Diversão e Arte

Distribuidor de Lula, o filho do Brasil, Bruno Wainer reclama da saraivada de críticas, e refuta a acusação de propaganda política

Bruno ainda arrepende-se de ter lançado o filme no Festival de Brasília

postado em 13/01/2010 07:00 / atualizado em 22/09/2020 17:14

Filho dos jornalistas Samuel Wainer e Danuza Leão, o produtor e distribuidor cinematográfico Bruno Wainer, 50 anos, carregava no sangue o gene da profissão dos pais. Opção que descartou aos 18 anos, quando entrou pela primeira vez num set de filmagem. O filme em questão era Bye, bye, Brasil (1979), de Cacá Diegues, um dos marcos do cinema nacional. Dali para frente, não parou mais, envolvendo-se, ao longo de 13 anos, nas funções de assistente de direção e diretor de produção de obras como Eu te amo (1980), de Arnaldo Jabor; Ópera do malandro (1985), de Ruy Guerra; e A grande arte (1989), de Walter Salles. ;Como dizia o meu pai, ser jornalista não é ser hereditário;, brinca. ;Me encantei com aquela vida, de conviver com os artistas, é uma vida de muita aventura;, conta Wainer, que, desde 1991, preside a distribuidora carioca Downtown Filmes. Ele está há 19 anos no campo da distribuição. ;Tempo suficiente para entender que cinema é uma atividade de risco;, constata Bruno, responsável pela distribuição no Brasil de sucessos como A vida é bela (1997). Agora, ele está às voltas com o lançamento de Lula, o filho do Brasil, de Fábio Barreto. Em cartaz em mais de 400 cinemas desde 1; de janeiro, a produção, orçada em R$ 12 milhões, encontra dificuldade em identificar o público certo, com 500 mil ingressos vendidos até o momento. ;Avaliei mal a reação contra o filme;, afirma o distribuidor ao Correio, após desabafo reproduzido no Almanakito, newsletter da jornalista especializada Maria do Rosário Caetano. Ele também conta que se arrependeu de lançar o filme no Festival de Brasília. ;Foi uma decisão errada;, lamenta. Ouça entrevista com Bruno Wainer, produtor do filme Lula, o filho do Brasil

; Íntegra da entrevista

 

Como está o desempenho de Lula, o filho do Brasil nos cinemas? Uma luta, não está fácil, não. Vamos ver o que acontecerá. Ainda não faço previsão final dos números. Não posso nem dizer que esperava mais do que está apresentando, porque esperei mais no início. Ao longo desse trabalho de distribuição, o filme foi tão massacrado, que realmente temi uma catástrofe. Estamos nos 10 primeiros dias do filme e não sei onde vai chegar. E como está a praça de Brasília com relação às outras. Há mais dificuldades em São Paulo do que no Nordeste, por exemplo? O filme foi lançado no Brasil inteiro. Brasília, assim como a região Centro-Oeste, saiu razoavelmente bem. Mas a gente esperava mais do filme. É uma pena porque é uma obra que merece ser vista por mais brasileiros. No negócio do cinema, a gente não sabe de véspera o que vai acontecer. O que aconteceu com o filme depois da exibição no Festival de Brasília? Aquela sessão foi a primeira sessão pública de Lula, o filho do Brasil. E só estavam esperando essa sessão para cair de pau em cima do filme, esperando o primeiro evento público para detonar a produção. O que é uma pena porque as pessoas não puderam curtir o filme enquanto filme naquele sessão. Ficaram mais envolvidas com as outras questões que não tinham nada a ver, como o fato de ser um filme sobre um presidente que está no poder, de estar envolvido em campanha presidencial. A partir dessa sessão, a coisa ficou tensa. Você acha que foi um erro exibi-lo no Festival de Brasília? Foi uma decisão de todos. Mas hoje acho que foi uma decisão errada. Na verdade, se era para acusar o filme de uma coisa que não é, ou seja, de ser um instrumento para promover a campanha presidencial, então seria melhor esperarmos para lançá-lo em agosto, quando a campanha presidencial estará para valer em todo o Brasil. Hoje, vejo que não foi bom botar o filme em Brasília. Não foi bom a gente ter jogado o filme às feras tão cedo. Deveríamos ter segurado para o final do ano. Essas acusações são injustas ao seu ver? É uma acusação injusta porque a campanha presidencial não começou. Pode perguntar para qualquer brasileiro se alguém está preocupado com quem vai ser o sucessor do Lula; Veja bem, não sou político, não faço política, não sou de partido nenhum, não sou do PT, nem do PSDB, não sou de nada. Sou um homem de cinema. E acabou. Esse argumento é um fácil argumento. Se o filme tivesse sido lançado em agosto ou setembro, daí as pessoas poderiam dizer: "é um instrumento de campanha". Mas hoje, em janeiro, ele não é um instrumento de campanha. É só um filme. O brasileiro não está preocupado com eleição. Ele está preocupado com as férias de janeiro, depois com o carnaval, a Semana Santa, a Copa do Mundo, aí então, vamos começar a falar sobre a sucessão presidencial. Se o filme tivesse sido lançado em 2009, por exemplo, ou em janeiro de 2010, não muda nada, é o que eu acho. Por que a "esquerda" não saiu em defesa do filme? (Perplexo). Isso realmente não dá para entender, um dia a gente vai descobrir porque. No fundo, eu me pergunto se os amigos do Lula são realmente tão amigos assim. Qualquer coisa que atingir o Lula de uma certa maneira talvez seja do interesse dos grupos que o apoiam. Como ele tem uma projeção maior do que o PT e do que os sindicatos, maior do que os partidos da base, acho que de vez em quando esse grupo que o apoia acha bom que algo o atinja porque assim eles não ficam tão independente da figura do Lula. Realmente a esquerda, a palavra esquerda talvez não seja apropriada, ou melhor, os aliados do Lula não foram aliados dele no filme. A campanha envolvendo os sindicatos começa para valer quando? A partir desta semana, que é quando os sindicatos e as próprias centrais sindicais voltam de férias. Agora se ela vai ser efetiva ou não veremos nos próximos dias. Por enquanto, a participação dos sindicatos, de venda de ingressos para pessoas envolvidas ao sindicatos não teve nenhuma repercussão. O filme está vendendo ingresso como qualquer outro filme, disputando o interesse do público em geral. Ou seja, não tem nenhum movimento fora da linha por causa dessa promoção. Vamos ver se a partir das próximas semanas a gente nota alguma alteração. As sessões têm sido tensas em algumas cidades? Agora, na verdade, ao contrário. Recebemos inúmeras manifestações de apreço com relação ao filme. As sessões tensas foram nas pré-estreias, a partir de Brasília. Essa situação toda te deixa chateado? Eu só o distribuidor do filme. Tenho que saber quais são as minhas responsabilidades. E esse risco a gente sempre soube que existia. Se eu tiver que ficar chateado com alguma coisa, é com a minha própria falta de sensibilidade de tentar enxergar a extensão dessa campanha contra o filme. Não imaginei que ela seria tão intensa, que usaram de tamanho bombardeio contra o filme. Claro que haveria polêmica, que os adversários do Lula não perderiam oportunidade de fazer polêmica, mas por outro lado achei que teria o pessoal para defender. Enfim, foi uma má avaliação da minha parte, só isso que quero dizer. E a responsabilidade é minha enquanto distribuidor. Algumas pessoas acusam o roteiro de endeusar a figura do Lula. O que tem a dizer sobre isso? Absolutamente. O filme apenas retrata a vida de um brasileiro. Ao contrário, tem várias situações do filme que humanizam sua figura. Isso não existe, é uma estrutura dramática perfeita. Esse filme não é um drama psicológico sobre a figura do Lula. Ele revela sua trajetória até ele virar líder sindical. Discordo dessa opinião. É difícil distribuir filmes no Brasil? É difícil distribuir filmes no mundo. A atividade cinematográfica é uma atividade de alto risco. Comecei no campo da distribuição em 1991, ou seja, estou há 19 anos neste ramo, tempo suficiente para entender como os filmes são produzidos, são financiados, para descobrir que essa área é, realmente, de alto risco. Não só os filmes brasileiros como produções de qualquer nacionalidade. Em termos de mercado, é mais fácil trabalhar com filme estrangeiro ou nacional? O filme estrangeiro de distribuidor independente é muito mais desprotegido do que filme brasileiro. Esse filme estrangeiro de distribuidor independente vai disputar mercado com os filmes estrangeiros das majors (como são chamados nos Estados Unidos, os grandes estúdios como Disney, Fox Films, Paramount, Sony Pictures, Universal Pictures), que são produções estrangeiras com mais chances comercias. Distribuir filmes brasileiros, por conta das leis que protegem essas produções, de uma certa maneira, está menos desprotegido. Mas o filme estrangeiro já vem testado no seu país de origem, já está com mais trajetória do que uma produção brasileira. Filme brasileiro a gente nunca sabe exatamente o que vai acontecer, às vezes, surpreende-se para o bem, às vezes, surpreende-se para o mal. Qual será a próxima distribuição da Downtown? Chico Xavier (cinebiografia sobre o médium, dirigida por Daniel Filho). Vou para minha segunda cinebiografia neste ano e espero que, com essa produção, eu encontre menos dificuldade do que com Lula (risos). Este ano é o centenário de nascimento do Chico Xavier e o lançamento do filme será no dia 2 de abril, o dia em que ele nasceu. É uma grande história, emocionante e tenho certeza que não vamos encontrar tamanha dificuldade dessa vez. COLABOROU CARLOS MARCELO

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação