Economia

A Dubai do norte goiano

postado em 30/05/2010 10:36
Crixás (GO) ; Trânsito frenético de motocicletas, falta de vagas em hotéis, comércio pulsante. A agitação inerente a um grande centro econômico tomou de assalto a tranquilidade aparente do município goiano de Crixás, cidadezinha de 15,1 mil habitantes, distante 350km de Brasília. Ela desperta a atenção de multinacionais do Canadá e da África do Sul, interesse que se explica por seu potencial mineral. Entre 1999 e 2009, extraiu-se de lá 62,2 toneladas de ouro. O volume equivale ao peso médio de 12 elefantes asiáticos adultos.

A realidade do município goiano se confunde com a de pelo menos outras nove cidades de Goiás e de Minas Gerais onde a principal atividade econômica, nos últimos anos, tem sido a mineração. Antes reduto de pobreza, essas localidades têm vivido hoje um boom econômico que combina geração de empregos e distribuição de renda.

A evolução das riquezas reflete bem esse quadro. De 1999 a 2007 (último dado disponível), o Produto Interno Bruto (PIB) per capita de Alto Horizonte, município goiano de apenas 3,1 mil pessoas, engordou 4.705%. Passou de uma renda média de R$ 2.139 por ano para incríveis R$ 102,7 mil por habitante, nível superior ao de países como Estados Unidos (R$ 87,4 mil), Canadá (R$ 73,1 mil) e Austrália (R$ 71,5 mil), segundo dados da Agência Central de Inteligência (CIA, na sigla em inglês) de 2008.

Crescimento chinês
Em Crixás, onde o Correio esteve por três dias, a economia avança em um ritmo duas vezes maior do que o da China, exemplo mais notável de expansão nas últimas décadas. Entre 1999 e 2007, o PIB do município engordou 182,9%, um crescimento médio de 22,7% por ano. Esse cenário foi acompanhado de melhorias sociais. Pesquisa da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) deu à cidade a melhor nota entre as que se situam no interior goiano. O estudo considerou um conjunto de quesitos, como emprego, instrução, renda e saúde. Em todos os pontos, o desempenho foi melhor do que a média brasileira, sobretudo no que se refere à educação.

De acordo com números da prefeitura, 30% da população têm curso superior. O número tende a aumentar, uma vez que cerca de 150 crixaenses ganham o diploma a cada ano. Em geral, mais estudo leva a uma remuneração maior, o que interfere também na renda total da população. Esse círculo virtuoso se traduz no PIB per capita de Crixás, que praticamente triplicou entre 1999 e 2007 ; o indicador cresceu de R$ 4.278 para R$ 12.565.

O emprego, em especial o gerado na atividade mineradora, foi o maior agente da transformação. Em Crixás, um terço dos trabalhadores com carteira assinada faz parte do quadro funcional de apenas duas empresas, a Mineração Serra Grande, associação entre uma mineradora canadense e uma sul-africana, e a Servitec, empresa local que faz sondagens em busca de novas jazidas.

Outro setor que emprega bastante no município é o varejo, que responde por cerca de 900 postos de trabalho. Há praticamente um comércio para cada 50 habitantes do município. Já começam a pulular serviços voltados para uma classe média emergente, enriquecida pelos altos salários das multinacionais. ;Em época de pagamento da mineradora, as vendas chegam a aumentar até 30%;, constata a vendedora Cláudia Machado Xavier, que trabalha em uma loja multimarcas de roupas e calçados de alto padrão.

Segundo ela, o movimento após as datas de pagamento da companhia não cai porque há sempre bastante gente de passagem pela cidade. Mesmo quem aparentemente não tem ligação com a exploração de ouro está relacionado à atividade. ;Só vem para cá quem está prestando serviço para a mineradora ou quem veio estudar o solo de Crixás;, atesta.

Boom hoteleiro
Com a maxivalorização do preço do ouro, cidades ricas na produção do mineral, como Crixás, têm atraído cada vez mais gente. Isso tem reflexo direto na ocupação hoteleira, que já não dá mais conta de atender a procura. Em um dia de semana, é difícil achar algum leito sobrando nos três pequenos hotéis crixaenses. Alguns hóspedes têm de procurar vagas nas localidades vizinhas, como Santa Terezinha, distante cerca de 35km, e Uirapuru (30km).

Dona de um pequeno hotel em Crixás, Maria Olímpia Ribeiro, a Dona Lia, 60 anos, prepara a expansão do negócio, hoje com 13 leitos. ;Vou construir mais 20 quartos e dobrar o tamanho da garagem, que é para atender mais gente. Hoje, quem tem caminhonete ou qualquer carro maior não consegue estacionar aqui dentro. Aí, tenho de passar o cliente para um concorrente;, lamenta. Muitas vezes, a procura é tanta que as hospedagens, lotadas, têm de recusar possíveis hóspedes. ;Não tem jeito. A pessoa precisa procurar vaga em outra cidade. Quando o meu hotel lota, é porque já não há mais nenhum quarto disponível em Crixás;, relata.

;Quando eu cheguei aqui, a cidade nem banco tinha. Hoje, existem
quatro. O comércio está crescendo. Todo dia que eu saio para caminhar, vejo uma loja nova, que ainda não conhecia. Isso tudo é por causa do ouro. Todo mundo está vindo para cá;, diz a empresária.

Em geral, os forasteiros que têm lotado os hotéis de Crixás chegam a serviço de mineradoras estrangeiras, além das que já mantêm projetos na região, como a canadense Kinross e a sul-africana Anglo Gold. Atualmente, também uma empresa da Austrália realiza colheitas de amostras do solo na cidade. Há rumores de que norte-americanos e italianos têm buscado informações sobre as jazidas.

;Crixás é a Dubai do norte de Goiás;, exagera o secretário de Planejamento da cidade, Osvanir Rocha Neves de Souza, o Tuquinha. ;Que cidade do interior tem quatro agências bancárias, um comércio como o nosso e essa demanda toda pela hotelaria? Hoje, se tivéssemos aqui mais 100 quartos disponíveis, eles estariam lotados. Essa demanda só tende a aumentar;, prevê. Segundo as projeções da prefeitura, nos próximos cinco anos, a população da cidade deve aumentar cerca de 60%. ;Seremos referência não só para Goiás como também para todo o Centro-Oeste.;

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação