Economia

Terceirização não elimina direitos trabalhistas, dizem especialistas

Especialistas consideram que projeto pode trazer mais competitividade ao país e alertam que carteira assinada não será eliminada. Empresas poderão contratar mão de obra de outra que tenha funcionários regidos pela CLT. Pejotização está no radar do MP

Rodolfo Costa
postado em 25/03/2017 07:00
Caso seja sancionado, o Projeto de Lei nº 4.302/98 vai assegurar os direitos trabalhistas previstos pela Consolidação das Leis de Trabalho

A terceirização plena aprovada na Câmara dos Deputados pode trazer mais competitividade ao setor produtivo e ser um estímulo para a retomada dos investimentos em mão de obra. Em vários países, a admissão de mão de obra terceirizada traz resultados positivos para o aumento da produtividade. E é isso que o governo pretende. Embora seja polêmico, alguns especialistas avaliam que a proposta é robusta e completa, e não tira nenhum direito do trabalhador.

Caso seja sancionado pelo presidente Michel Temer, o Projeto de Lei n; 4.302/98 vai assegurar os direitos trabalhistas previstos pela Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), como férias e pagamento do 13; salário. Ainda que não tenha nenhum dispositivo claro e específico sobre o assunto, o texto prevê que a fiscalização, a autuação e o processo de imposição das multas serão regidas pela legislação trabalhista. A avaliação de especialistas é de que, como não é intenção de empresas serem punidas, as que são sérias procurarão honrar as garantias trabalhistas.

;Tem coisas que não precisam ser ditas (ao pé da letra). Estranho seria se fosse o contrário. Não há nada no texto que retire os direitos trabalhistas. Por isso, o trabalhador não ficará desprotegido, será aplicada a CLT;, analisou o advogado Henrique Arake, sócio do escritório Machado Gobbo. Outro ponto que favorece o trabalhador é que a responsabilidade da empresa tomadora do serviço é subsidiária. Ao reivindicar os direitos trabalhistas, a empresa terceirizada é quem deverá honrar os compromissos. Esgotados os recursos da empresa, a contratante será obrigada a arcar com os pagamentos dos direitos.

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[SAIBAMAIS]Em uma eventual ação trabalhista, nada impedirá o trabalhador de ajuizar as duas empresas. O advogado Ricardo Meneses, do escritório Küster Machado, afirma que o funcionário da terceirizada deverá inserir no processo a ;primeira reclamada;, ou seja, a terceirizada, e a ;segunda reclamada;, a tomadora. ;Isso já é de praxe e supercomum na Justiça trabalhista. E o processo corre contra as duas empresas. Tanto que ambas se defendem, mas a execução corre apenas, primeiramente, contra a prestadora de serviços;, ressaltou.

O projeto, no entanto, está longe de ter unanimidade sobre o benefício ao trabalhador. Alguns especialistas acreditam que a terceirização irrestrita pode precarizar as relações de trabalho. É o que avalia o advogado Pierre Moreau, sócio-fundador do Moreau Advogados. ;O projeto aprovado não proíbe a contratação de terceirizados que eram funcionários da empresa. Dessa forma, a medida pode gerar demissão em massa e a pejotização decorrente da terceirização;, ponderou.

A pejotização é o processo em que um trabalhador celetista é demitido e contratado como pessoa jurídica (PJ). ;Com a pejotização, os trabalhadores perderão direitos trabalhistas, como férias, 13; salário, licença maternidade, FGTS, aviso-prévio, entre outros;, analisou. A ideia, entretanto, é refutada por Meneses. ;Não vai haver isso. Os trabalhadores terceirizados terão que ter a carteira assinada. O empregador não vai contratar cada trabalhador com 20 empresas diferentes, por exemplo. É uma prática trabalhista que já está no radar do Ministério Público e certamente continuará;, rebateu.

Os defensores do projeto argumentam que ele traz segurança jurídica. Mas, mais do que ter essa segurança, é ter a certeza de que as empresas vão agir dentro da lei, pondera o advogado Eduardo Pastore, sócio-diretor do escritório Pastore Advogados. ;80% dos problemas de empresas não são jurídicos. São problemas de gestão. Tem empresa que contrata uma terceirizada sem verificar o patrimônio dela;, destacou.

Às contratantes, Pastore destaca que é fundamental que se cobre a certidão negativa de débito trabalhista da terceirizada, para saber se há e quantas são as ações trabalhistas envolvendo a empresa prestadora de serviços. Outro ponto importante é que os empregadores não façam cobranças ao trabalhador terceirizado como se ele fosse da própria empresa. ;Isso, a legislação não permitirá;, destacou.

O projeto que foi encaminhado para sanção do presidente Michel Temer estabelece que não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores ou sócios das empresas terceirizadas e a empresa contratante, independentemente do ramo. Em caso de o empregador subordinar o terceirizado como um empregado próprio, o trabalhador poderá recorrer à Justiça. ;É preciso deixar claro que a contratante compra serviço, e não mão de obra. Se algum terceirizado não agradar, que peça para a prestadora substituí-lo;, frisou.

Comércio


O projeto de terceirização será positivo para o setor produtivo, avalia o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci. Para ele, o texto dará mais competitividade ao comércio e aos serviços. ;Permitirá o fracionamento e inserção de mais expertise em determinadas atividades. ;Existem um conjunto de tarefas nos setores de comércio e serviços que só conseguem ser mais competitivos quando recorrem a esses especialistas;, disse. Na avaliação de Solmucci, o principal benefício do projeto é em reduzir incertezas jurídicas. ;Muitos segmentos já usam mão de obra terceirizada, mas vivem enfrentando ações trabalhistas em função da falta de regulamentação;, disse.

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