, a pasta publicou o pré-edital de licitação para concessões de táxi do DF, sem revelar o total. Questionada sobre se haverá ou não mais concessões, a pasta informou que “estuda a abertura de processo seletivo para a outorga de 100 novas autorizações exclusivamente para o serviço de táxi adaptado para pessoas com mobilidade reduzida”.

 


Ponto de táxi do Aeroporto Internacional de Brasília: parte da categoria aderiu a aplicativos e alguns oferecem descontos nas viagens

Manifestação


Motoristas do Uber realizaram ontem um protesto em frente ao Congresso Nacional contra a votação do Projeto de Lei nº 5.587/16, que pode extinguir o aplicativo no Brasil. A sessão está marcada para esta semana. A categoria se concentrou a partir das 14h no estacionamento do Estádio Nacional de Mané Garrincha e desceu até a Esplanada dos Ministérios acompanhada do Batalhão de Policiamento de Trânsito (BPTran). O projeto de lei pede a regulamentação dos serviços de transporte individual privado. Ele permite que qualquer serviço de transporte de passageiros seja oferecido somente por meio de veículos que tenham identificação com a palavra táxi e um taxímetro.


Nova operadora


A partir de hoje, a espanhola Cabify começa a operar no Distrito Federal. Os atendimentos ficarão restritos, a princípio, ao Plano Piloto, Lago sul, Lago Norte, Taquari, Mansões Lago Norte, Sudoeste, Taguatinga Sul, Quintas da Alvorada, alguns trechos do Park Way, Guará e Águas Claras. O preço da corrida é fixo em todos os dias do ano e leva em consideração apenas a distância. De acordo com a empresa, todos os motoristas passam por um processo de seleção que inclui antecedentes criminais, reuniões informativas presenciais, vistoria dos carros e exames médicos toxicológicos. A Cabify iniciou a operação no Brasil em junho de 2016 e, além de Brasília, está presente em São Paulo, Santos, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba e Campinas. Durante toda a quarta-feira, o aplicativo promove o FreeDay Cabify com o código FREEBSB, que oferece desconto de 100% em até três corridas de R$ 20, válido para novos usuários, entre as 8h e as 20h59.

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