Economia

Com economia retomada com ajuda do consumo, país precisa de investimento

A recuperação do país é calcada no consumo, filme que já vimos. Para crescer de verdade, empresas precisam ter vontade e capacidade de se modernizar

Simone Kafruni
postado em 27/12/2017 07:20
Desenho de uma pessoa puxando um sinal de cifrão
Embora o otimismo em relação à economia esteja de volta, com o aumento do consumo, é cedo para falar em uma retomada dos investimentos capaz de conferir o impulso necessário para o crescimento sustentável do país. Para especialistas, isso deve começar a ocorrer no segundo semestre de 2018 e, de forma mais significativa, apenas quando 2019 chegar. A capacidade instalada da indústria permanece com níveis altos de ociosidade, a construção civil não saiu da recessão e o comércio continua fechando lojas, mesmo que em patamares bem menores do que em 2015 e 2016.

Como o governo está sem dinheiro, por conta do grave quadro fiscal, convocou o capital privado para impulsionar os investimentos por meio do Programa Avançar Parcerias, com o qual realizou concessões e privatizações que devem garantir o aporte de R$ 142 bilhões em empreendimentos de infraestrutura ao longo de algumas décadas. Se outros 75 projetos saírem do papel, a estimativa é de injeção de mais R$ 132,7 bilhões também no decorrer de vários anos.

A expectativa do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de crescimento para 2018, é baseada no aumento do consumo da energia elétrica e no incremento do investimento em máquinas e equipamentos a partir do segundo semestre. Dados preliminares de medição coletados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, entre os dias 1; e 18 de dezembro, apontam aumento de 2,8% no consumo e de 3,2% na geração de energia elétrica no país, na comparação com o mesmo período de 2016.

No entanto, para José Carlos Martins, presidente da Câmara Brasileira da Construção Civil (CBIC), não há como o país crescer sem a âncora do setor, que é o mais dependente de investimento e de capital novo. ;A construção civil não saiu da crise. Fechamos 2017 com quase 6% de queda;, afirma. ;Construção civil é investimento, que é ligado diretamente à expectativa. O juros futuros ainda estão em 10% e 11%. As pessoas têm que ter um mínimo de tranquilidade para investir. Ninguém vai deixar de ir ao supermercado, mas não vai comprar um imóvel se estiver sem dinheiro;, explica.

A recuperação do país é calcada no consumo, filme que já vimos. Para crescer de verdade, empresas precisam ter vontade e capacidade de se modernizar

Condicionantes

Martins assinala que o governo está otimista, mas as previsões positivas só vão se concretizar com uma série de condicionantes. ;Se não aprovar a reforma da Previdência, se não resolver a questão dos distratos (anulação de um contrato pactuado entre partes, com devolução corrigida dos valores pagos), se não fizer andar as concessões, vai continuar só na expectativa;, alerta. A construção civil se ressente do alto nível de distratos realizados entre 2015 e 2016, o que deixou as construtoras sem capital para realizar novos investimentos. ;Precisamos trabalhar com coisas estruturais. Não bastam cosméticos. O ponto básico é segurança jurídica, que é importante tanto para resolver o caso dos distratos quanto para atrair investidores para as grandes obras;, afirma.

[SAIBAMAIS]No entender do gerente executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, o mercado brasileiro continua sendo atrativo e há grandes projetos de infraestrutura a serem realizados. ;Agora, para que os negócios das empresas fluam com mais rapidez, celeridade e produtividade, é preciso criar condições microeconômicas, com reformas de regulação, na questão ambienta e no uso da mão de obra;, afirma.

O economista explica que a indústria brasileira, que mergulhou três anos seguidos em recessão profunda e só emerge agora, ainda trabalha com alta capacidade ociosa, o que atrasa um pouco o investimento. ;Temos que pensar que os produtos mudam, as empresas têm necessidade de atualização tecnológica, o que demanda investimento. Mas isso precisa ser construído em um ambiente de segurança. Como a taxa de juros está baixa, pode incentivar o retorno dos investimentos em projetos produtivos;, aposta.

Por muito tempo, assinala Castelo Branco, as altas taxas de juros asseguradas por títulos públicos capturaram a poupança da população e das empresas. ;O Estado expulsou os investimentos. Agora, esperamos o contrário. As empresas já estão começando a pensar nisso, mas o sistema financeiro privado tem que se ajustar para oferecer crédito;, defende. O economista também não acredita que o aumento do consumo das famílias seja suficiente para promover o crescimento. ;O nosso grande desafio é reativar o aumento da produtividade. A reforma trabalhista ajuda nisso e as reformas microeconômicas, também.;

Risco

O único risco na opinião do gerente da CNI é o calendário eleitoral. ;Gera incerteza e inibe decisões mais drásticas de investimento. O ambiente de previsibilidade de longo prazo tem de ser estendido o máximo possível para que os aspectos positivos do investimento comecem a acontecer ainda em 2018. Só com confiança de que a economia vai retomar um ciclo longo de crescimento é que as indústrias vão começar a investir. As empresas que tomarem as decisões antes terão vantagens no mercado;, diz.

Mesmo que a ocupação da capacidade instalada esteja crescendo timidamente, a pesquisa de Sondagem Industrial da CNI mostra que o uso é o maior em quase três anos, e a intenção de investimento segue em trajetória de alta. A indústria operou, em média, com 68% da capacidade instalada em novembro. Apesar da alta, o índice está seis pontos percentuais abaixo do registrado na média dos meses de novembro entre 2011 e 2014.

A mesma pesquisa aponta, ainda, que as expectativas dos empresários em dezembro estão mais otimistas do que no fim de 2016. O índice de intenção de investimento aumentou 1,6 ponto na comparação com novembro e atingiu 52,2 pontos. Foi o sexto mês consecutivo de alta no indicador, que está 7,6 pontos acima do registrado no fim de 2016 e é o maior desde dezembro de 2014, quando registrou 52,4 pontos.

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