Ciência e Saúde

Método inovador para diagnóstico de câncer de pele

Pesquisadores da USP criam um kit portátil para diagnosticar e tratar o câncer de pele não melanoma, que tem no sol a causa principal. Custo é bem inferior ao da terapia tradicional

postado em 17/02/2010 10:08 / atualizado em 22/09/2020 10:29

A terapia fotodinâmica ou photodynamic therapy (PDT) é uma opção de tratamento contra alguns cânceres de pele disponível desde a década de 1960. Comparada à retirada cirúrgica de tumores cutâneos, a técnica promove a destruição seletiva das células doentes, é menos invasiva e reduz o risco de cicatrizes. O procedimento, no entanto, enfrenta duas grandes limitações: o preço e a disponibilidade do equipamento que o viabiliza. Agora, um projeto conduzido pelo Centro de Pesquisa Óptica e Fotônica (Cepof) do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos, poderá tornar essa terapia mais acessível. Motivados pelos bons resultados do método, mas inconformados com suas restrições, pesquisadores desenvolveram um kit portátil capaz de realizar o diagnóstico e o tratamento das lesões a baixo custo.

A PDT é indicada para tratar o câncer de pele não melanoma e queratoses actínicas, que são lesões pré-malignas. O tratamento consiste na aplicação de uma droga fotossensibilizante no tumor e na exposição do mesmo a uma luz específica, o que promove a destruição das células cancerígenas. De acordo com o físico Vanderlei Bagnato, coordenador do projeto da USP, o sistema idealizado no Cepof tem uma novidade. ;Desenvolvemos um aparato completo e portátil que permite tanto o diagnóstico quanto o tratamento da lesão, que inclui, além da fonte de luz utilizada na PDT convencional, o medicamento administrado topicamente no tumor cutâneo. Tudo produzido com insumos e dispositivos totalmente nacionais, o que consolidará a terapia de forma ampla e atual, dentro da realidade econômica do Brasil;, observa.

O sistema vem sendo usado no hospital da Fundação Amaral Carvalho, em Jaú, interior de São Paulo. A dermatologista Ana Gabriela Sálvio afirma que o kit tem possibilitado rapidez e ótimos resultados nos pacientes com indicação para a PDT. Ela ressalta que a terapia fotodinâmica tópica é indicada para tumores não melanoma pequenos, em estágio inicial, que não tenham penetrado na pele por mais de 2mm. ;Com o modelo da USP, fazemos o diagnóstico e iniciamos imediatamente o tratamento. Aplicamos o ácido amino levulínico (ALA) na lesão e, depois de três ou quatro horas, o local comprometido é exposto à LED de alta eficiência. Ao ser iluminado, o tecido neoplásico sofre uma reação e as células malignas são destruídas. O tratamento praticamente não deixa cicatrizes;, garante a médica.

Na década de 1960, o ALA era aplicado na lesão por meio de uma injeção. O paciente ficava uma semana em um quarto escuro, longe da luz natural e artificial, para que a pele não sofresse queimaduras. Atualmente, a recuperação leva de sete a 10 dias, tempo suficiente para que a vermelhidão e o inchaço desapareçam, mas a pessoa precisa proteger a área tratada por apenas 48 horas depois da aplicação do ácido. Os aparelhos eram grandes, de tecnologia importada.

;O custo era elevado porque além do emissor de luz, o medicamento também era caro. Como a PDT é apenas uma opção para o tratamento, a maioria dos hospitais não a disponibilizava. A cirurgia era e ainda é a alternativa mais utilizada no país para remediar esse tipo de câncer. O modelo desenvolvido pelo Cepof pode mudar essa realidade;, acredita a dermatologista. A especialista adianta que na Fundação Amaral Carvalho 30 pacientes já receberam a terapia fotodinâmica com o kit da USP.

O técnico em terraplanagem Evandir Ferreira da Silva, 55 anos, e a dona de casa Tereza Poklem, 71, foram submetidos ao tratamento na semana passada. Os dois trabalharam a vida inteira sob sol forte e sofrem, hoje, as consequências da exposição da pele sem a devida proteção. Tanto um quanto o outro já trataram o problema com cirurgia convencional para remediar lesões no rosto e em outras partes do corpo.

Tratamento

Na última quinta-feira, Evandir foi submetido à PDT para curar alterações nas mãos e nos braços. Tereza recebeu a terapia no rosto. ;A lesão que acabei de tratar em Jaú chegou de mansinho, foi notada apenas porque estava num local visível. Da mesma forma que aconteceu com o tumor retirado cirurgicamente há quatro anos, não cicatrizava e desconfiei que era câncer. Receio que apareçam mais lesões, pois a lida na roça por mais de 40 anos está cobrando a conta. Mas, agora, posso tratar sem receio de ficar com cicatrizes;, diz Tereza.

O Instituto Nacional de Câncer (Inca), referência do Ministério da Saúde no tratamento da doença, não dispõe do equipamento usado na terapia fotodinâmica. O chefe do serviço de dermatologia da instituição, Dolival Lobão, explica que o câncer não melanoma é tratado no Inca com a cirurgia convencional, que retira a lesão com bisturi; por meio da criocirurgia, método que remove o tumor com nitrogênio líquido; e com a eletrocirurgia, que usa a corrente elétrica como meio de remoção.

;O grande vilão do câncer de pele não melanoma é o sol. Para prevenir o mal, a pessoa deve se proteger adequadamente com um bom filtro solar. Pessoas com pele clara são mais suscetíveis ao problema e devem estar mais atentas ainda;, alerta o médico. Segundo ele, por ter vencido os obstáculos econômicos da PDT, o kit da USP poderá atender a população de todas as classes sociais nos próximos anos.

A proposta do Centro de Pesquisa Óptica e Fotônica da USP São Carlos é viabilizar a tecnologia desenvolvida pelos pesquisadores de modo que seus benefícios possam atingir a maior fração possível da população. ;O sistema será disponibilizado em 100 centros que tratam o câncer não melanoma. Estamos na fase de escolha dos hospitais. Após a execução nessas unidades, esperamos ter elementos suficientes para provar à sociedade médica e aos órgãos governamentais os benefícios de disponibilizar essa terapia de forma mais ampla;, pontua o coordenador do Cepof. O kit pesa pouco mais de 1,5kg e deverá custar cerca de R$ 7 mil. A ideia já chamou a atenção de autoridades da saúde em países como Argentina e Paquistão.

Ouça entrevista com o chefe de dermatologia do Inca, Dolival Lobão



EMISSÃO DE LUZ

Um LED (sigla do inglês Light Emitting Diode, ou Diodo Emissor de Luz,) parece uma lâmpada, mas não é. Trata-se, na verdade, de um material sólido que emite luz quando energizado, composto basicamente por nitretos de gálio, índio e alumínio. O LED emite luz por uma reação física, enquanto que a lâmpada o faz porque seu filamento é aquecido a ponto de brilhar. No caso de um LED, os elétrons do material semicondutor são excitados por uma corrente elétrica e, por isso, vão para uma órbita superior em torno do átomo. Ao voltar à camada normal, o que acontece muito rapidamente, emitem a energia excedente, que foi recebida da corrente, na forma de radiação luminosa.

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