Economia

Reino Unido dá o exemplo

Pressionado pela recessão, primeiro-ministro britânico determina economia equivalente a R$ 15,6 bilhões. Olimpíadas devem ser afetadas

postado em 14/05/2010 07:53
Na primeira reunião (1) do governo de coalizão, o novo primeiro-ministro britânico, David Cameron, já colocou em ação uma de suas principais promessas de campanha: o corte nos gastos públicos. Para dar o bom exemplo, o líder conservador decidiu passar a tesoura primeiro nos salários de seus ministros, que serão reduzidos em 5% e congelados pelos próximos cinco anos. A intenção do novo governo é economizar 6 bilhões de libras (cerca de R$ 15,6 bilhões) só neste ano fiscal, para tentar conter a pior recessão enfrentada pelo Reino Unido desde a Segunda Guerra Mundial. Segundo Cameron, nem mesmo o orçamento dos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres, estão a salvo dos cortes.

Com a decisão, o próprio premiê receberá 7,5 mil libras (R$ 19,5 mil) a menos por ano do que o seu antecessor, o trabalhista Gordon Brown. Os salários dos demais ministros cairão de 141 mil libras (R$ 366 mil) para 134 mil libras (R$ 348 mil) anuais. A expectativa é que essas reduções gerem uma economia de até 300 mil libras (R$ 778 mil) em 2010 e 3 milhões de libras (R$ 7,8 milhões) nos cinco anos de mandato de Cameron. Antes do anúncio, um levantamento feito pela rede BBC com 28 economistas independentes mostrou que 85% deles acreditam que o VAT (imposto sobre consumo) vai subir entre 17,5% e 20% até o fim de 2011.

Na saúde, os cortes devem ser ;mais profundos do que o esperado;, disse o novo ministro da Saúde, Andrew Lansley. Em entrevista à BBC, ele afirmou que o orçamento da pasta vai crescer acima da inflação nos próximos anos, como havia prometido a campanha conservadora, mas considerou que talvez seja necessário cortar mais dos que as 20 bilhões de libras (R$ 52 bilhões) anunciadas antes. O ministro da Cultura e dos Esportes, Jeremy Hunt, disse que não há como garantir que o financiamento para os Jogos Olímpicos de Londres seja poupado dos cortes. ;Nenhum dos orçamentos do Departamento de Cultura, Mídia e Esportes está protegido, e estamos olhando a todos eles e dizendo: ;Será que podemos poupar esse dinheiro sem afetar nossos serviços básicos?;;, disse Hunt.

Segundo o ministro, se todas as pastas do governo contribuíssem de modo uniforme no corte proposto pelo governo, o seu departamento precisaria poupar cerca de 66 milhões de libras (R$ 171 milhões). O orçamento do Parque Olímpico é de 9,3 bilhões de libras (R$ 24 bilhões). ;Estamos todos conscientes da seriedade da situação e, francamente, se não tivermos um programa consistente para reduzir o deficit ; e, agora, a Grã-Bretanha tem um dos programas menos consistentes entre as economias desenvolvidas ;, então não teremos a confiança do mundo e do país;, afirmou o ministro.

Reunião construtiva
O início dos trabalhos do gabinete de coalizão, formado por 18 ministros conservadores e cinco liberal-democratas, se deu de maneira bastante harmônica. Segundo o novo responsável pelas Finanças do Reino Unido, George Osborne, a reunião foi ;muito construtiva;. ;Falamos de economia e da situação no Afeganistão e estamos trabalhando incrivelmente bem como equipe;, declarou. No encontro de uma hora e meia, Cameron e o líder liberal-democrata, Nick Clegg, reafirmaram o compromisso de trabalhar juntos. Questionado pela imprensa se a reunião serviu para sepultar antigas rixas, o ministro da Educação, Michael Gove, respondeu: ;Não há nenhum machado de guerra para enterrar. Fizemos um grande acordo e o gabinete tem trabalhado muito bem junto;.

1 - Bronca do chefe
Ao se reunir pela primeira vez com seu gabinete, o premiê David Cameron deu uma ordem que deverá ser seguida nos próximos cinco anos: celulares e Blackberrys não serão permitidos nos encontros da alta cúpula do governo. Ontem, ele já chamou a atenção do secretário de Justiça, Ken Clarke, que mantinha uma conversa pelo telefone em meio à reunião. A bronca, no entanto, acabou em risadas dos demais ministros. Segundo a rede BBC, Cameron manterá a tradição de realizar as reuniões de gabinete em diferentes partes do Reino Unido.

Ajuste português

O primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, e o líder do principal partido de oposição do país, Pedro Passos Coelho (PSD), chegaram a um acordo ontem sobre novas medidas de austeridade para reduzir o deficit orçamentário do país em cerca de 2 bilhões de euros (R$ 4,5 bilhões) em 2010. Metade do ajuste deve vir do aumento de impostos. A alíquota máxima do Imposto sobre Valor Agregado (taxação sobre o consumo) deve ser elevada de 20% para 21%. A tributação sobre o lucro de bancos e grandes companhias vai ganhar um adicional de 2,5 pontos percentuais e o Imposto de Renda vai aumentar em 1,5 ponto.

A outra parte do ajuste fiscal virá do corte de algumas despesas correntes, como os salários de políticos e de funcionários de altos cargos no setor público, que encolherão 5%. ;Essas medidas suplementares são fundamentais para defender nossa economia, garantir seu funcionamento e reforçar nossa credibilidade nos mercados internacionais, assim como defender a Europa e a Zona do Euro;, disse Sócrates depois da reunião do Conselho de Ministros, em Lisboa. A iniciativa se junta ao esforço coordenado dos 16 países que usam o euro como moeda comum. Até agora, a reação à crise tem servido para acalmar os piores temores do mercado sobre o contágio pela crise fiscal da Grécia.

Com o pacote, o deficit nas contas públicas portuguesas deve diminuir um ponto percentual em 2010, fechando o ano em 7,3% do Produto Interno Bruto (PIB). O tratado de criação da União Europeia determina que o rombo não pode ser superior a 3% do PIB, regra desrespeitada por quase todos os membros. As iniciativas também permitirão que o país reduza a meta de deficit fiscal de 2011 em 2 pontos percentuais, para 4,6% do PIB, um número ainda muito ruim. O objetivo anterior era de 6,6%.

Em 2009, o rombo foi recorde, chegando a 9,4% do PIB. Assim como as duras medidas anunciadas pela Espanha na quarta-feira, as de Portugal são o doloroso preço que os endividados países da Zona do Euro precisam pagar para contar com a proteção da rede de segurança de 750 bilhões de euros (R$ 1,7 bilhão), aprovada pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) no fim de semana. O país faz parte do grupo de países em dificuldades que o mercado apelidou de Piigs, acrônimo que reúne ainda Irlanda, Itália, Grécia e Espanha e que lembra a palavra ;porco; em inglês.

ESPANHÓIS DE BRAÇOS CRUZADOS
;A Federação de Serviços Públicos da Espanha convocou ontem uma greve de funcionários para 2 de junho em protesto contra a redução e o congelamento de seus vencimentos propostos pelo governo espanhol. ;A paralisação das atividades será acompanhada de uma série de mobilizações para mostrar a rejeição às medidas anunciadas pelo governo com o objetivo de reduzir em 5% os salários de todos os servidores públicos deste país;, afirmou o sindicato em comunicado. A FSP propõe que as mobilizações comecem em 20 de maio, com concentrações diante dos órgãos do governo, abaixo-assinados dos comitês de empresas e uma manifestação de sindicalistas em Madri, no dia em que começar a tramitação parlamentar do decreto sobre o pacote. Além da diminuição dos salários do funcionalismo, o primeiro-ministro José Luiz Zapatero anunciou o congelamento das aposentadorias e o cancelamento do ;cheque bebê;, um incentivo econômico para os pais.

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