Economia

Tribunal de Contas da União quer limitar salários nas estatais

Corte obrigará companhias públicas a disponibilizar ganhos de servidores na internet para investigar se cumprem o teto constitucional. Especialistas consideram que empresas de economia mista estão desobrigadas a cumprir a norma

Simone Kafruni
postado em 16/06/2017 07:00
As estatais terão de disponibilizar na internet os salários de todos os funcionários, como ocorre hoje com os órgãos da administração direta. O Tribunal de Contas da União (TCU) determinou a abertura de auditoria na folha de pagamento de todas as empresas públicas para investigar se as companhias obedecem ao teto constitucional. Pela Constituição, a remuneração dos servidores não pode exceder os vencimentos mensais dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), hoje em R$ 33.763.

O órgão de controle quer um levantamento detalhado para apurar, inclusive, adicionais por função comissionada nas composições salariais. A comunicação, feita em plenário pelo ministro Walton Alencar Rodrigues, ainda será avaliada pela Corte informou a assessoria de imprensa do órgão. O ministro Bruno Dantas, no entanto, destacou ter proposto, junto com a auditoria, quem for sorteado relator que analise a possibilidade de dar uma cautelar determinando a imediata disponibilização na internet dos salários de todos os funcionários de estatais.

[SAIBAMAIS];Eu falei que o decreto que regulamentou a Lei de Acesso à Informação (LAI) estabeleceu essa divulgação como forma de transparência ativa. Porém, não há certeza de que as estatais estão cumprindo;, disse Dantas. ;Por isso, propus que o relator verifique quem não está cumprindo. O problema dos supersalários começa pela pouca transparência. Geralmente, o órgão esconde salários muito elevados para não chamar a atenção;, acrescentou o magistrado.

Decreto


Estatais e empresas públicas de economia mista, como o Banco do Brasil e a Petrobras, praticam salários muito maiores do que o teto constitucional, sobretudo, para os cargos de diretoria. O fundador e secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco, explicou que a Lei 12.527, de 2011, é muito clara e inclui todas as estatais. ;No entanto, o decreto (7.724/2012), que foi assinado meses depois, justamente por conta da pressão das estatais para não serem incluídas na lei, sugere que empresas públicas não são obrigadas a se adequar;, ressaltou.

Castello Branco questiona se a varredura determinada pelo TCU será em todas as estatais ou apenas nas dependentes do Tesouro Nacional. ;Algumas empresas têm orçamento próprio ou são de economia mista. A alegação delas é de que, se os salários forem limitados ao teto, vão perder mão de obra qualificada. Esses são os argumentos de grupos como Eletrobras, Petrobras e Banco do Brasil;, afirmou.

Para o especialista, os contribuintes têm o direito de saber quanto as empresas públicas pagam. ;O fato é que, até hoje, a transparência nelas é inexistente. Quando muito, se sabe o total gasto com a folha de pagamento, o que não dá condições de uma análise de comparação com valores de mercado, de cargos e carreiras ou mesmo com a administração pública direta;, afirmou.

Não à toa, os maiores escândalos de corrupção do Brasil têm uma estatal incluída, assinalou Castello Branco. ;Mensalão nos Correios e no Banco do Brasil; Petrolão na Petrobras. A ingerência política, grandes orçamentos e a falta de transparência das estatais são o paraíso para a corrupção;, alertou. Para ele, a tentativa do TCU é ;extremamente válida;. ;Estamos falando de empresas que movimentam juntas, inclusive, as do sistema financeiro, durante um ano, entre usos e fontes, como empréstimos e verbas da União, R$ 1,3 trilhão. Isso é o PIB (Produto Interno Bruto) da Argentina;, comparou.

Perseguição


No entender do especialista em contas públicas Raul Velloso, o TCU não precisa determinar auditoria. ;O órgão já fiscaliza as estatais. Ele deve ter acesso às informações;, disse. Velloso explicou que desconhece que as estatais tenham que cumprir um limite de gasto com pessoal em relação à receita, como é obrigação na administração direta. ;O TCU tem que se limitar a fazer a checagem daquilo que a lei determina. Não há teto constitucional para empresas que concorrem no mercado. Aí é engessar demais. Acho difícil entender essa extensão das garras do TCU;, comentou.

O economista e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Renê Garcia, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), também questiona o controle sobre as companhias de capital aberto, com ações no mercado, como as estatais de economia mista. ;Mesmo o governo sendo controlador, a empresa tem responsabilidade com seus acionistas minoritários. Ninguém faz isso em nenhum lugar do mundo: obrigar empresde capital aberto a divulgarem salários. São informações muito relevantes;, disse. Para o especialista, existem informações que precisam ser resguardadas. ;Acho muita demagogia, em momento de fragilidade, fazer populismo institucional. Não é o salário, mas a produtividade, o excesso de pessoal e as operações de risco que deveriam ser controlados;, resumiu.

Regimes diferentes


A assessoria de imprensa da Caixa Econômica Federal informou que a empresa é pública, emprega por meio de seleção por concurso público, mas o regime é a CLT e os salários de diretores, vice-presidentes e presidente são competitivos com o mercado. A assessoria do Banco do Brasil afirmou que o banco não segue o teto constitucional por ser uma sociedade de economia mista. O s Correios, a Petrobras e a Eletrobras foram procuradas, mas não responderam.

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