Economia

Superaquecimento continua

Depois da acomodação em abril, dados recentes mostram que governo terá mais trabalho para conter o ímpeto da economia

postado em 26/06/2010 08:20
Depois do aparente refresco que a atividade econômica viveu em abril, os indicadores preliminares de maio mostram que o governo terá muito mais trabalho do que o previsto para domar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas geradas no país) e evitar o estrangulamento da produção e a explosão da inflação. Baseados na força da renda e do consumo interno e no aumento nos fluxos de crédito, analistas garantem: ainda que a economia não mantenha o ritmo exuberante de expansão observado no primeiro trimestre, a redução na velocidade pode frustrar as expectativas de quem previa uma parada mais pronunciada.

O movimento na produção em maio só deve ser divulgado no início de julho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas já é evidenciado em alguns índices antecedentes. A produção do setor automotivo aumentou 3,2% em maio, enquanto o fluxo de veículos pesados em estradas pedagiadas cresceu 4,9%. A expedição de papel ondulado subiu 5% e a produção de alumínio avançou 0,5% no mês passado.

Para a economista do Santander Luiza Rodrigues, esses são sinais claros de que a acomodação em abril nem existiu. ;Um mês é pouco para dizer que havia desacelerado. O mais verdadeiro é dizer que a economia simplesmente não desacelerou;, afirmou. A analista destaca que a retirada de estímulos fiscais de determinados segmentos não segurou o consumo, como esperado. ;Alguns consumidores até anteciparam suas compras, mas a economia não é feita só de carros. As famílias continuam consumindo muito, o mercado de trabalho permanece crescendo e o ritmo da economia se mantém.;

Novas vagas
A criação de empregos bateu recorde para os meses de maio no mês passado ao ultrapassar 298 mil novas vagas, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho. Não bastasse o emprego formal, que sustenta a renda do trabalhador, o volume de financiamentos na economia continua colocando lenha na fogueira do consumo. Em maio, o crédito concedido para a pessoa física cresceu 1,9%. Para as empresas, esse aumento foi de 2%, segundo o Banco Central (BC). No ano, o financiamento nessas modalidades já acumula alta de 6,9% e 3,0%, respectivamente.

A economista-chefe do Banco Fibra, Maristella Ansanelli, reforça a análise ao destacar que os primeiros levantamentos indicam crescimento próximo de 2% tanto no comércio quanto na indústria. Em relatório, a especialista afirma que o conjunto de indicadores sugere uma continuidade do compasso de expansão. ;Além disso, o mercado de trabalho parece não se influenciar com o fim dos estímulos (fiscais), mantendo um ritmo frenético de contratações;, avaliou.

Além dos fundamentos sólidos da economia, o crescimento vigoroso reflete, segundo análise de Luiza Rodrigues, a menor taxa de juros já experimentada no Brasil, desde a criação da Selic. A economista explica que, como as alterações nos juros levam até seis meses para surtir efeito na retração do consumo, o mercado atualmente está reagindo ao percentual de 8,75%, que vigorou de julho de 2009 até março de 2010.

Preocupado com esse atraso, com a disponibilidade de crédito na economia e com as expectativas de inflação, o BC anunciou ontem à noite o aumento no volume de depósitos compulsórios ; reserva que a instituição impõe aos bancos sobre o montante total de depósitos bancários (leia mais na página 21). A medida deve tirar de circulação uma parcela maior de dinheiro disponível, evitando pressão sobre os preços.

Dificuldades
O perigo da inflação não é o único que o forte ritmo de crescimento pode representar ao país. As dificuldades de produção e logística enxergadas em um horizonte próximo são outros agravantes na equação que o governo terá que solucionar. Além dos já históricos problemas em rodovias, em portos e nos meios de escoamento da produção, o país enfrenta agora uma escassez nunca antes vista de mão de obra qualificada.

Para Luiza Rodrigues, esse fator é o mais preocupante a curto prazo. ;Sempre tivemos dificuldades com infraestrutura. Mas, pela primeira vez em anos, o risco maior não é o parque produtivo, mas sim a falta de trabalhadores preparados;, disse. O gerente executivo de Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca, destaca que, em alguns setores, como o da construção civil, essa é uma questão crítica. ;Algumas empresas estão preferindo capacitar os funcionários por conta própria, mas naturalmente isso gera ainda mais custos;, afirmou.

NOS EUA, PIB FICA MENOR
O crescimento econômico dos Estados Unidos no primeiro trimestre do ano foi revisado nesta sexta-feira para baixo pela segunda vez, o que mostra o escasso dinamismo da atividade às vésperas da cúpula do G-20, grupo das 19 nações mais ricas do planeta e a União Europeia, que deve abordar as estratégias para impulsionar a recuperação econômica mundial. O Produto Interno Bruto (PIB) norte-americano subiu 2,7% ao ano em relação ao trimestre anterior, informou o Departamento de Comércio em Washington. No fim de maio, a taxa de expansão havia sido reduzida para 3%. Mesmo com um resultado abaixo do esperado, foi o terceiro trimestre de crescimento consecutivo dos EUA, que havia mergulhado na recessão mais longa desde a Segunda Guerra Mundial. Os novos dados mostram um crescimento muito limitado, insuficiente para fazer a taxa de desemprego, de 9,7%, cair sensivelmente. Os EUA perderam 8,5 milhões de empregos em 2008 e 2009.

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