Economia

Analista vê 'desespero fiscal' em ação para privatizar Eletrobras

Para o economista e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Renê Garcia, o governo poderia ter cortado as despesas discricionárias e não ter autorizado reajustes aos servidores, no ano passado, para controlar o orçamento

Marlla Sabino*, Rosana Hessel
postado em 22/08/2017 07:58
Estatal tem 47% da rede nacional de transmissão de energia. Na área de geração, usinas do grupo respondem por 31% da eletricidade produzida
O governo sinalizou a pretensão de privatizar a Eletrobras com a justificativa de buscar melhorias na gestão da Eletrobras, mas, na visão de especialistas, a manobra é uma tentativa da União de reduzir o rombo dos cofres públicos. Para o economista e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Renê Garcia, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), é uma tentativa de contornar o ;desespero fiscal; para fechar as contas. ;A Eletrobras é uma holding, ainda não é possível avaliar qual o valor de todas as empresas que a compõem, para podermos estimar qual seria o valor das ações;, explicou. ;Ainda não sabemos nem como será o modelo da negociação;, acrescentou.

[SAIBAMAIS]Apesar de não querer analisar o futuro da estatal, Garcia afirmou que o governo poderia ter cortado as despesas discricionárias e não ter autorizado reajustes aos servidores, no ano passado, para controlar o orçamento. ;Pelo contrário, deram aumentos generosos, adiaram a queda dos juros. Agora estamos em uma trajetória em que a dívida pública vai explodir e a economia continua estagnada;, analisou.

A ex- presidente do Conselho de Administração da Eletrobras, Elena Landau, por outro lado, acredita que a medida da União é positiva para o país. ;É uma decisão corajosa. Vai fazer bem para a empresa e para o país;, avaliou a economista e advogada que ficou conhecida na década de 1990 como ;a musa das privatizações;, ao comandar o Programa de Desestatização no BNDES.

O economista César Bergo concordou que a medida pode trazer bons resultados para a estatal, frente ao sucateamento da empresa, que, nos últimos anos, sofreu uma derrocada em seu valor de mercado por conta de uma série de problemas. ;Essa era a única alternativa após o que foi feito com a Eletrobras, decorrente dos problemas de gestão e das perdas por conta da corrupção. O mercado vai se interessar pelos bons ativos, em especial os chineses. Essa área de energia é estratégica para o futuro;, afirmou.

As mudanças na gestão da empresa não devem refletir no preço da energia elétrica aos consumidores. Bergo ressaltou que nos últimos anos houve uma descentralização no envolvimento da estatal com o setor de eletricidade, o que ameniza qualquer reação que resulte no aumento de tarifas. ;Há alguns anos, a Eletrobras cuidava de diversos processos na produção de energia, desde a geração até a distribuição. Mas foram criados outros grupos. O percentual de distribuição de energia que está nas mãos da empresa não é muito significativo, mas influencia o setor;, explicou. (MS)

Imagem deteriorada

As investigações da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, atingiram em cheio a Eletrobras. A companhia foi citada pela primeira vez na 16; fase da maior operação de combate à corrupção da história brasileira. Os investigadores descobriram um esquema de fraude na Eletronuclear, uma subsidiária de geração de energia da estatal. De acordo com a PF, empreiteiras desviaram dinheiro de contratos firmados para a construção da usina nuclear de Angra 3.

O então presidente da Eletronuclear, almirante Othon da Silva, foi indiciado e condenado em 1; instância sob a acusação de receber R$ 4,5 milhões em propina, por meio de contratos de empreiteiras com a estatal, entre 2009 e 2013.

As investigações contra a Eletrobras atingiram diretamente 15 empresas estatais que integram o grupo de atividades desenvolvidos pela companhia. Uma das subsidiárias da estatal sob investigação é a SPE Norte Energia, que constrói a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. O Ministério Público considerou ;expressivo; o aumento no valor das obras de Belo Monte, que passaram de R$ 19 bilhões, calculados inicialmente, para R$ 33 bilhões, com 60% do projeto concluído.

Por conta de enxurrada de acusações, a Eletrobras firmou contrato no ano passado, e renovou este ano, com o escritório de advocacia norte-americano Hogan Lovells. Os profissionais trabalham na investigação interna das acusações feitas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. A intenção é antecipar medidas para amenizar os impactos negativos das denúncias na organização.

Os processos envolvendo a empresa de energia seguem correndo na Justiça Federal do Rio de Janeiro. Em comunicado ao mercado dos Estados Unidos, a companhia reconheceu perdas de R$ 302,5 milhões por conta do esquema de corrupção investigado pela Lava-Jato.

*Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo

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