Ciência e Saúde

Células-tronco de polpa dentária são viáveis até cinco horas fora do corpo

Achado amplia acesso ao material , que poderá, no futuro, ser utilizado na reconstrução de córneas e de vários outros órgãos

postado em 04/03/2011 07:00
Achado amplia acesso ao material , que poderá, no futuro, ser utilizado na reconstrução de córneas e de vários outros órgãosQualquer cientista da área que for indagado atualmente sobre as possibilidades de tratamento e cura da medicina regenerativa vai responder que, em determinados casos, o futuro já chegou. E, se não chegou, já é possível sentir o efeito de seus ventos promissores dentro e fora das bancadas de pesquisa. Dois estudos desenvolvidos nos laboratórios da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB) com células-tronco de polpa dentais ; um de mestrado e outro de doutorado ; ajudam a decifrar segredos moleculares com fortes possibilidades de uso terapêutico.

Como numa corrida de revezamento, a periodontista Daniela Araújo conseguiu demonstrar, pela primeira vez no país, em seus experimentos de mestrado, que células de polpas dentais permanecem vivas e com alta capacidade de proliferação por até cinco horas após a extração de um dente. A doutoranda Luciana Pereira, na mesma linha de trabalho, pretende mostrar, inicialmente, que, mesmo inflamadas, polpas dentárias extraídas preservam seu potencial de uso científico e terapêutico.

;Conseguimos também mostrar que, na polpa dental inflamada (como a removida durante um tratamento de canal), ainda há células-tronco com potencial de proliferação e de diferenciação semelhante ao de uma polpa normal, o que faz desse tecido, que é normalmente descartado no tratamento, uma importante fonte de células-tronco. Além disso, os achados dessa pesquisa ajudam a entender um pouco mais o mecanismo da inflamação irreversível da polpa dental;, explica a endodontista Luciana Pereira.

;O alto potencial de proliferação e a grande plasticidade das células-tronco de polpa dental tornam muito promissoras as perspectivas de utilizá-las em diferentes tratamentos regeneradores;, acentua Daniela. Ela se refere à reconstrução de córneas, de um músculo, de um osso ou de uma cartilagem (veja infografia) a partir do uso de células-tronco dentárias. Mas Luciana adverte: ;Nossas pesquisas vão até certo ponto. As aplicações futuras para tratamentos serão frutos de outras pesquisas, certamente;.

Primeiros passos
Para sustentar o trabalho, segundo as pesquisadoras, é necessário dominar todas as etapas do processo de coleta, armazenamento e diferenciação dessas células. O estudo foi desenhado para avaliar se aguardar até cinco horas no estabelecimento de uma cultura de células da polpa dental prejudicaria a viabilidade celular. Estudos anteriores apenas relatavam que a polpa dental removida do dente era imediatamente imersa em meio de cultura. Como o meio de cultura e os equipamentos necessários para o cultivo dessas células estão disponíveis apenas em laboratórios de pesquisa, era considerado impossível, antes dessa pesquisa, trazer um dente extraído em Águas Lindas para aproveitar as células-tronco da polpa, em Brasília, por exemplo.

;Foi realizado trabalho experimental com utilização de 21 dentes permanentes, divididos em cinco grupos de acordo com o tempo aguardado para colocação da polpa em meio de cultura após a exodontia (extração de dente);, lembra Luciana. Os tempos testados foram: imediatamente depois da extração; 30 minutos depois; uma hora; duas horas; e cinco horas. Realizaram-se uma análise morfológica e dois testes para avaliar a viabilidade e a proliferação celular. O comportamento de todos os grupos foi semelhante.

;Concluímos que as possibilidades de uso e o potencial regenerativo das células do tecido pulpar são vastos. Por isso, é importante a atualização dos conhecimentos, dos avanços científicos, das limitações e perspectivas relativos à sua aplicação;, acrescenta Daniela. Aplicando-se os resultados deste trabalho, os dentes extraídos poderão ser encaminhados ao laboratório, sem alteração de rotina do dentista no atendimento ao paciente, nem necessidade de interrupção das etapas cirúrgicas ou pós-operatórias com intuito de preparar o dente para coletar a polpa.

Assim, o procedimento pós-exodontia poderá ser feito no laboratório de cultura de tecidos, porque haverá tempo para o transporte do dente ao local apropriado. ;A polpa dentária, por ser fonte de células-tronco multipotentes, tem merecido inúmeras pesquisas para que suas características sejam melhor conhecidas;, mostra a doutoranda. Uma prova disso é o trabalho da dupla de odontólogas.

Novas aplicações
Os primeiros estudos com células-tronco extraídas de polpas dentais foram registrados nos Estados Unidos, há 11 anos. Essas células, conhecidas como multipotentes (as embrionárias são totipotentes), podem se transformar em outros tecidos ; ósseo, muscular, cartilaginoso, nervoso ou de córnea, por exemplo. Mas outros estudos, ainda incipientes, ampliam as perspectivas para outras aplicações. No Brasil, os mais importantes centros de estudos da área se encontram em São Paulo e Brasília.

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