Cidades

Mulheres do campo reagem à submissão e denunciam violência doméstica

Desafio ainda é fazer com que mais vítimas tenham clareza para identificar o contexto de violência

Isa Stacciarini, Pedro Grigori - Especial para o Correio
postado em 25/04/2017 06:00
Antonilma e Cristovão no Assentamento Contagem: visita da Justiça
O perfil das vítimas de violência doméstica em áreas rurais é semelhante: sem tanto acesso à informação, muitas delas não reconhecem os direitos que as cercam. Mas a partir de cursos, qualificações, estudos e autoconhecimento, uma parcela significativa tem dado o basta à submissão. Elas reagem com denúncias, pedidos de ajuda e separação do companheiro. O desafio, no entanto, ainda é fazer com que mais vítimas tenham clareza para identificar o contexto de violência. Denúncias podem ser feitas pelo Disque 180, do governo federal.

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No campo, o alcoolismo dos homens, atrelado ao machismo, evidencia os fatores das agressões, como o Correio publicou na edição de ontem. Dados do Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes do Ministério da Saúde revelam que 30% dos casos de violência doméstica ou sexual no Brasil estão associados à bebida. E foi nessa situação que a agricultora Antonilma Magalhães da Silva, 35 anos, se tornou vítima. Em fevereiro, o marido, Cristovão da Silva, 45, com quem divide o lar há 18, a ameaçou de morte e a xingou. Pai e mãe de três filhos, o casal chegou à Vara de Violência Doméstica de Sobradinho.

[SAIBAMAIS]A mulher tentou pedir medida protetiva, mas, como trabalha em casa com o companheiro, no Assentamento Contagem, em Sobradinho, onde plantam e colhem mandioca, quiabo e feijão-verde, acabou desistindo da ação. ;Se eu bebo, fico agressivo. Só lembro de flashes daquela noite, de ir à casa da mãe dela e dos meus filhos me segurando. Depois, estava dentro da viatura da polícia;, relata. ;Senti medo. Dentro de casa, ele quebrava as coisas quando ficava com raiva. Então, temi que ele pudesse machucar a mim e os meus meninos;, conta Antonilma.

Ao receber a visita da juíza da Vara de Violência Doméstica de Sobradinho, Rejane Suxberger, em casa, Antonilma parecia tímida. Enquanto falava baixo, mostrava preocupação com os filhos. Cristovão, mais falante, prometeu não repetir a violência. ;Ele é um homem bom, só dá problema quando bebe;, denuncia Antonilma.

Para a secretária de Mulheres da Federação de Trabalhadores na Agricultura do DF e Entorno, Carliene dos Santos Oliveira, mulheres das áreas rurais não enfrentam só a violência física. ;Em tudo que dá errado, a culpa é da mulher, que, muitas vezes, tem uma jornada dupla de trabalho e os maridos não reconhecem. Em razão da criação, da vivência no campo e dessa cultura arraigada, elas sofrem muito com a questão da violência no seio familiar;, detalha.

A agricultora e embaixadora da região Centro-Oeste na campanha Mulheres Rurais, Norma Sueli Martins Siqueira, 58 anos, acredita que as mulheres do campo estão mais fortes. ;Elas estão tomando a rédea e diminuiu a quantidade dos maridos que ainda subjugam as companheiras. A gente mostra que não quer ser mais ou melhor do que eles, mas que valorizem o nosso trabalho como mulher, mãe, esposa e provedora do lar;, destaca.

Secretária de Mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) e coordenadora da Marcha das Margaridas, Alessandra da Costa Lunas ressalta que o principal desafio no campo é fazer com que as vítimas tenham clareza dos direitos. ;Isso ainda é uma dificuldade, principalmente para mulheres de meia-idade. Em geral, elas ainda têm muitas limitações em saber o que fazer e como identificar o contexto de violência;, alerta.

* Estagiário sob supervisão de Guilherme Goulart.

Assista ao encontro de Antonilma e o marido com a juíza Rejane Suxberger:
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