Diversão e Arte

Hermeto Pascoal lança 13 músicas feitas a partir de sons do corpo

postado em 07/07/2012 14:36

Enquanto a música contemporânea, inclusive a erudita com a música eletroacústica, faz cada vez mais uso de aparatos tecnológicos, o multi-instrumentista Hermeto Pascoal decidiu, novamente, fugir dos padrões e lançou um DVD com 12 músicas feitas apenas com sons obtidos a partir do corpo. Essa experiência, segundo o próprio músico ; famoso por transformar qualquer tipo de som em verdadeiras peças musicais ; não implicou em limitação para o trabalho, até porque, argumenta, ;o corpo é o instrumento mais perfeito que se tem;.

;O corpo sempre foi um dos meus instrumentos prediletos, apesar de o que mais aparece [em alguns dos meus trabalhos] ser o uso de coisas não convencionais. Eu quis mostrar isso no DVD;, disse o músico à Agência Brasil, referindo-se ao recém-lançado Hermeto Brincando de Corpo e Alma. O formato escolhido foi o DVD para permitir que as pessoas vejam cada uma das origens dos sons usados nas novas composições.

;Explorei muito as partes internas do corpo. Há batidas feitas a partir do som do coração, assovios, sons do intestino, da barba e da minha válvula mitral [válvula cardíaca que separa a aurícula esquerda do ventrículo esquerdo], que dizia claramente a palavra Nelma;, explicou. ;[Essa experiência] foi uma busca pelos sons da aura;.

Uma das principais habilidades de Hermeto é enxergar música onde ninguém vê. ;Meu caminho foi do som para as notas musicais;, explica. ;Por isso me assustei ao ver que só havia 12 notas [as sete notas e suas variações, entre sustenidos e bemóis] em todas as músicas [já feitas];.

Hermeto lembra que, aos 50 anos, ficou bastante angustiado com essa limitação. ;Certa vez, na tentativa de fugir disso, afinei uma viola caipira com cada corda em uma nota diferente. Apesar de não ter dado para fugir das 12 notas, passei a entender que viemos aqui para ser semelhantes e não diferentes dos outros. Em todas as partituras já escritas são as mesmas notas, mas não está tudo igualzinho, como faz o computador. Agora, você vê que lindo: criar sobre 12 notas 5 mil músicas, como eu fiz, e não parar de escrever. [Nesse processo,] entendi também que meu professor é meu dom e que, sem egoísmos, temos de valorizar cada vez mais as semelhanças;, disse.



O multi-instumentista, no entanto, alerta para não se confundir semelhança com cópia ou imitação. ;Não se ensina a compor; a criar. Compor é você tocar bem. Ao tocar uma melodia, mesmo que ela não seja sua, você está criando algo sobre ela. Não podemos confundir semelhança com imitação. Você pode fazer 2%, mas faça bem feito. Sem esses seus 2%, os 98% não funcionam;, ensina.

Tecnologia -Hermeto reitera a aversão que tem à interferência que alguns aparatos tecnológicos exercem sobre a criatividade musical, limitando-a ao invés de abrir novos horizontes. ;Aparatos tecnológicos são como esses produtos novos que aparecem por aí, como sabonetes, pastas de dente. Em geral, quem cria não é músico e quem vende diz ser o que há de melhor no mundo. Mas é tudo [apenas] para ganhar dinheiro;, diz.

;Tudo que tem ali [nos computadores] não só já existe como tem até nome técnico. Máquina não cria nada e nem faz música. Você pode até aproveitar o computador para ter facilidades, como fazer cópias, escrever para orquestra ou transpor a pauta para diferentes instrumentos, mas tudo isso só acontece a partir de um pensamento.;

Hermeto é contra rótulos musicais. Seja para estilos ou para épocas. ;A música do século 21 é [apenas] a que estamos fazendo no século 21, porque música boa nunca tem época nem idade. Não está limitada também aos instrumentos. Para mim, assobiar é tão importante como tocar piano, flauta ou chaleira;.

Apesar de apregoar a fuga de padrões musicais pré-estabelecidos, Hermeto ressalta a importância de se conhecer esses padrões para poder evitá-los. ;Claro que, para fugir do padrão, é importante conhecer o padrão, mas padrão é como uma pedra para você dar uma topada e mudar a rota. É natural haver semelhanças, mas não é legal coisas iguais. Se você pegar um copo para ser focado por vários olhares, verá que cada um o enxerga de forma diferente, por um ângulo diferente;, ensina este alquimista cuja genialidade continua a mesma: transformar sons em música.

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