Diversão e Arte

Vida de Manoel de Barros foi marcada por entrega à poesia

Para ele a função do poeta era arejar as palavras para que não morressem de clichês

postado em 13/11/2014 10:49
Para ele a função do poeta era arejar as palavras para que não morressem de clichês

Manoel de Barros sempre esteve conectado aos cheiros, texturas, cores e sabores na natureza. Ele também aprendeu a observar nas plantas e nos animais a essência da poesia. ;Sou mais monturo para poesia. Monturo guarda no ventre a semente das árvores e das palavras. Guarda nossos resíduos, nossos mijos e ciscos de passarinhos. Gosto de ver as pequenas lagartas, estranhas como um etrusco, atravessando os monturos. Gosto de ver as formigas vesúvias correndo nos monturos. E de ver sobre elas as larvas túrgidas. Monturo é lugar de urubus.;


Portanto, descrever a função da poesia era tão simples para ele quanto narrar os arrodeios do vento que fazem movimentar as copas das árvores. ;Poesia é para incorporar. Porque é nos sentidos que a poesia tem fonte. Poeta não tem compromisso com a verdade, senão que talvez com a verossimilhança. Não há de ser com a razão mas com a inicência animal que se enfrenta poema.;

[SAIBAMAIS]Manoel sempre disse que a função do poeta era arejar as palavras para que não morressem de clichês. E foi isso que buscou fazer em todo o tempo em que esteve recluso no cantinho que escolheu para escrever e fabricar os caderninhos, valiosos manuscritos. ;O poeta precisa reaprender a errar a língua. Esse exercício poderá também nos devolver a inocência da fala. Se for para tirar o gosto poético é bom perverter a linguagem. Temos de molecar o idioma, os idiomas. Nosso paladar de ler anda com tédio. É preciso injetar nos verbos insanidades, para que eles transmitam aos nomes os seus delírios.;

Trajetória
Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá (MT) no Beco da Marinha, beira do Rio Cuiabá, em 19 de dezembro de 1916, filho de João Venceslau Barros, capataz com influência naquela região. Mudou-se para Corumbá (MS), onde se fixou de tal forma que chegou a ser considerado corumbaense. Atualmente mora em Campo Grande (MS). É advogado, fazendeiro e poeta.

Tinha um ano de idade quando o pai decidiu fundar fazenda com a família no Pantanal: construir rancho, cercar terras, amansar gado selvagem. Nequinho, como era chamado carinhosamente pelos familiares, cresceu brincando no terreiro em frente à casa, pé no chão, entre os currais e as coisas "desimportantes" que marcariam sua obra para sempre. ;Ali o que eu tinha era ver os movimentos, a atrapalhação das formigas, caramujos, lagartixas. Era o apogeu do chão e do pequeno.;

Escreveu seu primeiro poema aos 19 anos, mas sua revelação poética ocorreu aos 13 anos de idade quando ainda estudava no Colégio São José dos Irmãos Maristas, no Rio de Janeiro, cidade onde residiu até terminar seu curso de Direito, em 1949. Como já foi dito, mais tarde tornou-se fazendeiro e assumiu de vez o Pantanal.

Seu primeiro livro foi publicado no Rio de Janeiro, há mais de sessenta anos, e se chamou ;Poemas concebidos sem pecado;. Foi feito artesanalmente por 20 amigos, numa tiragem de 20 exemplares e mais um, que ficou com ele.

Nos anos 80, Millôr Fernandes começou a mostrar ao público a poesia de Manoel de Barros. Outros fizeram o mesmo: Fausto Wolff, Antônio Houaiss, entre eles. Os intelectuais iniciaram, por meio de tanta recomendação, o conhecimento dos poemas que a Editora Civilização Brasileira publicou, em quase a sua totalidade, sob o título de ;Gramática expositiva do chão;.

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