Diversão e Arte

Correio reconstitui os bastidores das visitas de Clarice Lispector à cidade

As vindas da escritora nas décadas de 1960 e 1970 resultaram em duas crônicas memoráveis

Severino Francisco
postado em 14/09/2014 08:02

Clarice Lispector passou o Natal de 1961 na capital federal

;Quando morri, um dia abri os olhos e era Brasília. Não chorei nenhuma vez em Brasília. Não tinha lugar. ; É uma praia sem mar. Em Brasília não há por onde entrar, nem por onde sair. Todo um lado de frieza humana que eu tenho, encontro em mim aqui em Brasília, e floresce gélido, potente, força gelada da natureza.; Clarice Lispector só esteve três vezes em Brasília, mas captou como ninguém a alma brasiliana em duas crônicas memoráveis, que figuram entre os textos fundadores da cidade ao lado dos escritos de Lucio Costa e Nelson Rodrigues.

Rubem Braga dizia a Clarice Lispector que se sentia diante dela como um rádio vagabundo, de galena, enquanto ela era armada de radares, ondas curtas e satélites. Clarice só esteve em Brasília três vezes, mas a captou no ar mais do que qualquer outra pessoa. ;Reconheço esta cidade no mais fundo do meu sonho;, escreveu.

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Clarice veio pela primeira vez à cidade em fins de 1961, com os filhos, Pedro e Paulo, muito pequenos. Era casada com Maury Gurgel Valente, que ainda não havia ingressado no Itamaraty como embaixador, mas trabalhava em Brasília como chefe de gabinete de Afonso Arinos. No entanto, Clarice e Gurgel já estavam em processo de separação e nunca vieram juntos a Brasília. Ela ficou hospedada na casa do casal de amigos Rubens e Marisa Ricúpero: ;Naquele tempo a cidade era muito vazia;, lembra Rubens Ricúpero. ;A Asa Norte praticamente não existia. Ela era uma pessoa fascinante, com uma imensa capacidade de observação. Uma das coisas que ela disse sobre a cidade, que não soa muito simpática, é que Brasília parece comida de avião. Eu não sei bem em que contexto, ela disse isso.;

Marisa Ricúpero lembra ao Correio que passou três dias com Clarice em Brasília durante o Natal de 1961. Certo dia, tentaram ir conhecer os arredores da cidade, mas era mal sinalizada e elas se perderam próximo a Planaltina, em carro dirigido por motorista do Itamaraty, e ficaram no meio da estrada: ;Encontramos um capiau que tinha caçado um tatu e estava com ele debaixo do braço. Pedimos a direção para ele, que nos respondeu apontando com o queixo. Não adiantou muito. Ela começou a divagar sobre o tatu, ela dizia umas coisas muito engraçadas, muito estranhas. Foi uma coisa impressionante, merecia ser gravada;.

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