Diversão e Arte

Sete meses depois do acidente de Dinho Ouro Preto, Capital Inicial volta à ação

postado em 09/06/2010 07:00
O baterista Fê Lemos se sente obrigado a repetir duas, três vezes durante a entrevista: quase todas as músicas de Das kapital, o 11; disco do Capital Inicial, já estavam prontas antes de novembro de 2009. Mas a explicação insistente, que deveria esclarecer as dúvidas dos fãs, rende uma nova questão. Se é assim, por que o clima do álbum ; às vezes enevoado, até melancólico ; parece ecoar o drama que a banda enfrentou nos últimos meses do ano passado? ;Depois do acidente do Dinho, algumas coisas que soavam mais alegres ficaram mais escuras;, admite Fê. Em meio às sombras, um fato não se discute: depois de 1; de novembro, os planos da banda mudaram. E o disco, pelo menos em parte, também se transformou. Naquela madrugada, Dinho Ouro Preto caiu do palco durante um show em Patos de Minas. Fraturou três costelas, trincou seis vértebras e machucou os rins, a cabeça, os dentes e o queixo. Passou um mês internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, onde colaborou (a distância, via internet) na criação do disco do Capital. Até então, Das kapital seria um registro ;cru e enérgico; da sonoridade do quarteto. O baixo de Flávio Lemos soaria ainda mais pesado, como nos palcos. Os riffs do guitarrista Yves Passarell, barulhentos. O resultado serviria de contraponto à polidez do projeto anterior, Eu nunca disse adeus (2007). ;Tudo foi testado, experimentado. Entramos no estúdio já sabendo o que queríamos;, conta Fê. Mas, ;de molho;, Dinho alterou esse rascunho com um ingrediente imprevisto: um leve desespero. O dedo do acaso. ;Tudo o que acontece comigo acaba aparecendo nas minhas canções;, Dinho afirmou, em entrevista ao Correio há um mês. Dito e feito. Se a base melódica do disco foi cimentada em longos três meses, as letras foram retocadas pelo vocalista após o acidente. Em Não sei por quê, o trecho ;Um pouco de ciúmes já me basta; virou ;Um pouco de tristeza já me basta;. E é só um exemplo. ;O Dinho pensou nas letras, mudou algumas coisas importantes. Ele passou por uma experiência forte, poucas pessoas sobrevivem a isso;, observa Fê. Resíduos Para abrir o repertório, não à toa, escolheram Ressurreição, que já estava pronta (com o título premonitório e tudo) antes da queda do vocalista. Resíduos da tragédia também podem ser encontrados em faixas como Vivendo e aprendendo e Vamos comemorar. Mas nem todos os sinais devem ser levados ao pé da letra. O que há de introspectivo no disco pode ser creditado à fase que a banda está passando. À idade adulta, simplesmente. ;Não temos mais 20 anos de idade. O que está nas nossas músicas é a maneira como vemos o mundo. Um dos segredos da nossa longevidade é que sempre falamos o que quisemos e da forma como quisemos;, define o bateirista, 47 anos. Outra pista: o retorno às fundações do rock brasiliense, que produziu o disco MTV especial: Aborto Elétrico (2005), também colaborou para a temporada acinzentada. ;Para gravar as músicas do Aborto, eu tive que encontrar um sentimento de urgência na forma de tocar, um nervosismo. Lembro que para mim foi difícil tocar aquelas músicas;, conta Fê, que participou da primeira formação do Aborto, com Renato Russo e André Pretorius. ;Agora, neste disco novo, eu estava com tudo na mão. Foi um trabalho de preparação física, até;, conta. O próprio título do disco, que acena para O capital, de Karl Marx, remete às referências punk. Mas o Capital não tem mais 20 anos ; tem 28 de estrada ; e, por isso, Das kapital soa também um tanto esperançoso ; e, claro, perfeito para as rádios. ;Se foi um erro, quero errar sempre assim;, cantam, em Vivendo e aprendendo. E aí a mensagem se faz muito clara, ninguém precisa explicar. DAS KAPITAL Décimo primeiro disco do Capital Inicial. Com 11 faixas e produção de David Corcos. Lançamento Sony Music. Preço médio: R$ 25. ***

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