Ciência e Saúde

O mal que faz o cigarro elétrico

Cientistas da Universidade da Califórnia concluíram que não é nada saudável fumar os chamados e-cigs, pois as tragadas são dobradas e o esforço das seguidas sucções acaba provocando danos à saúde

Paloma Oliveto
postado em 31/07/2010 07:00
Má notícia para quem apostava nos cigarros elétricos como alternativa saudável à versão tradicional. Uma pesquisa divulgada pela Universidade da Califórnia provou que, para fumá-lo, a pessoa precisa fazer um esforço maior durante a sucção, o que pode provocar danos à saúde. Os também chamados ;e-cigarros; tornaram-se populares recentemente nos Estados Unidos. Trata-se de um tipo de tabaco com pouca nicotina diluída, que funciona à base de uma bateria e um carregador. A máquina que os pesquisadores usaram para simular o efeito do fumo eletrônico nos pulmõesCriado na China, ele seria indicado como uma terapia para quem está largando o vício, pois, segundo os fabricantes, proporciona a mesma sensação do cigarro (1) normal, mas não possui alcatrão nem aditivos. O mecanismo do aparelho é compensador, semelhante aos adesivos de nicotina, que liberam uma dosagem da substância para satisfazer o usuário. Nos locais onde o aparelho é vendido, como nos Estados Unidos e em alguns países europeus, o e-cigarro também é consumido para driblar a proibição de fumaça em recintos fechados. Embora ele emita um vapor semelhante ao do fumo tradicional, é totalmente inodoro. Até agora, são poucos os estudos sobre os potenciais danos do cigarro eletrônico. Ainda assim, a Organização Mundial de Saúde não recomenda o aparelho e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proibiu sua importação e comercialização no Brasil. O e-cigarro é constituído por um atomizador (artefato que asperge o líquido em minúsculas gotas) e um cartucho vendido à parte, que contém nicotina e propilenoglicol, substância química sem cheiro e sem sabor, usada para criar a névoa falsa, semelhante à fumaça. Quando o fumante suga o ar pelo cigarro eletrônico, um sensor ativa a bateria, que aquece a ponta. Ela fica vermelha e quente, simulando um cigarro normal. Enquanto isso, o atomizador vaporiza o propilenoglicol e a nicotina. Na inalação, o vapor leva uma dose de nicotina aos pulmões, sendo que o resíduo do aerosol é exalado para o ambiente. Como o e-cigarro não contém tabaco, ele está livre das quase 5 mil substâncias químicas e tóxicas da versão tradicional. Descoberta Isso não quer dizer, porém, que o cigarro eletrônico seja saudável. Para testar seus efeitos sobre a saúde, os pesquisadores da Universidade da Califórnia usaram uma máquina e compararam as propriedades do fumo de oito cigarros convencionais e cinco marcas de eletrônicos. Eles descobriram que, para conseguir fumar os e-cigarros, é preciso aspirar com mais intensidade. Os cientistas também afirmam que, no caso dos eletrônicos, a densidade de aerosol cai depois de 10 tragadas, o que faz com que o fumante precise sugar ainda mais forte para conseguir produzir o gás pressurizado. ;Ainda é cedo demais para saber como exatamente os efeitos da forte inalação e da sucção do aerosol terão sobre a saúde humana, mas nos parece que o cigarro eletrônico parece levar as pessoas a fumarem mais, para compensar, assim como aconteceu anteriormente com os cigarros ;light;;, disse ao Correio Prue Talbot, professor de biologia e principal autor do estudo. As marcas de cigarros convencionais examinadas e vendidas nos Estados Unidos foram Merit Ultra Lights, Marlboro Ultra Lights, Marlboro Lights, Marlboro Reds, Camel unfiltered, Camel Lights, Camel e Pall Mall. No caso dos e-cigarettes, foram estadas as marcas Liberty Stix, Crown Seven`s Hydro Kit, NJOY, Smoking Everywhere`s Gold Kit e VapCigs. ;Nosso trabalho mostra que a densidade do aerosol diminuiu ao longo do uso dos e-cigarros, requerendo tragadas mais fortes para manter essa densidade. Os fabricantes sempre alegam que os cartuchos do cigarro eletrônico são equivalentes a um certo número de cigarros convencionais, mas essa informação não parece totalmente correta;, diz Talbot. Dobro de tragadas Segundo o pesquisador, no laboratório foi constatado que, enquanto as 10 primeiras tragadas são similares às de um cigarro convencional, as posteriores não conseguem levar ao organismo o mesmo nível de nicotina, fazendo com que o fumante trague mais do que o dobro para ter a sensação de saciedade fornecida pelos cigarros normais. Talbot garante que, ao contrário do que dizem os fabricantes, os e-cigarros são muito diferentes dos convencionais. ;Em testes preliminares, observamos que algumas marcas de e-cigarro são mais difíceis de fumar. O interior deles é muito denso, comparando-se à porosidade que existe nos cigarros feitos com tabaco;, diz. ;Esse artigo é o primeiro estudo detalhado mostrando que uma pressão na inalação muito maior é necessária para fumar os e-cigarros;, disse, por meio da assessoria de imprensa da Universidade da Califórnia, Kamlesh Asotra, administrador do Programa de Pesquisas sobre Doenças Relacionadas ao Tabaco da instituição. ;Baseado no resultado desse artigo, os usuários não apenas ficarão mais atentos sobre as características do vapor e das propriedades dos cigarros elétricos, mas também os fabricantes saberão que a funcionalidade de seus produtos é inconsistente;, acredita. 1 - Perdas irreversíveis O cigarro contém uma mistura de cerca de 5 mil substâncias tóxicas, entre elas o monóxido de carbono, o alcatrão, a nicotina e a água. O alcatrão, além dos radioativos urânio, polônio 210 e carbono 14, concentra 43 substâncias que provocam o câncer. Ressalte-se que a totalidade dos gastos sociais decorrentes do tabagismo supera em muito a arrecadação de impostos que ele proporciona: o câncer, segunda causa de morte por doença no país, é responsável por grandes gastos com tratamentos e internações hospitalares, uma vez que 90% dos cânceres de pulmão e 30% de todos os outros tipos de câncer são devidos ao tabagismo. As doenças cardiovasculares, primeira causa de morte no país, bem como a bronquite crônica e o enfisema, estão diretamente relacionadas ao uso de tabaco. ; A onda agora é vaporar Apesar da proibição da venda e importação do produto no Brasil, alguns sites driblam a determinação da Anvisa e continuam comercializando os cigarros eletrônicos. O Correio entrou em contato, por e-mail, com um vendedor, que disse ter a mercadoria para pronta entrega, por R$ 299. O vendedor alerta que o produto pode causar dependência e também avisa que ;não existe nenhum estudo que comprove a eficácia do produto como método para parar de fumar ;. Porém, sabendo que está agindo fora da lei, ele também deixa claro que não autoriza a divulgação das informações enviadas pelo e-mail. Existe, inclusive, um fórum on-line dedicado aos usuários do e-cigarro no Brasil. Entre eles, fumar o cigarro eletrônico é chamado de ;vaporar;. Um dos participantes, de 29 anos, conta que os ;e-cigs; ;satisfazem muito bem, dá pra parar na boa;. Mas ele também relata que ;quando eu comprei meu primeiro líquido, de 16mg, achei uma paulada, tipo um estoura peito mesmo;. Exagero Segundo ele, com o tempo, o fumante vai se acostumando e ;querendo cada vez mais;. Outro usuário, de 32, contou que precisa se ;policiar; para não exagerar no consumo. ;Eu levo 40 minutos da minha casa ao trabalho de carro. Vim vaporando de lá até aqui. Preciso me policiar, se não vai ser osso;, admite o fumante. Já um usuário que não especificou a idade relatou, no fórum, sua experiência de 60 dias de uso do cigarro eletrônico. ;Desde o primeiro dia, não fumei mais nem um cigarro convencional.; Segundo ele, respirar ficou mais fácil, e o pigarro sumiu. Mas ele também reconhece que está fumando mais do que nunca. ;O fato de poder fumar dentro de meu escritório sem empestar o ambiente ou deixar cheiro, a empolgação com a novidade, a adaptação ao e-cig, bem como a sensação de que não faz tão mal me incentivaram a fumar mais que nunca. No começo, achei que fumaria menos, porque não tenho aquele compromisso de terminar um cigarro acesso, mas isso não aconteceu;, revela.

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