Ciência e Saúde

Em busca do sol

Especialistas em doenças reumáticas recomendam pacientes a evitar o isolamento e a mexer-se. É bom respirar o ar da manhã, orientam - além de fazer hidroterapia e ioga para combater sintomas que o inverno potencializa

Paloma Oliveto
postado em 01/07/2010 07:00
Arilda se protege bem do frio com meias de lã e cachecóis, mas não relaxa outros cuidados: como a medicação certa e atividades físicasSe para muitas pessoas o inverno é sinônimo de charme e aconchego, para os pacientes reumáticos a estação do frio pode significar três meses de martírio. Vítimas de doenças como artrite, artrose e fibromialgia, entre outras, costumam sentir mais dores nesta época do ano. Embora não existam estudos conclusivos sobre a relação entre a mudança de temperatura e o aumento dos incômodos, alguns fatores externos podem contribuir para isso.

Uma pesquisa apresentada no ano passado no Congresso Europeu da Liga contra Reumatismo, em Copenhague, na Dinamarca, encontrou um elo entre o acréscimo das dores, a progressão da doença e o frio. O estudo acompanhou 736 pacientes reumáticos durante 12 meses e concluiu que, quando os primeiros sintomas de artrite reumatoide ocorrem no inverno, a severidade do mal é maior nos seis meses seguintes do que quando a doença se inicia no verão. A piora não se relaciona apenas com as dores, mas também com comprometimento das articulações, o que foi verificado por meio de raios X.

O médico Ga;l Mouterde, do Departamento de Imunorreumatologia do Hospital Lapeyronie, em Montepellier, na França, liderou o estudo e afirma que há explicações plausíveis para a relação entre a piora dos sintomas e a estação do ano. ;Acreditamos que isso acontece como resultado tanto da deficiência de vitamina D (no inverno, as pessoas tomam menos sol) quanto de questões ambientais, como as viroses do frio, que influenciam na citrulinação das proteínas;, disse Mouterde, referindo-se a um processo citológico que induz a fabricação, no organismo, de anticorpos chamados anti-CCP (peptídeo citrulinado cíclico), encontrados em abundância nos pacientes reumáticos.

Especialistas em doenças reumáticas recomendam pacientes a evitar o isolamento e a mexer-se. É bom respirar o ar da manhã, orientam  - além de fazer hidroterapia e ioga para combater sintomas que o inverno potencializa;Desconheço se (no inverno) existe um aumento em relação ao diagnóstico de doenças reumáticas, porém, observamos nitidamente um aumento no número de queixas de dores articulares nesta época do ano;, afirma a reumatologista do Hospital Anchieta Gina Haase Lobo. ;Devemos considerar também o fato de ocorrer um aumento de infecções virais e bacterianas de trato respiratório alto, com consequente aumento de dores articulares e musculares na vigência e após os quadros infecciosos;, lembra.

O ortopedista Alexandre Podgaeti, membro da Sociedade Brasileira de Coluna, também observa um crescimento nas queixas dos pacientes reumáticos. ;Existem muitas hipóteses para esta piora e entre elas temos os receptores de dor e de temperatura, que ficam mais sensíveis no frio;, diz. Ele também cita as contraturas musculares e as alterações circulatórias como possíveis causas do aumento das dores. ;Os vasos se contraem mais no frio, o que diminui a temperatura e a oxigenação dos tecidos;, diz.

Segundo o anestesiologista Geraldo Carvalhaes, diretor da Clínica de Dor, de Belo Horizonte, no frio, as pessoas se encolhem mais, o que prejudica as articulações, e, além disso, deixam de se movimentar. ;Os idosos, principalmente, ficam mais quietos, quando deviam se expor ao sol por pelo menos 30 minutos por dia e se exercitar;, afirma. Ele conta que tai chi chuan, ioga e hidroterapia ; em especial, na piscina quente ; são atividades físicas que podem ajudar a combater as dores de pacientes reumáticos. ;O exercício faz com que o organismo libere endorfina, que, por si só, já proporciona alívio, como um analgésico. É uma morfina natural;, define o médico, especialista em dores crônicas.

Cardiopatias
A professora aposentada Arilda Maria Marcondes de Souza, 62 anos, convive há muitos anos com a artrite reumatoide. Como a doença foi diagnosticada e tratada no estágio inicial, ela praticamente não tem sequelas ; apenas uma pequena deformidade em um dos dedos. Arilda, que participa da Associação Nacional de Grupos de Pacientes Reumáticos (Anapar), toma medicamentos específicos para o controle da doença e, quando tem crises, recorre aos anti-inflamatórios. Para ajudar no tratamento, ela faz hidroterapia e caminhadas.

Em Brasília, a professora não costuma se incomodar com o inverno. ;O frio é mais no início da manhã e da noite, durante o dia faz calor;, lembra. Mas, quando viaja para o exterior ou para Sorocaba (SP), onde mora a família, nesta estação, sente dores mais fortes nas articulações. ;É algo tolerável, mas a percepção da dor é maior. A rigidez matinal também piora. Quando me levanto, tenho mais dificuldade para me movimentar;, diz. Usar aquecedores não só não contribuem para melhorar os sintomas, como pioram o estado de saúde de Arlinda. ;Não tolero aquecimento artificial. Minhas mãos ficam inchadas;, conta.

Um grupo de pacientes reumáticos, em especial, deve se proteger em dobro do frio no inverno. São os portadores de doenças que apresentam o fenômeno de Raynaud. Essa síndrome compromete a circulação do sangue nas extremidades, como mãos, pés, nariz e orelhas, quando as temperaturas caem. Entre os males nos quais o fenômeno de Raynaud está presente, incluem-se lúpus eritematoso sistêmico, esclerodermia e doença mista do tecido conjunto. ;Ocorre uma piora do arroxeamento nas extremidades e, em casos de reduções mais drásticas na temperatura, pode ocorrer necrose em polpas digitais. Deve-se aquecer bem todo o corpo, usar luvas e meias para aquecer os pés;, recomenda a reumatologista Gina Haase Lobo.

Também é preciso ficar atento com a febre reumática, doença reumatológica que atinge principalmente crianças e jovens. No inverno, como há mais ocorrências de infecções na garganta, a bactéria estreptococo pode cair na corrente sanguínea, provocando cardiopatias. ;O quadro é de infecção, com falta de ar. Quando o médico examina, encontra um sopro no coração;, explica o anestesiologista Geraldo Carvalhaes. Nesse caso, o tratamento é feito à base de antibióticos e penicilina, que visam à eliminação da bactéria.


"Observamos nitidamente um aumento no número de queixas de dores articulares nesta época do ano"
Gina Haase Lobo, reumatologista





Artrite, o terror das mulheres
Quase três quartos das mulheres com artrite reumatoide sofrem dores diariamente, de acordo com um estudo apresentado na semana passada durante o Congresso Europeu da Liga Contra Reumatismo, que ocorreu em Roma, na Itália. Os dados, coletados em sete países (Inglaterra, França, Alemanha, Itália, Espanha, Estados Unidos e Canadá), também sugerem que a doença incomoda tanto as pacientes que chega a impactar negativamente em aspectos sociais e emocionais.

As entrevistadas ; 1.958 mulheres com idades entre 25 e 65 anos ; disseram que se sentem isoladas e deslocadas na vida social, sendo que 40% afirmaram que é mais difícil para as portadoras da doença encontrar um parceiro. As 22% divorciadas ou separadas que participaram do estudo disseram que a artrite reumatoide foi uma causa importante na decisão de se afastarem dos parceiros, e 68% confessaram que escondem a dor das pessoas próximas. A pesquisa também indicou que 67% das pacientes estão constantemente procurando novos tratamentos para lidar com a dor.

;Os dados confirmam que a dor é uma questão de suma importância para mulheres com artrite reumatoide, afetando, fundamentalmente, suas emoções. O estudo lança luz sobre a complexidade de se lidar com a atrite reumatoide e com as dores associadas, mais do que simplesmente controlar os sintomas básicos;, afirmou o professor Paul Emery, presidente do congresso.

;A adoção de um padrão de tratamento para reduzir a dor, evitar a queda da produtividade no trabalho e lidar com o impacto social da doença é muito importante para essa população;, prosseguiu Emery. A pesquisa também explorou os impactos negativos da artirte reumatoide no mercado de trabalho. Setenta e um por cento das participantes que estavam trabalhando na época em que responderam o questionário disseram que produziam menos por causa da doença. (PO)

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