Ciência e Saúde

Estudar é prevenir

Pesquisa do Ministério da Saúde conclui que quanto mais baixo o nível de educação, mais elevadas são as chances de as pessoas contraírem câncer. Enquete mostra ainda que as mulheres se protegem mais do que os homens

Paloma Oliveto
postado em 05/07/2010 09:53
Fernanda se queixa da demora para fazer exames em hospitais públicosDepois dos males do aparelho circulatório, o câncer é a doença que mais mata no Brasil. Nem toda a população, porém, está atenta aos cuidados preventivos, atitudes que podem evitar o aparecimento ou a evolução de um tumor maligno. Realizada com 54.367 adultos das 26 capitais e do Distrito Federal, a pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde, mostrou que, enquanto as mulheres e as pessoas com maior escolaridade estão em dia com seus exames, os homens e os indivíduos que estudaram pouco estão mais expostos aos riscos oncológicos.

A pesquisa avaliou a prevenção de três tipos de câncer: pele, mama e colo de útero. No primeiro caso, os entrevistados responderam se usam alguma proteção contra os raios ultravioletas (1) quando se expõem ao sol por mais de 30 minutos, seja com filtro solar, chapéu, sombrinha ou roupas adequadas. Apenas 47,1% disseram que sim. O percentual é bem maior do que os constatados durante as campanhas de combate ao câncer de pele realizados pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (cerca de 20%), mas os mutirões da SBD são mais focados em um público que tem pouco acesso aos serviços de saúde. Já o Vigitel representa a população em geral.

O estudo do Ministério da Saúde mostrou que, no total, as mulheres se protegem mais que os homens: 55,5% contra 37,2%. Quanto maior a escolaridade, maior a proteção: entre os que têm até oito anos de estudo, 41,6% evitam os raios ultravioletas; já entre as pessoas que estudaram mais de 12 anos, o percentual passa para 61,3%, sendo que, no caso das mulheres, chega a 73,3%.

Sem rugas
;O protetor solar devia ser usado no dia a dia, assim como a escova de dentes;, alerta o presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia ; regional DF, Gilvan Alves. Porém ele admite que existem alguns impedimentos. ;O custo é alto, e é uma chateação passar no corpo todo, todos os dias. Se fosse só tomar um comprimido, por exemplo, seria mais fácil;, reconhece.

É o que acontece com a estudante de educação física Luiza Paranhos, 20 anos. Jogadora de críquete, um esporte praticado ao ar livre, a jovem conta que, quando está praticando a atividade física, usa fator de proteção solar 40 no rosto e 30 no corpo. ;Não quero ficar toda enrugada e fico com medo de chegar mal aos 40 anos;, conta Luiza. Porém, no dia a dia, ela não passa protetor. ;Já até levei bronca de uma amiga por causa disso. Mas tenho pele oleosa, não gosto de usar sempre. Não passo, mas sei que devia passar;, reconhece. Uma das preocupações da atleta é que, desde a infância, ela costuma ficar sob o sol. ;Uma vez, apareceram algumas manchas na minha pele e já corri para a dermatologista, pensando que era câncer.;

Exposição solar
Apesar do preço e da falta de praticidade do filtro solar, Gilvan Alves recomenda que não se saia de casa sem proteção. ;Não existem dúvidas de que o câncer de pele tem relação direta com a exposição solar, inclusive a forma mais grave de câncer que atinge a espécie humana, o melanoma;, alerta. Esse tipo de tumor é mais agressivo e responde menos aos tratamentos. Até pouco tempo, alguns médicos achavam que o melanoma estava mais associado à predisposição genética. Mas, de acordo com o dermatologista, já foi provado que o sol é um fator indutor deste tipo de câncer de pele.

O presidente da SBD/DF afirma que não existe ;bronzeado saudável;, pois a coloração que aparece na pele depois da exposição ao sol é uma resposta do organismo, que produz melanina em excesso na tentativa de se proteger contra o câncer. Porém como a radiação solar é necessária para produção de vitamina D, que combate a osteoporose, ele recomenda que as pessoas exponham uma pequena parte do corpo durante cinco minutos aos raios UVB, que aparecem entre as 10h e as 16h. Nesse caso, sem usar filtro. ;É o suficiente para ter vitamina durante todo o dia;, garante.

1 - Radiações
Os raios ultravioleta são emitidos pelo sol e, ao penetrar a pele, desencadeiam reações como queimaduras e alergias. Devido ao acúmulo da exposição ao sol, das pessoas, ao longo da vida, eles também podem provocar alterações nas células, que resultam em câncer. Dois tipos de radiação ultravioleta atingem a Terra: UVA, mais frequente entre as 10h e as 16h, e a UVB, a principal responsável pelo câncer de pele.

Sistema público sem estrutura

O Vigitel também avaliou os cuidados das brasileiras na prevenção dos cânceres de mama e de colo de útero. No conjunto da população de mulheres com idade entre 50 e 69 anos, das 27 cidades estudadas, a frequência de realização de mamografia nos últimos dois anos foi de 72,2%. ;Acompanhando recomendações internacionais, o Ministério da Saúde orienta que todas as mulheres dessa faixa etária se submetam a exames de mamografia pelo menos uma vez a cada dois anos, além de recomendar o exame anual para mulheres acima de 35 anos que pertençam a grupos de alto risco;, diz o texto do Ministério da Saúde.

Para o oncologista João Nunes, do Centro de Câncer de Brasília, o índice constatado no estudo é satisfatório. ;O grande problema é o que fazer, caso o resultado do exame indique a necessidade de investigação posterior mais complexa. Não existe uma rede de estrutura adequada para seguir em frente na investigação dos exames que, porventura, se mostrem alterados;, pondera.

Luíza Paranhos pratica críquete e não treina um dia sequer, no Parque da Cidade, sem usar protetor solar nas partes expostas do corpo: prevenir para evitar problemas com câncer de peleAssim como no uso de protetor contra o câncer de pele, a frequência de mamografia nos últimos dois anos aumenta com a escolaridade, passando de 67,3% na menor faixa para 88,2% na faixa igual ou maior a 12 anos de estudo. Na opinião da massagista Fernanda Justiniano Gomes, 25 anos, as mulheres que dependem exclusivamente do sistema público de saúde têm maior dificuldade para conseguir fazer o exame. ;Na rede pública, a pessoa tem de marcar com meses de antecedência. Se não tiver condições para fazer em hospitais particulares, acaba desistindo;, observa.

Prevenção
Embora ainda esteja longe da faixa etária que deve fazer o exame, Fernanda pretende se submeter a uma mamografia depois que a filha de 2 anos e 11 meses parar de mamar. ;É por prevenção mesmo, para me acostumar. A gente é muito acomodado e deixa de correr atrás das coisas importantes. É melhor prevenir;, diz. Desde que engravidou do primeiro filho, aos 15 anos, a massagista faz exames ginecológicos pelo menos uma vez por ano. ;Nunca deu nada, graças a Deus, mas não deixo de fazer;, conta.

O exame citológico, popularmente conhecido como papanicolau, detecta doenças como a infecção pelo HPV, vírus que pode desencadear o câncer de colo de útero. ;Esse câncer é um dos poucos no qual a prevenção é real, ou seja, é possível não ter o câncer fazendo os exames de prevenção de forma satisfatória. Quando detectado precocemente, o índice de cura se aproxima de 100%;, lembra o oncologista João Nunes. No total, o Vigitel revelou que 81,2% das brasileiras fizeram o exame preventivo nos últimos três anos. Porém a diferença é grande, dependendo da capital: enquanto, em São Paulo, o índice é de 90,6%, em Maceió fica em 61,1%.

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