Ciência e Saúde

Homo sapiens chegou à Ásia antes do imaginado, diz pesquisadora

A decisiva migração que partiu da África se deu com pelo menos 20 mil anos de antecedência, segundo análise de fósseis encontrados em Sumatra. O trabalho também traz a evidência mais antiga de existência de homens modernos em florestas tropicais

Vilhena Soares
postado em 10/08/2017 06:00

Caverna onde os fósseis foram encontrados há 120 anos: exames avançados ajudaram grupo de pesquisadores a definir a datação


Eugene Dubois foi o primeiro pesquisador a encontrar fósseis humanos. Há mais de 120 anos, se deparou com dentes em uma caverna de Sumatra, ilha pertencente à Indonésia. Pela falta de tecnologia, não conseguiu determinar a idade das peças. Um consórcio de pesquisadores internacionais retornou ao local e, com a ajuda de técnicas de análise avançadas, conseguiu dar continuidade ao trabalho do pioneiro. O trabalho, publicado na edição desta semana da revista britânica Nature, sugere que os humanos modernos chegaram à Ásia entre 73.000 e 63.000 anos atrás, quase 20 mil anos antes do que se imaginava.


[SAIBAMAIS]Dubois encontrou dois dentes humanos ; um incisivo e um molar ; na caverna Lida Ajer, no meio de uma rica floresta tropical. ;Ele não tinha os avanços científicos que temos à disposição agora, como técnicas de digitalização de arte. Por isso, não conseguiu comprovar a importância nem a idade dos dentes. A parte mais difícil, na verdade, foi tentar encontrar o sítio novamente. Nós só tínhamos um esboço da caverna e um mapa de uma cópia do caderno de campo original de Dubois;, conta ao Correio Kira Westaway, autora principal do estudo e pesquisadora da Universidade Macquarie, na Austrália

Os cientistas chegaram ao local em 2008 e utilizaram técnicas como luz infravermelha e escâneres de reconstituição para reproduzir os dentes digitalmente e compará-los com outros fósseis. Como principal resultado, constataram a chegada ao continente antes do sugerido em estudos anteriores. ;As evidências mais antigas são a de Niah Cave (45 mil anos atrás) e a de Tam Pa Ling Cave (46 mil anos atrás). Nosso achado indica uma presença humana moderna no sudeste asiático quase 20 mil anos antes. Isso também apoia uma saída antecipada da África;, ressalta Westaway.

De acordo com os autores, o Homo sapiens seguiu uma longa rota para fora da África ao longo da costa, já que os ambientes marinhos ofereceriam condições favoráveis ao seu sustento. ;Os baixos níveis do mar teriam permitido acesso a uma grande extensão de floresta por todo o caminho do continente do sudeste asiático até chegar às ilhas;, explica Westaway.

Adaptação

A exposição a coberturas florestais teria encorajado o homem a viajar como os orangotangos e os ursos, que realizaram o mesmo trajeto. ;Essa pesquisa representa a evidência mais antiga do uso da floresta tropical por humanos modernos. Isso é notável, uma vez que é comum admitir que as florestas tropicais são ambientes difíceis para viver, requerem inovações tecnológicas e técnicas de caça sofisticadas. Identificar presença humana moderna em um local de floresta a 63.000 e 73.000 anos atrás sugere que essas habilidades foram implementadas nesse período;, defende a pesquisadora.

Segundo os autores, Eugene Dubois escavou uma série de sítios arqueológicos de Sumatra, mas pouco se sabe sobre eles. ;Nosso trabalho foi alocado em um grupo antigo que chamamos de cavernas de Sumatra, mas, até hoje, todas elas ainda não foram redescobertas. Atualmente, as pesquisas estão em andamento com o objetivo de ampliar a cronologia de Lida Ajer e potencialmente descobrir mais evidências sobre a presença humana moderna nessa região;, diz Westaway.


Pai do elo perdido

Nascido na Holanda, em 1858, Eugene Dubois se tornou médico, mas ficou conhecido por ser um dos maiores entusiastas da arqueologia e o primeiro paleoantropólogo profissional. Em 1887, largou a carreira promissora na Universidade de Amsterdam e seguiu com sua família para a Indonésia. Ele tinha como objetivo provar teorias defendidas por Charles Darwin no livro A origem das espécies. Em 1891, encontrou um pedaço de crânio e, três anos depois, publicou um trabalho que descrevia o artefato como um fóssil que não pertencia nem a macacos nem a homens. Tratava-se de um ser intermediário, o famoso elo perdido.

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