Economia

Falta tudo para a construção civil

Aquecida desde janeiro, a demanda por tijolos, cimento e brita provoca sumiço dos produtos no DF e força o aumento de preços. Sem estoques, fornecedores temem um 2º semestre difícil

postado em 06/06/2010 07:00
Apesar dos cabelos já grisalhos, os braços fortes do funcionário empilham sem parar os tijolos que serão carregados no caminhão e entregues até o fim do dia. No interior do forno, o calor denuncia a produção recém-finalizada. ;Não estamos é dando conta de entregar todos os pedidos;, revela Sebastião Martins do Amaral, que há 10 anos trabalha na olaria localizada em São Sebastião, no Distrito Federal, e, há muitos, não lembra de tantas encomendas. A fábrica de tijolos que emprega Amaral expõe a encruzilhada em que se encontra a construção civil no Brasil. Há pelo menos meio quarto de século, o setor não se depara com uma demanda tão aquecida. Por outro lado, começa a enfrentar gargalos em questões cruciais como a produção de materiais básicos (tijolos e cimento) e a falta de mão de obra qualificada.

O gerente da olaria em São Sebastião, Valério Batista, confirma a impressão de Amaral e conta que a demanda no primeiro semestre do ano foi ;sem precedentes;. Atualmente, os clientes de Batista têm que aguardar pelo menos 60 dias para a entrega do material. ;Tenho capacidade de fazer aqui 180 mil tijolos por mês e estou com a produção de dois meses vendida;, relata em um tom que mistura orgulho com alguma preocupação.

A olaria, que funciona em esquema familiar ; Batista é gerente e filho dos donos ;, reajustou o preço do milheiro em 18,42%, de R$ 380 para R$ 450 em maio, contratou mais dois funcionários e comprou um novo caminhão para atender as entregas. Entretanto, terá um dilema para enfrentar no segundo semestre.

Nos anos anteriores, 30% da produção dos primeiros seis meses era estocada para reforçar as vendas da segunda metade do ano, historicamente mais fortes. ;O mercado vem aquecido desde janeiro. Este ano não teve como (fazer estoque). Se tivéssemos produzido 200%, teríamos entregue. Estamos sem estoque e não sei como será até o fim do ano;, disse Batista. O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Paulo Safady Simão, reconhece que existem algumas deficiências no setor, mas garante que não falta material. ;O que está acontecendo, em alguns casos, é um atraso na entrega, mas as empresas estão produzindo de acordo com a demanda.; Apesar de admitir que os atrasos prejudicam o andamento das obras, Simão destaca que a indústria já está reagindo. ;Há esses problemas, mas não estamos parados. O setor está se movendo. Algumas empresas já estão aumentando suas plantas;, diz.

Gás na inflação
O atraso nas obras não é o único ônus do superaquecimento do mercado. A elevação de preços dos materiais, natural ante à escassez, ameaça a construção de moradias para a chamada baixa renda que, beneficiada pelos incentivos do governo ; como o lançamento do programa Minha Casa, Minha Vida ;, é a parcela da população que mais contribui para o aumento da demanda por imóveis. ;O problema começa na hora de comprar o terreno. Um pedaço de terra em uma região periférica (no DF), que valia R$ 3 mil até o ano passado, hoje não pode ser comprado por menos de R$ 9 mil;, observa Antônio Izaias da Silva, pequeno construtor responsável, atualmente, por um empreendimento de 36 casas populares em Planaltina de Goiás, a 50km de Brasília.

Os imóveis de Izaias devem ser vendidos pelo valor médio de R$ 70 mil a unidade. Ele, no entanto, já esestima um aumento de, no mínimo, 15% no preço de custo de cada unidade em função do incremento nos dispêndios. No berço dessa elevação, está a dificuldade em conseguir o material de construção e ter que adquirir insumos em locais cada vez mais distantes. ;Tive que ir atrás de fornecedores em Alexânia, Anápolis, Unaí e outras cidades da região. Em muitos lugares, simplesmente eles não estão aceitando encomendas;, conta. De acordo com o construtor, em casos extremos, como em alguns produtores de Unaí, só são aceitos pedidos para outubro.

Neste ano, os principais insumos para a construção sofreram vários reajustes na ponta. As estruturas de ferro aumentaram três vezes no ano ; 4% em março, 2,5% em abril e 15% em junho ;, cenário que deve piorar, uma vez que as siderúrgicas já anunciaram que vão repassar os aumentos do minério de ferro. Os preços da areia e da brita subiram, em média,10%, e o dos tijolos, até 30%. Para tentar minimizar a pressão dos custos, as empresas do setor estão se organizando em cooperativas de compra, que têm maior capacidade de negociação com os produtores. ;A ideia é ter uma em cada estado e a adesão das construtoras é livre;, afirma o presidente da CBIC. Essas associações já funcionam, atualmente, nos estados do Ceará, de Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Norte.

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