Diversão e Arte

Mostra reúne trabalhos de importantes ilustradores argentinos

Ricardo Daehn
postado em 22/11/2012 06:05

Numa declaração, o humorista argentino Roberto Fontanarrosa foi incisivo ao estipular o papel dos compatriotas: ;Na divisão internacional do trabalho coube a nós fazer rir;. Junte-se ao tom cortante, imagens de nomes de peso do cartum, como o de Liniers ; que, por exemplo, capta o desconforto de ovelhas, ao doarem lã para humanos ; ou de Maitena, popularizada pelos jornais, e parte da exposição Nos tocó hacer reír ; montada, a partir de hoje, no Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul), está desvendada.

;É um painel sobre toda a produção da história argentina. As obras mais antigas não tinham originais, uma vez que eram feitas sobre pedra litográfica, daí serem retratadas em material de jornais do século 19;, explica a curadora Judith Gociol, ao falar das reproduções tiradas de exposição criada para a Feira do Livro de Frankfurt 2010, quando a Argentina foi homenageada.

Boogie

Especializada nos dados biográficos de artistas como Quino ; que, por mais de 30 anos, respondeu pelas aventuras da curiosa menina chamada Mafalda, sempre ponta a desafiar a lógica dos adultos ; e ainda pelos feitos de Roberto Fontanarrosa, cartunista de Boogie (um amalucado veterano do Vietnã), a argentina Judith Gociol chegou num patamar que lhe permitiu encarar a coautoria de La historieta argentina ; Una historia, apanhado do desenvolvimento das histórias em quadrinho na Argentina. Num passo ainda mais completo, dez anos depois, ela foi recrutada para, como curadora, selecionar o material que compõe a mostra Nos tocó hacer reír ; Tivemos que fazer rir, a partir de hoje em cartaz no Espaço Cultural Renato Russo (508 Sul).


Brasília é a primeira cidade brasileira a receber o compêndio de mais de 200 reproduções (formatadas em painéis) das obras que, em 2010, integraram exposição da Feira do Livro de Frankfurt. "Por limitações relacionadas ao pagamento de seguros e transportes, optamos pelas reproduções. Priorizamos as imagens para que, observando, o visitante perceba a diferença entre estilos gráficos. Buscamos trabalhos com poucas palavras e aqueles com textos contam com traduções", explica a ex-agitadora cultural da revista La Maga. A perspectiva, pelo que Gociol enfatiza, é de obras que tenham tratado especificamente da Argentina, mesmo que de modo indireto.


A pesquisadora ainda alerta para alterações no âmbito comercial das histórias em quadrinhos. "As diferenças estão no modo de ver: mudaram os circuitos de vendas, antes concentrados em quiosques e nas revistarias, e agora tudo circula por internet. O público sabe em que site os criadores estão, e ele busca desta forma", comenta.


Depois de vistos em Buenos Aires, em Rosário e La Plata (Argentina), os trabalhos chegam ao Brasil organizados sob o mesmo sistema temático. "Temos uma ou duas obras de cada autor: trata-se de uma retrospectiva histórica. Muitos dos artistas que formam a mostra trabalham em outros ramos ou mesmo para o exterior", ressalta. Com reforçado viés crítico, despontam imagens tocantes aos direitos humanos e também a situações políticas. "Sempre houve duas Argentinas. Na mostra, temos segmentos como Nunca Mais, dedicado à carga de violências. Há dívidas também na democracia, não apenas na ditadura. Há vítimas da pobreza, da fome e do gatilho fácil da polícia. Um exemplo é o desaparecimento de Jorge Júlio López, em 2006, justo um dos acusadores em processos da ditadura", observa a curadora.


A partir dos primórdios dos desenhos argentinos, um dos blocos formatados na mostra é Fundações; enquanto "fenômenos de uma cidade quase cenográfica" constróem a seção Cidade. "Nesse, a proposta contempla elementos como tango, futebol, viagens em metrô e outros traços que formam parte da identidade argentina", explica Judith Gociol. O extermínio de indígenas, gauchos relegados a plano inferior (e projetados para patamar superior, por mera contingência), a Argentina como modelo de exportação agrária e os debates dos donos de campos ( especialmente as reações inflamadas contra cobranças de novos impostos) são algumas das questões retratadas. Até 3 de fevereiro, a mostra prossegue, com visitação diária, sempre das 9h às 21h.

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