Cidades

Corpo de ciclista voluntário da ONG Rodas da Paz será velado hoje

Raul Aragão foi atingido por um carro na Asa Norte, na tarde de sábado, quando saía da Universidade de Brasília. Ele era um dos mais ativos militantes de ONG's como a Rodas da Paz e lutava por um trânsito mais seguro

Júlia Campos , Deborah Fortuna
postado em 23/10/2017 06:00
O estudante de sociologia da UnB militava em prol da mobilidade urbana e defendia mais respeito aos ciclistas

A rotina de Raul Aragão era movida pela bicicleta. Durante anos, ele lutou pelo espaço dos ciclistas nas vias do Distrito Federal. A frase ;Acende o farol sem reclamar e não me atropela; é sua apresentação em redes sociais. Aos 23 anos, era voluntário nas ONG;s Rodas da Paz e Bike Anjo. Na tarde do último sábado, o estudante de sociologia da Universidade de Brasília (UnB) voltava para casa, depois de almoçar no Restaurante Universitário (RU) e, durante o percurso, foi vítima da violência no trânsito contra a qual tanto lutou. Um carro conduzido por um rapaz de 18 anos o atropelou na 406/407 Norte. Raul não resistiu aos ferimentos e morreu na madrugada de ontem. O corpo será velado hoje, a partir das 8h, na Capela 5 do Cemitério Campo da Esperança da Asa Sul.

De acordo com a Secretaria de Saúde, o estudante chegou ao Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) em estado grave, com traumatismo craniano, torácico e abdominal. Ao ser internado, apresentou uma parada cardiorrespiratória, a equipe médica fez a reanimação e o encaminhou ao Centro Cirúrgico. Após o procedimento, ele morreu às 4h de domingo.

[SAIBAMAIS]O motorista do veículo envolvido no acidente esteve no local durante todo o momento e prestou socorro à vítima. Ele foi submetido ao teste do bafômetro, que deu negativo. O jovem não teve a identidade revelada pela polícia. A notícia da morte foi anunciada publicamente pelo grupo Rodas da Paz em uma postagem nas redes sociais. ;Valeu demais, Raulzito, um dos voluntários mais queridos e participativos do Rodas da Paz e de outros grupos voluntários;, diz a publicação.

A irmã de Raul, Flora Gondim, 22 anos, o viu pela última vez no dia do acidente. Os dois estavam juntos na casa do estudante, antes de ele sair para almoçar na universidade. Abalada com a situação, a jovem considera o ocorrido uma tragédia para todos. ;Foi um acidente, o motorista tem 18 anos e com certeza está bem mal. Ele deu assistência, sim, foi quem chamou o Samu. Depois, os pais dele entraram em contato;, contou. Os dois irmãos cresceram juntos e tinham diferença de idade de somente um ano e meio.

Raul era fiel defensor da bicicleta e da mobilidade urbana. Em 2015, em uma entrevista ao Correio, ele fez críticas aos motoristas que não respeitam quem anda sobre duas rodas. ;Como não há ciclovias em todos os lugares, precisamos andar muitas vezes na rua. Mas é perigoso, pois temos de circular próximos à guia, onde costuma ter bueiros e bocas de lobo. Quando desviamos, corremos o risco de atropelamento;, disse Raul, à época.

O coordenador-geral da ONG Rodas da Paz, Bruno Leite, contou que Raul fazia todos os trajetos de bicicleta e era uma pessoa muito atuante na causa. ;Era um cara super alto-astral, sempre com um sorrisão no rosto. Contribuía muito para o trabalho em equipe. É uma perda grande para a família e para nós;. lamentou. Bruno diz que as informações sobre a dinâmica do acidente ainda não são precisas. ;Era o meio de transporte dele. Raul acreditava que Brasília poderia ser uma cidade para todos. E é isso que a gente vai continuar buscando;, afirmou.

O coordenador comentou que, atualmente, o ativista estava à frente de dois projetos importantes dentro da organização. Um trata da contagem de ciclistas no DF e outro é uma pesquisa sobre o perfil dos ciclistas no Brasil.

Segundo informações do Departamento de Trânsito do DF (Detran), até ontem, 15 ciclistas já morreram no trânsito este ano. Todas as vítimas eram homens. Doze delas perderam a vida devido a uma colisão. Em 2016, 19 pessoas faleceram nas vias do DF.

Raul Aragão foi atingido por um carro na Asa Norte, na tarde de sábado, quando saía da Universidade de Brasília. Ele era um dos mais ativos militantes de ONG's como a Rodas da Paz e lutava por um trânsito mais seguro

Frustração


Em um áudio enviado para os integrantes da ONG, a fundadora da Rodas da Paz, Beth Veloso, se mostrou bastante abalada com o ocorrido. Atualmente, ela mora em Portugal. ;Eu não o conheci, mas é como se esse carro tivesse passado por cima de mim. É como se acabasse parte dos 14 anos de campanha que a gente fez;, narrou emocionada. Beth destacou que é difícil aceitar a morte violenta de pessoas que têm como missão salvar vidas. ;A gente não pode se calar. Precisamos entender o processo porque isso quer dizer que alguma coisa está sendo negligenciada além do limite. Todos os grupos de bicicleta precisam se unir. Estamos profundamente frustrados. Cada morte violenta é um fracasso. E precisamos olhar para isso para que a gente não o aceite como uma fatalidade;, apontou.

Na ocorrência, consta que o pai do motorista que atropelou Raul solicitou que o filho fosse ouvido em outra oportunidade, pois ele estava muito abalado. A Polícia Civil não soube informar se o pedido foi aceito. Delegacia responsável pela investigação, a 2; DP não funciona aos fins de semana e o atropelamento foi registrado em outra unidade policial, a 5; DP.

Mobilização

A ONG Rodas da Paz foi criada em há 14 anos, para mobilizar a sociedade sobre a importância de combater a violência no trânsito. A organização defende que pedestres devem ter preferência nas ruas e incentiva o uso cotidiano da bicicleta como meio de transporte e também como forma de lazer ou esporte. A ONG trabalha com temas relacionados à mobilidade urbana.

"Era um cara super alto-astral, sempre com um sorrisão no rosto. Contribuía muito para o trabalho em equipe. É uma perda grande para a família e para nós;
Bruno Leite, coordenador-geral da ONG Rodas da Paz

15
Total de ciclistas mortos no trânsito do DF só este ano

Memória


Raul Aragão foi atingido por um carro na Asa Norte, na tarde de sábado, quando saía da Universidade de Brasília. Ele era um dos mais ativos militantes de ONG's como a Rodas da Paz e lutava por um trânsito mais seguro
Maio de 2017
Em maio deste ano, um ciclista morreu atropelado na Quadra 17 do Park Way. Floriano Sampaio e Silva, 50 anos, foi atingido por um Peugeout 206. O automóvel era conduzido por José Batista de Paula, 22, que não estava com a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) no momento do acidente. O resultado do teste do bafômetro indicou que o motorista não estava embriagado. Ele havia comprado o carro três dias antes do acidente. A vítima chegou a ser socorrida, mas morreu no local. O acidente ocorreu em frente ao condomínio em que Floriano morava. Ele era artista plástico, não era casado e não tinha filhos.

Raul Aragão foi atingido por um carro na Asa Norte, na tarde de sábado, quando saía da Universidade de Brasília. Ele era um dos mais ativos militantes de ONG's como a Rodas da Paz e lutava por um trânsito mais seguro
Abril de 2017
Em 15 de abril deste ano, um condutor atropelou um ciclista no Eixo Monumental. Arthur Viana Moura de Oliveira, 19 anos, ficou gravemente ferido e foi levado para o Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF). Com o impacto do carro, ele foi arremessado na pista. Segundo informações da Secretaria de Saúde do DF, no mesmo mês, ele recebeu alta. A colisão ocorreu na altura do Ministério Público do DF. Na época, o motorista do carro, Horácio Freire Macedo, 39 anos, não quis descrever a dinâmica do acidente, e esperou pela perícia policial.

Novembro de 2016
Em novembro de 2016, o ciclista Eric Bona, 25 anos, morreu após ser atropelado na QI 23 do Setor de Mansões Dom Bosco. Ele chegou a ser encaminhado para o Hospital de Base, mas não resistiu. O acidente foi por volta de 12h50. À época, segundo informações da Polícia Civil, o condutor do veículo, Renato Luís Casella, 37, disse que estava na velocidade da via quando o ciclista teria cruzado a faixa de repente. Com isso, ele não conseguiu parar o carro a tempo. Segundo informações da PCDF, Renato foi levado para o Instituto Médico Legal (IML) para realizar o teste de embriaguez, e o resultado deu negativo.


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