Ciência e Saúde

Relatório mostra que produção de gases do efeito estufa cai em 0,9%

Setores de energia e de agropecuária são os que mais emitem

Paloma Oliveto
postado em 20/11/2015 06:08


Principal cartão de visitas do Brasil na conferência do clima de Paris (COP21), a queda no desmatamento não conseguiu impulsionar a redução de emissões de CO2 no país em 2014, que apresentou uma redução muito sutil. Mesmo em um ano de desaceleração econômica, todos os setores ; exceto o de modificação do uso da terra ; registraram aumento na produção de gases de efeito estufa. O principal foi o elétrico, com crescimento de 6%. Os dados foram apresentados ontem pelo Observatório do Clima, rede de organizações não governamentais que publica, todos os anos, o Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG). O relatório indica que, apesar da redução de 18% no desmatamento, a queda das emissões de gases de efeito estufa na atmosfera ficou em apenas 0,9%.

Até agora, a estratégia brasileira vinha apresentando resultados melhores. Níveis menores de desmatamento garantiram uma queda considerável das emissões. Contudo, segundo o secretário executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl, os novos dados apresentam uma situação preocupante porque indicam que, enquanto o Brasil se empenhou em um setor, o de modificação do uso da terra, deixou de lado todos os outros. E não há sinais de mudanças a curto prazo. ;Por ora, maciçamente, todo o planejamento de investimentos para os próximos 15 anos não é de baixo carbono;, observa, em entrevista ao Correio.

Rittl lembra que poucos países têm tanto potencial de conciliar crescimento econômico e baixas emissões. ;Cada vez mais, temos argumentos demonstrando que a redução de emissões não representa obstáculo de crescimento, não exige sacrifício. Pelo contrário, a economia mais limpa é mais eficiente e com maiores ganhos produtivos;, diz.

Contudo, ele afirma que não tem visto, nos planejamentos nacionais, iniciativas para o Brasil trilhar esse caminho. Um exemplo é o Plano Safra 2015/2016: menos de 2% do financiamento programado vai contemplar a agricultura de baixo carbono. O secretário executivo do Observatório do Clima também destaca que o Plano Decenal de Expansão da Energia 2023, já aprovado pelo governo, prevê que 70% dos investimentos no setor estarão destinados aos combustíveis fósseis.

Na apresentação do documento, André Ferreira, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), que coordenou as estimativas de energia e processos industriais, observou que, nos últimos dois anos, o crescimento das emissões do setor energético chegam a 14%. De acordo com ele, três atividades econômicas são as principais responsáveis por trás do aumento no ano passado: transporte (3% mais emissões que 2013), termelétricas (23%) e atividades de produção de combustível, incluindo a exploração do pré-sal, que aumentou 6,8% as emissões de CO2 equivalente.

;A participação das usinas termelétricas na geração de energia para compensar a crise hídrica que afetou as hidrelétricas foi protagonista nesse resultado. É preciso diversificar nossa matriz energética, investindo em fontes limpas como a eólica e o etanol de segunda geração;, defende, em nota, André Ferretti, coordenador-geral do Observatório do Clima. ;Se não encontrarmos caminhos mais firmes para a expansão de fontes de energia renováveis não hídricas, o crescimento das emissões do setor elétrico pode se transformar em uma tendência;, acrescenta André Ferreira, do Iema.

Agropecuária
Fermentação entérica dos animais ruminantes (gases liberados pelo gado) e uso de fertilizantes sintéticos impulsionaram o aumento das emissões agropecuárias que, no ano passado, foram 1,2% maiores que em 2013, totalizando 423,2 milhões de toneladas de carbono equivalente. Mato Grosso, que tem o maior rebanho de bovinos no Brasil, foi o estado que mais contribuiu para o crescimento da poluição gerada no campo, seguido por Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

A coordenadora da iniciativa de Clima e Agricultura do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Marina Piatto, destaca, porém, que a metodologia atual utilizada pelo inventário brasileiro, que segue o modelo do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC), deixa de fora o carbono emitido ou sequestrado pelo solo. Com isso, de acordo com ela, a real emissão do setor fica mascarada.

;O Brasil pode estar emitindo 25% a mais do que a gente está reportando, pelo tamanho das pastagens degradadas que temos hoje;, observa. Estima-se que, no país, existam 60 milhões de hectares de pastagens degradadas. A inclusão do cálculo seria importante não só para um cenário mais real das emissões do setor, mas porque tanto o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), do Ministério da Agricultura, quanto as propostas de redução que serão apresentadas pelo Brasil na COP21, as chamadas iNDCs, preveem a recuperação dessas áreas, assim como a integração floresta-lavoura-pecuária. ;Se o governo cumprir as metas que anunciou de expandir a recuperação de pastagens degradadas e a integração lavoura-pecuária-floresta, é possível chegar a 2030 com uma queda de 50% nas emissões da agropecuária;, avalia Piatto. Contudo, se a metodologia do inventário não mudar, isso não será contabilizado nos relatórios de acompanhamento das reduções de emissões.

Para Tasso Azevedo, coordenador do SEEG, o documento referente a 2014 põe fim à fase de queda das emissões brasileiras, registrada entre 2004 e 2009. Carlos Rittl teme que a estagnação na redução coloque em risco os compromissos assumidos pelo Brasil frente as Nações Unidas, com a apresentação da iNDC. ;As emissões estão crescendo e isso é um sinal de alerta. Se não fizermos mudanças desde já, se deixarmos para começar só em 2020 ou depois das próximas eleições, será muito tarde. O custo da transição para uma economia de baixo carbono será muito mais alto;, avisa.

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