Economia

A força do assédio moral na administração pública

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postado em 14/12/2008 08:34
No começo, parece só implicância. Mas, com o tempo, a convivência entre chefe e subordinado fica insustentável. Quem dá as ordens, abusa do poder para garantir espaço, impor suas vontades ou simplesmente humilhar. Obrigado a segui-las, o funcionário se sente acuado, vive o dia-a-dia do trabalho com medo e chega até mesmo a adoecer. No setor público o assédio moral ganha contornos bem particulares.

Mais do que nas empresas, as relações dentro de uma repartição esbarram no subjetivismo do cargo, prevalecendo, muitas vezes, a velha máxima do ;manda quem pode, obedece quem tem juízo;. A falta de uma legislação específica deixa o Estado refém do bom senso ; ou da falta dele ; de cada agente público. Ainda não é possível medir o custo econômico da pressão excessiva e repetitiva dentro do funcionalismo, mas seus efeitos colaterais afastam pessoas do trabalho e ajudam a inflar o trânsito de servidores entre um órgão e outro.

A ponta do iceberg pode ser vista no atendimento prestado pela Ouvidoria do Servidor. Todos os dias, pipocam denúncias de abusos praticados por gerentes, diretores, secretários ou mesmo colegas de bancada. ;Há choques de gerações e métodos. Se tivesse uma lei, muita gente pensaria duas vezes antes de praticar o assédio moral;, diz Alberto Felippi, ouvidor do servidor.

Legislação
Uma tímida iniciativa de qualificar os abusos e de punir os praticantes está parada no Congresso Nacional. O Projeto de Lei 2.369, de 2003, que joga luz sobre o problema no âmbito da iniciativa privada, empacou nas comissões da Câmara e nada indica que sairá do lugar tão cedo. Há pontos positivos na proposta, como a definição de critérios para classificar a agressão psicológica e a previsão de indenizações financeiras às vítimas. Ao menos esses dois itens poderiam servir de parâmetros para inibir os desmandos em órgãos públicos. O funcionalismo, no entanto, é sonoramente ignorado.

Cabe ao Executivo propor regras exclusivas para tentar minimizar a ocorrência de assédio moral na administração, mas interesses políticos e a própria cultura do setor público impedem que boas idéias venham à tona. ;O processo de fritura profissional é algo assustador no funcionalismo. Há conflitos e eles ocorrem devido justamente à incapacidade do gestor de negociá-lo. Os efeitos são terríveis. Inclusive uma parte do grupo acaba se anulando para não se confrontar;, completa Felippi.

Perda de amigos
Funcionário da Caixa há 19 anos, um gerente, que não quer se identificar por medo de retaliação, conta que há mais de um ano é perseguido. Autor de uma ação judicial contra o banco, na qual questiona o recebimento de horas-extras contratuais, o empregado foi chamado de surpresa para um ajuste de contas. ;Se você não abrir mão da ação as coisas vão ficar difíceis;, teria dito o chefe. O tempo passou e o trabalhador acabou perdendo a função comissionada que engordava seu contracheque. ;E ainda fui transferido de agência, como se estivesse sendo rebaixado;, completa. Para piorar, os amigos da antiga agência não o convidam mais nem mesmo para aniversários. ;Tem gente que insinua até que sou ladrão, que furto comida da copa. A sensação é péssima;, reforça.

A Caixa, por meio de nota enviada ao Correio, informou que ;reitera o seu compromisso com princípios éticos de gestão de pessoas e repudia condutas que possam caracterizar qualquer espécie de assédio moral. A excelência na gestão de pessoas é uma das diretrizes da instituição;. O banco esclarece ainda que foi pioneiro ;em colocar à disposição de seus empregados canal interno para receber reclamações, denúncias e sugestões, garantindo inclusive o anonimato;.

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