Cidades

CLDF vota hoje projeto que reformula o sistema de aposentadoria do DF

Matéria prevê um diferencial: institui o Fundo Solidário Garantidor, baseado no sistema de monetização e rentabilidade de ativos, o qual garantiria a cobertura de eventuais rombos financeiros da Previdência

Ana Viriato
postado em 26/09/2017 06:10
Plenário da Câmara Legislativa: votação marcada para as 15h pode definir um dos maiores problemas enfrentados pela gestão de Rodrigo Rollemberg
A reforma previdenciária do Distrito Federal é o primeiro item da pauta desta terça-feira (26/9) na Câmara Legislativa. Pelo crivo do plenário, devem passar quatro textos: a proposta original, elaborada pelo Palácio do Buriti, e três substitutivos. Apresentada às vésperas da votação, na tarde de ontem, a proposição articulada pelo presidente da Casa, Joe Valle (PDT), pode ser a chave para o consenso. A matéria prevê, novamente, a unificação dos fundos de contribuição da capital e a instauração do regime complementar, conforme a ideia inicial do Executivo local. Mas há um diferencial: institui o Fundo Solidário Garantidor, baseado no sistema de monetização e rentabilidade de ativos, o qual garantiria a cobertura de eventuais rombos financeiros da Previdência. A base aliada ao governo deve fechar questão sobre o posicionamento no pleito na manhã de hoje, em reunião com o governador Rodrigo Rollemberg (PSB).

[SAIBAMAIS]A confirmação da votação para as 15h de hoje ocorreu durante o colégio de líderes, no Legislativo local. No encontro, com a presença de técnicos do Tribunal de Contas do DF (TCDF), Joe Valle explicou a proposta de 20 páginas aos distritais. Enquanto as contribuições dos servidores ficarão concentradas no fundo unificado, os depósitos do Fundo Solidário Garantidor aconteceriam por meio de imóveis, recursos e direitos destinados por legislações futuras, como os valores decorrentes da cessão de espaços públicos destinados a estacionamentos e da regularização fundiária urbana. Subsídios recebíveis e do fluxo anual relativos à dívida ativa, a partir de 1; de janeiro de 2019, também seriam repassados a esse caixa.

Ainda ficaria incorporado ao patrimônio do Fundo Garantidor o produto da concessão de bens e serviços, baseado em parcerias público-privadas. Os recursos que excederem a 125% da reserva necessária aos repasses mensais dos aposentados e pensionistas também serão realocadas ao novo caixa. Além disso, as garantias listadas quando o governo tomou dois empréstimos do Iprev para garantir o pagamento do funcionalismo em dia ; ações do BRB e bens imóveis da Terracap ; seriam destinadas ao cofre.

Outras dezenas de fontes de receita estão listadas no substitutivo, construído com base em sugestões dos distritais. Dessa forma, os recursos do Fundo Garantidor poderão ser utilizados apenas no custeio das aposentadorias de servidores da capital. Após a sanção da lei, Executivo e Legislativo locais terão de construir, em 10 dias, um grupo de trabalho para indicar formas de rentabilização e exploração dos recursos, além de indicar novos ativos à incorporação.

Apesar de desejar um novo adiamento da votação para discutir o projeto com servidores, Joe Valle classifica o substitutivo como ;um grande avanço;. ;A proposta cria garantias ao funcionalismo, muda o modelo de gestão, estabelece uma governança e prevê a revisão dos rendimentos do fundo em um ano. Sem dúvida, demos um grande passo;, aposta.

O balanço preliminar é que a proposição costurada pelo pedetista pode ser mais benéfica, até mesmo, que o texto alternativo capitaneado pelo líder do governo na Câmara, Agaciel Maia (PR). A matéria do parlamentar do PR descarta a polêmica fusão dos fundos, resolve os problemas de caixa do GDF, mas apenas até o fim de 2018, com a previsão de fontes de receita que suprem o deficit de R$ 170 milhões do Palácio do Buriti. ;O projeto do deputado Joe Valle mantém os planos do GDF. Entretanto, aumenta as garantias ao servidor. Até agora, teve uma boa aceitação;, resume Agaciel.

Insegurança jurídica

A polêmica em torno dos projetos de reestruturação da Previdência não se restringe ao plenário. A Câmara Legislativa deverá prestar contas ao Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT) sobre o quórum necessário à aprovação da proposta. O desembargador Waldir Leôncio deu prazo de 10 dias para que a Procuradoria-Geral do Legislativo local se manifeste sobre a questão. O despacho do magistrado é uma resposta ao mandado de segurança impetrado pelo distrital Claudio Abrantes (sem partido).

Nos autos, o parlamentar argumenta que, segundo a Constituição Federal e a lei complementar que trata dos processos legislativos na capital, questões sobre isenções, remissões, anistia e benefícios tributários e previdenciários devem receber o aval da maioria qualificada dos parlamentares (16 votos). A base governista, contudo, acredita que seja necessária maioria absoluta (13 votos) para emplacar a proposta. Abrantes, portanto, havia pedido que o magistrado batesse o martelo sobre o tema.

A decisão do magistrado não interfere na reestruturação do regime de Previdência distrital. Entretanto, se posteriormente, com as informações requisitadas em mãos, o desembargador entender que o quórum de 16 distritais é necessário para o aval à proposição e o número não tiver sido respeitado durante o pleito, a votação perde a validade.


Entrevista ; Raul Velloso

;Não tem como fazer milagre;

O economista Raul Velloso, especialista em finanças públicas e Ph.D pela Universidade de Yale, foi o entrevistado de ontem do programa CB.Poder. Na conversa, transmitida ao vivo pela TV Brasília, ele analisou a proposta de reformulação da Previdência e classificou a iniciativa como um ;paliativo;. ;A proposta resolve o problema no presente, sim, porque é uma forma de trazer os recursos que estão faltando para o GDF. De qualquer forma, é uma solução paliativa. Lá na frente, vai ficar mais difícil equacionar a questão da Previdência do DF;, comentou o especialista. Raul Velloso reconhece a gravidade da situação financeira do DF e diz que, sem a aprovação da reformulação da Previdência, o governo pode, realmente, parar, como alega o Palácio do Buriti. ;Se houver um impasse e não chegarem a uma solução, seja a ideal, seja a pragmática, vai ter de atrasar salários, não tem como fazer milagre;, afirmou o economista.

O projeto do governo para reformular a Previdência resolve o problema no presente e joga uma bomba no futuro ou é uma iniciativa sustentável a longo prazo?

A proposta resolve o problema no presente, sim, porque é uma forma de trazer os recursos que estão faltando para o GDF. E, em boa medida, o deficit não é responsabilidade do governador atual. Mas não há esse risco que as pessoas temem, de que, no futuro, o servidor vai deixar de receber. De qualquer forma, é uma solução paliativa. Lá na frente, vai ficar mais difícil equacionar a questão da Previdência do DF. No setor público, existe sempre a possibilidade de aumentar tributos, de buscar ativos e bens para ajudar a financiar. Essa possibilidade sempre há. Existem caminhos e caminhos, eu sempre prefiro o melhor e menos arriscado, o menos custoso para as pessoas. E, de fato, esse não é o melhor caminho.

Se esse é um paliativo, qual é a solução definitiva?

Os governadores estão chegando ao fim do mandato, e o tempo é curto para tomar medidas muito complexas, para fazer do jeito certo. Há o risco de chegar ao fim do mandato e não ter dinheiro para bancar as despesas que ficaram no fim de trilha para serem pagas. De fato, vai ficando mais difícil. A solução correta é, em vez de retroceder, capitular a esse temor e extinguir o fundo que já havia, levar adiante a ideia certa em toda a sua extensão. Trazer todos os servidores para dentro desse fundo e colocar ativos, recebíveis, o dinheiro que o GDF tenha a receber, com ou sem apoio da União, para equacionar ali dentro. E antecipar um pouco desse dinheiro para tirar o sufoco do caixa.

Não seria efetivo juntar os dois fundos e, a partir de agora, dar equilíbrio a todos os aposentados?

A Constituição manda fazer isso. O Banco do Brasil, a Caixa, a Petrobras, todas as grandes estatais foram forçadas a fazer isso. Falta agora o setor público fazer. Há o fundo superavitário, que só tem gente nova, longe da idade da aposentadoria, e o outro, de boa medida, com aposentados que só têm a receber. Tem de completar a tarefa anterior, reforçar aquele que pegou a partir de uma certa época, trazendo aqueles outros para dentro, em um fundo só. Não posso fazer isso sem colocar ativos, bens. Ao fazer isso, fecha a conta e zera o passivo atuarial. Usando o valor desses ativos e, no fim, fechando a conta, com contribuições, seja dos empregadores, seja das várias secretarias, o grosso do fechamento será com a contribuição dos servidores.

O problema, então, não é a fusão, e, sim, a garantia de reposição?

Em vez de fundir trazendo aquele que tem superavit para dentro do que tem deficit, temos de pegar o que tem deficit e levar para dentro do fundo que tem superavit. Mas tem de levar junto o equivalente ao passivo, com o valor de ativos. Tem de equacionar isso. É preciso colocar ativos, fazer todos os órgãos pagarem a sua parte de contribuição patronal e, no fim, fechar a conta com as contribuições das pessoas que recebem e usufruem.

Se não fizer isso o problema será jogado para a frente?

Sim, não tem jeito. Isso vai ter de ser feito lá na frente, inclusive aumentar as contribuições.

O governo condiciona sempre o pagamento dos salários em dia à aprovação desse projeto. É chantagem ou, realmente, existe esse risco?

É muito tentador para um dirigente público amarrar uma coisa à outra. No fundo, é uma arma que ele está usando. O GDF, assim como outros estados e municípios, está com buraco financeiro gigante, herdado de outras gestões ou causados pela forte recessão do país. Eles têm razão de terem essas dificuldades. Mas como fazer a negociação política para chegar a um resultado que garanta esses recursos? Se houver um impasse e não chegarem a uma solução, seja a ideal, seja a pragmática, vai ter de atrasar, não tem como fazer milagre.

O DF sempre foi uma unidade da Federação rica, com acesso ao Fundo Constitucional. Agora, não tem dinheiro nem para pagar salários. O que levou a esse quadro?

A primeira questão é que houve uma gestão irresponsável, que torrou o dinheiro e deixou a dívida para o próximo pagar. Em seguida, veio a maior recessão da história do país. Juntando os dois problemas, virou uma gestão difícil. É preciso cobrir a perda de arrecadação causada pela recessão e pagar as dívidas deixadas pelo governante anterior.

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