Diversão e Arte

Brincadeira em família

postado em 10/08/2010 07:00
Fernanda Takai e John Ulhoa, o casal-símbolo da banda Pato Fu, encontrou o que parecia ser um tesouro dentro da própria casa. Quer dizer, mais especificamente, dentro do baú de brinquedos da filha de 6 anos, Nina Takai Ulhoa. ;Gostamos de pesquisar sonoridades. Eu acabava levando os brinquedos da minha filha para o estúdio. Andei usando essas coisas em discos que produzi. O som é tão característico que não dá para se importar se é desafinado. Eles têm uma pureza de alma que os instrumentos de boa qualidade não têm;, explica o pai que gosta de surrupiar as coisas da filha.

Em Música de brinquedo, mais novo disco do Pato, o conjunto regride até a tenra infância em álbum todo executado com instrumentos feito para crianças. Sim. O experimento é estranho, principalmente, para uma banda que acaba de alcançar a maioridade. ;Não vejo um paradoxo nisso. Acho até que é o contrário. Isso só faz sentido agora que a gente começou a ficar mais velho e a ter filhos. Uma banda nova estaria tentando lançar repertório inédito e fazer carreira;, defende o músico e produtor.

;O nosso maior combustível é o cotidiano. Quando escolhemos essas músicas foi do nosso gosto como cidadão comum;, comenta Fernanda sobre a escolha de canções consagradas como Live and let die, Love me tender, Ovelha negra, Eles estão surdos e Frevo mulher. ;Quando a gente teve a ideia do disco, pegamos os originais e ouvimos muito. Fizemos um mapa bem decalcado dos arranjos. Só o fato de ter sido tudo transformado já deixa bem claro qual é a proposta. A gente não podia ter medo de assumir totalmente essa sonoridade;, explicou a cantora. A engenharia foi de difícil execução. O processo exigiu adequação manual para tocar instrumentos tão pequenos. Muita gentileza foi necessária também. ;Nós tínhamos de ter cuidado porque os instrumentos são muito frágeis e poderiam quebrar;, relembra Ulhoa.

Não satisfeitos em gravar de brincadeira, o Pato Fu sairá em turnê. De novo, serão necessárias adequações. Xande Tamietti (baterista), Ricardo Koctus (baixista), Lulu Camargo (pianista), John Ulhoa (guitarra) e Fernanda Takai (vocal) se apresentarão sentados diante de uma mesa repleta de brinquedos. No palco, as crianças cantoras Nina e Mateus serão substituídas por dois bonecos de monstrinhos criados e manipulados pela companhia Giramundo, de Belo Horizonte. ;O Pato Fu sempre foi uma banda de opções estranhas. Tem a ver com a nossa personalidade como grupo e com nosso momento pessoal;, qualifica o guitarrista.

Mesmo com tanta criancice em jogo, o projeto não é exatamente indicado apenas para os pequenos. O disco pode ser encontrado em prateleiras diversas. ;Essa confusão já nos acompanha há muito tempo. Acho muito saudável. O melhor é deixar as pessoas nessa dúvida. Ele pode servir de um universo ou de outro. As canções não são do universo infantil. Mas, o som é muito atraente para crianças;, classifica Fernanda.

Crítica - ***
Os reis do parquinho
Tiago Faria

MÚSICA DE BRINQUEDO
Álbum da banda Pato Fu. Produzido por John Ulhoa, no estúdio 128 Japs.
Preço médio: R$ 27,20Chame de Rotomusic de brinquedoteca. O disco novo do Pato Fu parece ter sido criado para provocar mal-entendidos. Para crianças pequenas? Não exatamente. Para os mais crescidos? Talvez sim. Pronto para tocar nas rádios? Definitivamente não. Música de brinquedo é um disquinho que abre com a conhecidíssima Primavera (de Cassiano), flerta com Rita Lee (Ovelha negra) e fecha com Elvis Presley (Love me tender) e, ainda assim, soa como um objeto colorido não identificado.

Não é caso de amor à primeira audição. O mix de realejo, piano infantil e glockenspiel de latão (entre tantas outras adoráveis miniaturas) produz uma sonoridade ao mesmo tempo incômoda (já que esquelética, cheia de lacunas) e macia ; um bibelô de barulhinhos de plástico. Para uma banda que gravou um álbum chamado Ruído rosa (2001), a experiência não deveria parecer tão estranha. Mas parece. Desde a estreia (o arteiro Rotomusic de liquidificapum, de 1993), o Pato não arriscava tanto.

Isso significa que, para parte de público (e inclua aí os fãs do quinteto), a invencionice será tratada como uma daquelas curiosidades que se ouve uma vez e nunca mais. De fato, apresenta uma cota (inevitável) de bizarrices: o corinho infantil em faixas como Primavera e Todos estão surdos, por exemplo, é do tipo de brincadeira doméstica que se deixa guardada no armário da sala. Mas, entre joias e tranqueiras, o Pato Fu leva a traquinagem a sério. Adoça os ;clássicos; e nos convence, pouco a pouco, a entrar no jogo. Se preferir, chame de música pop.

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