Diversão e Arte

Em novo disco, o Zeca Pagodinho reafirma a maturidade musical

José Carlos Vieira
postado em 19/09/2010 02:40

Zeca Pagodinho: Zeca Pagodinho só é Zeca da porta da casa pra fora. Dentro do aconchego do lar, ele se transforma em Jessé Gomes da Silva Filho, faz questão de enfatizar. Bem humorado, ele conversou por telefone ; lamentou não ser numa mesa de bar ; com o Correio sobre seu novo trabalho, Vida da minha vida, que chega às lojas na próxima terça-feira. O disco tem a produção do maestro Rildo Hora, responsável pelos sutis arranjos de metais e até de cordas nos batuques de Zeca, que gosta de lembrar: ;Pode até entrar um violino, mas ninguém tira as minhas coisas do samba;.

Entre as faixas de destaque estão a que dá nome ao CD, Vida da minha vida (Vida da minha vida, se eu fosse sabedor/ Deixava mais aquecida, a chama que me queimou), de Sereno e Moacyr Luz. Também o clássico Poxa ganha o verniz da voz rouca de Zeca. Um resgate, segundo ele, das lembranças de sua juventude. Alcione participa do disco dividindo os microfones em Quem passa vau parar (O Rio de Janeiro sempre foi assim/ Uma cerveja com um parceiro/ Na porta de um botequim).

Ouça trecho de Poxa, com Zeca Pagodinho



Entrevista - Zeca Pagodinho


Você está lançando seu novo CD, Vida da minha vida, com pompa de um popstar. Como foi a escolha do repertório?

O repertório a gente encontra toda hora nas reuniões em Xerem, entre muita cerveja e samba. Depois, a gente vai para o estúdio e a festa continua. A escolha do repertório é sempre uma festa. Uma festa que não precisa nem de sonrisal (risos).

Como foi a inclusão do sucesso Poxa nesse disco?

Rapaz, descobri Poxa por acaso. Estava ouvindo a Rádio Tupi antes da hora da Ave-Maria e a rádio tocou Poxa. Eu falei: ;Ôpa! É isso!”. Eu queria alguma música da minha lembrança, da minha juventude e que tivesse sido um sucesso da época que a gente cantava nos botequins... E eu não achava a música certa para incluir no disco. Certo dia, estava esperando a hora da Ave-Maria e sempre a rádio toca uma música antiga, foi quando tocou Poxa, liguei pro Rildo (Hora), produtor do CD, e disse: ;Rildo, achei!”. É agora.

Em Orgulho do vovô, você aparece como parceiro de Arlindo Cruz. O sambista está dando lugar ao poeta Zeca Pagodinho?

Sempre fui mais compositor que outra coisa. É porque me tiraram espaço e me jogaram pra esse negócio de cantar e meu lado de compositor acabou sumindo um pouco.

Você já pensou em escrever um livro?
Acho um pouco complicado. Pra mim, fazer samba é igual a beber água, mas fazer um livro é como beber um barril de água (risos).

Com o auxílio luxuoso de Rildo Hora, o disco é carregado de bons arranjos de metais e até de cordas, mas não corre o risco de pasteurizar o samba?
Olha, o samba merece uma riqueza, ficam tão bonitos esses arranjos.

Mas você não tem medo de acharem seu samba engravatado?

Engravatado nunca, você não ouviu a batuca?É batucada direto. Não sai o batuque, não sai o violão de sete cordas, não sai o cavaquinho. Pode até entrar um violino, mas ninguém tira as minhas coisas do samba.

Você acha correto os críticos enquadrarem seu trabalho como samba pop?

Samba pop? Eu não me preocupo com isso não.

Feirante, camelô, office-boy, contínuo e anotador de jogo do bicho. De qual dessas profissões você sente saudades?
Tudo tem uma história, tudo tem uma lembrança;

Vinho, uísque ou cerveja?
Cerveja sempre.

O Zeca Pagodinho engoliu o Jessé Gomes da Silva Filho ou você sabe diferenciar esses dois lados?
Tem uma grande diferença. O Jessé fica em casa. Na rua, é o Zeca. O Jessé fica em casa cuidando da família, mas quando saio de casa, vem o Zeca Pagodinho e esculhamba tudo.

É legal que isso é um álibi danado, porque se a patroa reclamar você pode dizer: não era eu, era o Zeca (risos)
...
(Risos) Tem razão.

Você não acha que no Brasil tem malandro demais?

Acho que tem pilantra demais.

Como foi sua aproximação com a ;madrinha; Beth Carvalho e com Almir Guineto, no início de sua carreira?
Ih, rapaz, tem tanto tempo. Mas sei que foi no samba que encontrei Beth. Almir é meu professor, meu parceiro. Me levou para São Paulo, morei no apartamento dele. A gente botava pra quebrar (risos). Hoje, a gente está mais devagar. Os tempos não são mais os mesmos.

Quando você viaja pelo país com seus shows, de que você sente falta do Rio?
De casa e do meu botequim, gosto de ficar em casa com meus filhos, minha mulher e meu neto.

Sambista é sempre visto como apolítico, que gosta de desconversar e alguns chegam a dar declarações conservadoras. Como você vê esse momento político do Brasil?
Horrível. Não gosto de falar nem disso, porque acaba com o meu dia.

Você é Dilma, Serra ou Marina?

Sou Deus, porque só Ele nos ajuda.

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