Ciência e Saúde

Síndrome de multífidus costuma ter sintomas associados por muitos ortopedistas a hérnias de disco

Erro de diagnóstico pode significar um tratamento inadequado e o prolongamento das dores

postado em 22/01/2010 07:00
Durante três meses, a dona de casa Enid Moratti Pereira, 71 anos, conviveu com uma dor quase insuportável. A pontada descia da região lombar e corria até a perna esquerda. ;Era uma dor terrível. Parecia que eu estava tomando choques elétricos. Para andar, eu precisava segurar nas paredes, meio agachada, tamanha era a dor de ficar em pé;, relata. O sofrimento nada mais era do que uma distensão do músculo multífidus, conhecida como a síndrome de multífidus (veja arte).

Erro de diagnóstico pode significar um tratamento inadequado e o prolongamento das doresEnid faz parte de uma triste estatística: oito em cada 10 pessoas adultas sofrem com dores na coluna lombar. Segundo o ortopedista e diretor da Clínica da Dor, em Belo Horizonte, Geraldo Carvalhaes, são inúmeras as doenças associadas a isso. Uma delas, a síndrome de multífidus ; ou ;da covinha;, como é popularmente conhecida ; é, muitas vezes, confundida com hérnias de disco, explica o especialista. ;O multífidus faz parte da camada mais profunda da coluna e é responsável pela estabilidade das articulações entre as vértebras. É ele que liga as vértebras, além de ligar a última delas ao osso íliaco (bacia). Essa região é conhecida como articulação sacro-ilíaca, a covinha no fim da lombar (aquele furinho muito comum, principalmente nas mulheres). Quando há um estiramento desse músculo, começam as dores.;

A confusão entre as duas doenças pode significar que o tratamento definido seja inadequado ; para uma ou para outra ;, o que provocaria a manutenção por mais tempo das dores e até o agravamento do problema. A diferença da síndrome de multífidus para a hérnia de disco, segundo Carvalhaes, reside nas alterações neurológicas provocadas pela hérnia, como falta de reflexo e sensibilidade. ;A hérnia irrita os nervos, enquanto a síndrome atinge o músculo. Quem tem hérnia, sente dores das costas até os pés. Na síndrome de multífidus, as dores podem chegar até à panturrilha.;, esclarece o médico. As causas dessa síndrome são geralmente associadas a uma distensão muscular.

Segundo Carvalhaes, carregar muito peso ou simplesmente levantar-se da cama ou da cadeira de forma errada pode provocar a distensão. ;É quando o paciente está bem e, de repente, a coluna trava. Isso geralmente é causado pelo espasmo dessa musculatura lombar, provocado pelo estiramento do músculo.; Rosemary Chaves Fonseca, chefe da fisiatria do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), diz que não há uma causa específica para a síndrome, mas ela chama a atenção para a falta de exercício e para o envelhecimento. ;Com o tempo e a falta de exercícios, há o encurtamento de músculo. Um esforço maior, ou um movimento de torção, podem provocar a distensão.;

Desconhecimento
O marido de Enid, Manuel Viana, 73 anos, também sofreu com a síndrome. Ele foi acometido seis meses antes da mulher. ;Manuel caminhava e, de repente, ficava estático. Não conseguia calçar as meias, nem, muito menos, amarrar o tênis;, conta Enid. Ambos procuraram um ortopedista. O especialista, porém, atribuiu a dor a um desvio na coluna e a uma possível artrose.

A síndrome de multífidus é, realmente, pouco conhecida pela maioria dos profissionais. Gustavo Rocha, ortopedista e professor da faculdade de medicina da Universidade de Brasília (UnB), diz que somente nos últimos tempos estudos mais aprofundados estão sendo feitos nesse tipo de musculatura. ;A irritação do multífidus pode ser uma das causas de lombalgia. Os médicos devem ficar atentos à essa musculatura na hora de dar o diagnóstico.; Carvalhaes também critica a falta de atenção dos profissionais. ;Esses músculos são muito conhecidos pelos anatomistas e pouco lembrados pelos ortopedistas e neurologistas.;

O diagnóstico da síndrome é feito por meio de exame clínico, pois não existe um teste que identifique o problema. ;A imagem ainda não mostra os estiramentos que essa musculatura pode ter;, diz Carvalhaes. Ele explica que quando o paciente esta acometido pela síndrome, uma pequena pressão na área das covinhas faz com que o paciente logo acuse a dor. ;Não precisa nem colocar muita pressão, pois o local fica extremamente dolorido.;

Como tratar
O tratamento da síndrome consiste em aplicar uma média de três a cinco injeções de analgésicos, terapia bioxidativa (injeção de ozônio no músculo) e a crioterapia ; aplicação de gelo no local. De acordo com Carvalhaes, a primeira coisa a ser feita é tirar a dor do paciente. Depois, faz-se a correção postural. ;Já na primeira aplicação de analgésico foi alívio imediato, como jogar água no fogo;, relata Enid. A fisiatra Rosemary acrescenta que, para ter sucesso no tratamento, o paciente deve ser orientado a fazer exercícios que reforcem a musculatura. ;Alongamentos também são muito importantes, para que a síndrome não reincida;, pontua.

Para prevenir a síndrome, é necessário um programa de exercícios de reforço na musculatura pélvica ; os músculos reto-abdominais, os do períneo e os das nádegas ; por meio da fisioterapia. ;A gente deveria exercitar mais os nossos músculos no dia a dia. Em casa ou no trabalho, as pessoas podem se exercitar e adquirir hábitos saudáveis para manter uma boa postura e evitar a síndrome;, orienta Carvalhaes. O fisioterapeuta Fernando Santiago também concorda com a prevenção e acrescenta que as pessoas que sentem dores na região lombar devem aprender a cuidar da coluna e a fazer movimentos corretos que não sobrecarreguem os músculos. ;O ideal é que as pessoas façam uma avaliação mecânica. Ela permite entender como está a mobilidade de suas costas;, diz. ;Com isso, o profissional pode ensinar os cuidados corretos para se movimentar e corrigir problemas de postura. Isso previne distenções e outras eventuais dores musculares na região;, conclui o fisioterapeuta.

;Era uma dor terrível. Parecia que eu estava tomando choques elétricos. Para andar, eu precisava segurar nas paredes, meio agachada, tamanha era a dor de ficar em pé;
Enid Moratti Pereira, 71 anos

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