Economia

É dado alerta para um novo oligopólio

Faturamento das lojas de rede é 10 vezes maior do que o dos pontos independentes. Consultoria prevê aumento na concentração

postado em 22/08/2010 09:47
Juliana Borre

O sinal amarelo já está aceso para o setor de farmácias no Brasil, país que é o 5; maior consumidor de medicamentos do mundo e líder no consumo de remédios para emagracimento. O Correio teve acesso a um estudo da consultoria Latin Link que estima que as cinco principais redes do país concentrarão uma fatia de 40% do mercado até 2014. Atualmente, os 28 maiores grupos detêm 36% do faturamento desse segmento, que em 2009 movimentou cerca de R$ 32 bilhões e que cresceu a uma taxa de 11% ao ano nos últimos quatro anos ; o dobro do ritmo do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.

O economista Ruy Coutinho, responsável pela pesquisa, justifica o crescimento do setor com o aumento do poder de compra da população. Ao perceberem a possibilidade de novos negócios, fundos de investimento e redes de drogarias têm se envolvido em constantes fusões e aquisições.

Faturamento das lojas de rede é 10 vezes maior do que o dos pontos independentes. Consultoria prevê aumento na concentraçãoNos últimos dois anos, grupos como o Gávea Investimentos, de Armínio Fraga, e o banco BTG Pactual, de André Esteves, entraram de forma agressiva no setor. O fundo carioca comprou, em parceria com a Pragma Patrimônio, 30% da rede paulista Droga Raia, que ocupa agora a quinta posição no ranking das maiores drogarias do país, com um faturamento de R$ 1,6 bilhão previsto para 2010 (veja ranking). A Brazil Pharma, holding do BTG Pactual, associou-se à Rede Nordeste, à Farmais e, em julho passado, ao grupo brasiliense Rosário Distrital. Essas investidas lhe renderam um total de 514 lojas e o posto de sexto maior grupo, com expectativa de faturar este ano cerca de R$ 1,3 bilhão.

Tendência é de que empresas do setor optem pela abertura de capital, como fez a DrogasilÁlvaro Siqueira, diretor-executivo da Rosário Distrital e vice-presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos do Distrito Federal (Sincofarma), ressalta que, com a entrada de grandes grupos e a elevação da concorrência na cidade, a associação ao Pactual foi uma necessidade.

Papel do governo
Com essa movimentação, Coutinho alerta sobre a necessidade de o governo acompanhar a dinâmica do segmento. ;Haverá um elevado grau de oligopolização do setor, o que vai requerer atenção especial do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência;, ressalta. Ele aponta que, hoje, além de faturarem 10 vezes mais que um ponto de venda independente, as lojas de rede crescem em dobro.

O diretor-executivo da Rosário Distrital, no entanto, discorda de que o nível de concentração do mercado chegue a esse ponto e argumenta que, embora em menor proporção, as lojas independentes também estão em expansão. ;Não acredito nisso porque o setor no Brasil é muito pulverizado e estão todos se aproveitando desse crescimento;, justifica.

Mas os microempresários sentem no bolso a concorrência dos grandes grupos. Dono de três drogarias no Gama, Daniel Antunes não pretende abrir mais lojas. ;O mercado está muito concorrido. O poder de negociação das redes com a indústria de medicamentos é enorme;, alerta. Alguns desanimam e chegam a desistir do negócio. Fabrício Soares teve que fechar as portas de uma farmácia que tinha no Guará porque não conseguia competir com a loja vizinha. Hoje, mantém apenas um ponto de venda em Samambaia Sul. ;Vai chegar a hora em que as pequenas vão desaparecer. Não consigo competir com as grandes. Enquanto eu compro 12 unidades de uma pomada e vendo a R$ 8,50, a minha vizinha compra 120 e comercializa a R$ 7,20;, resigna-se.

Para se ter uma ideia, segundo dados da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), das 63 mil lojas espalhadas pelo país, apenas 3.034 são de alguma das 28 maiores redes brasileiras. E, apesar de representarem apenas 5% do total de pontos de venda, faturaram em 2009 R$ 11,5 bilhões.

Novas praças
O setor de farmácias no Brasil concentra 75% do mercado em sete estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Bahia. Com o ganho de renda das classes C e D, uma tendência das grandes redes de drogarias é investir em regiões fora desse eixo. O presidente da Brazil Pharma, André Sá, adianta que a holding está de olho no Centro-Oeste e no Nordeste, sobretudo em Pernambuco e na Paraíba. Álvaro Silveira ressalta que a proposta da Rosário agora é crescer nas cidades de menor porte do interior de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

O desafio agora é capitanear recursos. ;As redes começam a adotar mecanismos de governança corporativa para, no futuro, coordenarem processos de abertura de capital,; disse Ruy Coutinho. A única empresa de capital aberto é a Drogasil, com previsão de faturamento de R$ 1,79 bilhão em 2010.

Consumo diferenciado
O forte crescimento das farmácias no Brasil não está associado apenas ao consumo de medicamentos. Com a renda e o emprego em alta, as empresas vêm apostando tudo na diversificação de produtos para ampliar os ganhos. Há um interesse especial, contudo, por produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos. E não é por acaso. O país se tornou o terceiro maior mercado para tais itens, atrás apenas dos Estados Unidos e da China. Mas lidera o ranking em desodorante e é o segundo em produtos infantis, masculinos e para banho, higiene oral, proteção solar e cremes para cabelo. É o quarto mercado de cosméticos, o sexto para produtos de pele e o oitavo em itens para depilação. Segundo especialistas, além do maior poder aquisitivo, tem contribuído para esse desempenho o aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho, a longevidade da população e o processo de urbanização do país.

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